Jornalismo Júnior

Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Como o Pé-de-Meia afeta o estudante?

Programa busca evitar a evasão escolar; especialistas apontam que dinheiro dado aos alunos pode diminuir a desigualdade e complementar a renda familiar
Por Ana Santos (anacferreira@usp.br)

Este ano, foi implantado o programa de incentivo financeiro-educacional Pé-de-Meia. Destinado aos estudantes do Ensino Médio registrados no Cadastro Único (CadÚnico), a proposta tem como intuito promover a permanência do jovem na escola, reduzir a desigualdade social e promover a inclusão educacional.

O programa contempla alunos de idade entre 14 e 24 anos que estejam matriculados no Ensino Médio regular ou na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA). O jovem beneficiado pode receber o total de R$ 9,2 mil até a formação do Ensino Médio, caso atenda a requisitos determinados: matrícula, frequência, conclusão do curso e o bônus de 200 reais àqueles que realizarem o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

A proposta do Pé-de-Meia trabalha no processo de abandono e evasão escolar. O ato do jovem não comparecer mais às aulas, ainda que matriculado, caracteriza o abandono, enquanto a evasão ocorre quando a matrícula não é efetuada. Assim, o benefício estimula o aluno a permanecer no ambiente escolar e a utilizar o dinheiro recebido como auxílio nesse processo.

Porém, a maneira de que o benefício é usado depende ainda da realidade e dos planos de cada estudante que o recebe. Como a intenção do Pé-de-Meia é ser alternativa que mantenha o jovem na escola, parte do dinheiro é entregue mensalmente e outra só pode ser retirada quando ele se forma.

O valor mensal de R$ 200 serve como alternativa de complemento à renda familiar, na compra de alguns materiais ou para ser guardado em planos futuros. Em entrevista à Jornalismo Júnior, Alessandro de Melo, professor de História e Políticas Educacionais na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), comenta que é natural que parte do dinheiro integre a renda da casa. “A manutenção do jovem no Ensino Médio não é apenas uma questão pessoal, depende do arcabouço familiar que ele tem”, finaliza.

Assim, apesar de ser um programa que existe para minimizar o aspecto econômico da evasão, ele não substitui a necessidade de quem deixa de ir à escola para trabalhar. “Aquele aluno trabalhador não vai abandonar o emprego para se manter apenas com R$ 200 mensais”, expressa a pedagoga Juliane Aparecida Zambão Ignacio.

Ainda há outros alunos que têm o Pé-de-Meia como forma de planejarem a continuidade dos estudos, como Bruno Lessa. Ele compartilha que busca fazer um intercâmbio ou faculdade quando terminar o Ensino Médio. “Eu já tinha esses planos, mas o programa me deu uma visão melhor [sobre] e realmente vai me ajudar.” 

Em outros casos, o benefício ainda serve para completar qualquer necessidade durante o período na escola. O estudante Kauã Carlos Bezerra comenta que o dinheiro ajuda a comprar itens que a escola não fornece, como corretivo. “O valor pode ser usado principalmente no final do ano, que é quando os materiais estão acabando.”

Fruto de desigualdade

No Censo Escolar de 2023, o Ensino Médio apresentou taxa de evasão de 5,9%. O processo de sair da escola é causado por fatores internos e externos. Os internos correspondem a características dentro do ambiente escolar, como a relação dos professores com os alunos, o conteúdo abordado nas aulas e a infraestrutura da instituição. Já os externos estão atrelados a necessidade de trabalhar, distância da escola, gravidez e questões raciais.

No caso do programa Pé-de-Meia, a análise está no aspecto socioeconômico da evasão, visto que ela afeta principalmente pessoas em situação de vulnerabilidade. Segundo dados do IBGE de 2023, 41,7% dos jovens de 14 a 29 anos abandonaram ou nunca frequentaram a escola devido à necessidade de trabalhar, um número ainda maior entre negros e mulheres. “O Pé-de-Meia abrange um foco, o que dá uma certa garantia para os estudantes da escola pública”, comenta Alessandro.

Menino em sala de aula coloca a mão na cabeça pensativo
O aluno demonstra interesse em evadir antes de o fazer por meio de faltas e perda de interesse nas aulas [Imagem: Reprodução/Freepik]

Jovens que evadiram da escola podem sofrer consequências na vida adulta, como dificuldades na procura de um emprego ou no recebimento de salários dignos. Assim, a intenção do Pé-de-Meia é garantir que o estudante, ao completar a fase de ensino básico, realize a transição para um futuro em que seja menos prejudicado. 

José Adelmo Menezes de Oliveira, professor de Políticas e Gestão Escolar no Instituto Federal de Sergipe (IFS), comenta que, quem evade, o faz devido a uma motivação e entende os impactos que a ação gera. Ele completa que “a evasão é fruto de uma desigualdade que gera desigualdade”. 

Fatores adicionais 

Segundo especialistas, a quantia recebida pelo aluno inscrito no Pé-de-Meia não substitui a necessidade de ele trabalhar, porém serve como ajuda. “O que o Pé-de-Meia vem fazer é prestar esse tipo de contribuição”, comenta José. Bruno também completa que o dinheiro recebido serve para auxiliar no orçamento familiar. “Às vezes, os pais não têm uma renda grande, e esse benefício ajuda a pagar uma conta ou comprar uma roupa que o aluno precisa”, opina.

Ainda que o programa forneça o estímulo financeiro ao jovem, sua parte central é garantir a presença dele na escola. Alessandro frisa esse aspecto ao considerar que a própria convivência na escola pode gerar efeitos no estudante ao pensar sobre planos de continuidade dos estudos.

Porém, ao considerar que a evasão também é motivada por fatores internos da própria escola, medidas precisam ser trabalhadas pela instituição para evitar a saída de alunos. A relação entre os professores, as condições de alimentação da escola, o currículo aplicado e o estímulo ao desempenho do aluno são alguns desses fatores. Kauã comenta que sente a ausência de diálogo entre os professores e os alunos, alegando que “são tratados como robôs que não podem fazer nada”. Ele ainda desabafa sobre a carga horária do almoço que é curta, o que o faz se apressar em comer.

O pagamento do Pé-de-Meia também abre discussão a respeito da responsabilidade financeira dos alunos que recebem o benefício. Segundo pesquisa da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), 47% dos jovens entre 18 e 24 anos não realizam controle de suas finanças. Como o programa não determina a maneira do jovem aprender a organizar o dinheiro que recebe, esse valor pode ser usado para despesas além da sua educação.

A ausência de aulas de ensino financeiro reforça essa dificuldade, ainda que a matéria esteja incluída no novo modelo do Ensino Médio. “O Novo Ensino Médio trata a questão financeira mais num aspecto individualista, de empreendedor”, opina Alessandro. Ele ressalta que deve haver um estímulo de educação sobre a responsabilidade desse dinheiro.

Como o Pé-de-Meia funciona

Os valores destinados aos estudantes beneficiados são depositados na Caixa Econômica Federal, em uma poupança sob o nome do próprio aluno. Para o jovem receber o Pé-de-Meia, ele precisa estudar em escola pública e ser beneficiário do CadÚnico.

A partir da comprovação de matrícula e da frequência na escola, o jovem recebe uma quantia de R$ 200 mensais. Caso esteja matriculado na modalidade EJA, o valor é de R$ 200 pela matrícula e R$ 225 pela frequência. Ao final de cada ano, o estudante recebe um depósito de mil reais em sua conta, valor que só pode ser retirado ao final do Ensino Médio. O aluno ainda tem a possibilidade de receber um bônus de R$ 200 caso se inscreva no Enem e compareça aos dois dias de prova.

O calendário de pagamentos em 2024 conta com oito parcelas distribuídas ao longo do ano. As datas de saque variam de acordo com a modalidade do Ensino Médio e a data de registro da família no CadÚnico. Aqueles inscritos no CadÚnico ou no EJA até 15 de julho de 2024 têm direito a apenas quatro parcelas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima