Este filme faz parte da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique aqui.
Um filme cheio de ação, suspense e reviravoltas desenrolado em um único ambiente com um único personagem. Culpa (2018) é um filme dinamarquês que narra um dia de trabalho do policial Asger Holm na central de emergências da polícia local. Acostumado com a ação do campo, foi transferido para o escritório por má conduta. Quando recebe uma ligação de uma mulher, Iben, que está sendo sequestrada, ele vê uma oportunidade para redenção.
Asger passa a se dedicar ferrenhamente ao caso, e descobre que o sequestrador é o marido de Iben, o pedreiro Michael. O investigador começa a acionar policiais que estão na área em busca do sequestrador. Sem obter sucesso na caça à van branca de Michael, começa, apenas com um computador e um telefone, a buscar pistas em outros lugares. Consegue o telefone da casa de Iben, e conversa com a filha do casal, Mathilde, que ficou sozinha em casa, após uma briga do casal. Quando policiais chegam na casa para conversar com a menina de 6 anos, encontram seu irmão, o bebê Oliver, morto.
O sequestro vai testar a paciência e capacidade de autocontrole do policial, levando-o a perder o equilíbrio quando as coisas não saem como planejado. Diferentemente dos heróis tradicionais, Holm não vai utilizar a força para resolver o problema, e sim a inteligência. Sua voracidade em solucionar a situação faz com que o personagem se precipite, e tenha que encarar também os próprios erros. O caso vai exigir toda sua experiência como policial e requisitar uma habilidade em dialogar com as personagens para conseguir as informações que necessita para salvar Iben e entender todo o contexto que envolve a família.
Ao mesmo tempo em que vamos conhecendo a história de Michael e Iben, também é revelada a história do investigador. O sentimento de culpa não está presente apenas na história do casal, mas também na de Asger. Fica evidente o desejo de se redimir nas atitudes do oficial, não apenas por estender seu turno para resolver o caso, mas também pela frustração demonstrada quando se equivoca.
Todo o suspense do filme está ancorado na bela edição sonora, afinal de contas toda a narrativa se passa dentro do escritório policial através das ligações. Assim, cabe à imaginação do espectador criar as imagens dos personagens e o cenário em que estão inseridos. Tudo isso a partir dos sons dos diálogos e ruídos ambientes, como o som da chuva, do para-brisas e dos carros. Outro detalhe importante é o silêncio, que cria e envolve o público no mistério e suspense da trama.
Além do roteiro brilhante, Culpa se destaca pela atuação impecável de Jakob Cedergren, que exibe o nervosismo e forte temperamento de Asger Holm com maestria. As expressões faciais e os tiques com a mão demonstram esse caráter. Para coroar a performance de Jakob, o jogo de câmeras, filmando closes e focando em pequenos detalhes, corrobora a personalidade do policial.
Por mais que a ideia de um personagem único em um mesmo ambiente possa parecer algo entediante, o filme se mostra uma grande obra de suspense. Assim como o investigador, também somos espectadores do sequestro, e nos colocamos na posição de Asger, capturando seus dilemas pessoais e relativos ao caso. O desafio de criar uma narrativa emocionante com um único personagem dentro de um único ambiente foi brilhantemente cumprido pelo diretor e roteirista Gustav Möller. Os prêmios recebidos nos festivais de Sundance e Rotterdam e a pré-indicação ao Oscar são merecidos.
Confira o trailer:
por André Netto
andrenetto82005@gmail.com