Imagine uma indústria de cinema que concentra a segunda maior produção mundial, realiza longas com um orçamento econômico em curto prazo – gasta aproximadamente de três a quatro semanas –, e vende os filmes a baixíssimos custos. Agora pense que estamos tratando de Nollywood: o mercado cinematográfico da Nigéria.
Gerando trabalho para parte considerável da população de um país que sofre com elevados índices de desemprego – que chegaram a 21% em 2011, segundo dados da CIA –, a Hollywood nigeriana também movimenta intensamente o mercado local. Suas produções são consumidas não só pelos nigerianos, mas também por outros países da África. Por ano, cerca de 2500 filmes são produzidos, com cada um deles empregando diretamente entre 50 e 100 pessoas – sem levar em conta os trabalhos indiretos.
A indústria cinematográfica nigeriana ascendeu no final da década de 1980, um período marcado por corrupção e crise econômica, proveniente da ditadura militar no país. Esses fatores dificultaram o acesso financeiro a bons materiais para fazer filmes: não havia incentivos governamentais e nem público que frequentasse as salas de cinema.
Diante desse panorama, o mercado VHS ganhou espaço. Grupos de teatro passaram a gravar suas performaces em vídeo cassete e a vender para locadoras. Até que em 1992, foi lançado o primeiro blockbuster da indústria nollywoodiana: Vivendo no Cativeiro (Living in Bondage, 1992). O filme, dirigido por Chris Obi Rapu, vendeu mais de 750 mil cópias e lançou as bases do que Nollywood é hoje, tanto no que se refere às temáticas abordadas nos filmes – que geralmente envolvem rituais e seres sobrenaturais, permeados de críticas à própria sociedade nigeriana –, quanto ao formato do business desse mercado na região.
Desse modo, os longas produzidos são lançados em formato direct-to-video. Assim, não há gastos iniciais com a exibição em salas de cinema ou de teatro. Os DVDs são o resultado final. Com isso, além de reduzir os custos, os filmes já saem prontos para serem assistidos em casa.
Outro ponto marcante do cinema nigeriano se refere ao idioma em que as películas são gravadas. Por tratar-se de um país africano, em que estão presentes diversos grupos étnicos, a maioria do conteúdo é feito em inglês, que é a língua oficial – um reflexo da colonização imperialista do século XIX –, e em dialetos locais como iorubá, hausa e ibo. Alguns filmes, como Egberun Kan (Idem, 2006), Oladunjoye (Idem, 2011) e Paramole (Idem, 2012) chegam a possuir falas em dois idiomas, em que o inglês e o iorubá se alternam no decorrer da trama. Dessa forma, há momentos em que, ao falar, o personagem mistura as duas línguas, sendo o dialeto predominante.
Há exatamente um ano, em novembro de 2011, São Paulo recebeu a primeira mostra brasileira de cinema dessa região, “Bem-Vindo a Nollywood”. O evento contou com a exposição de filmes e com debates sobre a indústria de cinema. Tunde Kelani, um dos maiores diretores nigerianos, foi o tema da primeira edição do festival e participou de suas atividades. A mostra discutiu, primordialmente, a inserção de outra cultura cinematográfica – que não seja americana ou europeia – no imaginário brasileiro, e novas possibilidades de produção e difusão de filmes.
Alex Andrade, curador de “Bem-Vindo a Nollywood” comentou no site da mostra que “a conexão Brasil-Nigéria pode ser considerada a síntese de uma ligação primitiva entre a África e a América e a sua aproximação”. Ele ainda conta que o intuito do festival é retratar que o mundo é o que se vê de onde se está.
Nollywood é um marco para a indústria cinematográfica do país. Ela mostra a realidade e surrealidade das mentes nigerianas. A câmera e as histórias por trás dela procuram mostrar interferências sobrenaturais, forças que, para eles, seriam fontes capazes de impor a ordem e impedir o caos que a sociedade vivencia na política, na família ou em qualquer outro nível de organização social.
Por Luiza Fernandes e Malú Damázio
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