Por Samuel Amaral (amaral.samuel@usp.br)
A celebração das oito décadas do jornal O Politécnico contou com uma tarde de palestras ministradas por personalidades de destaque na trajetória do periódico. O encontro aconteceu no mês de setembro de 2024, na Biblioteca Latino-Americana Victor Civita, onde o Grêmio da Escola Politécnica preparou uma exposição com volumes históricos. As edições vão desde a ditadura Vargas até o presente, passando por eventos políticos e culturais dos últimos 80 anos.
A abertura foi realizada pelo editor-chefe e diretor de comunicação, Diego Roiphe, que relembrou a trajetória e os momentos marcantes da entidade e de suas produções. “O grêmio é um órgão, antes de tudo, político”, destaca.
Dentre os que palestraram, estavam Allen Habert, redator do periódico em 1973 e engenheiro de produção; Carlos Dias, editor do jornal Valor Econômico; Eduardo Giannetti, economista, professor, escritor e membro da Academia Brasileira de Letras; Nabil Bonduki, professor titular de Planejamento Urbano da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP; entre outros.
Os assuntos tratados foram desde o relato de memórias pessoais, até debates sobre a função do engenheiro na economia e no desenvolvimento do Brasil, passando por jornalismo universitário, novos dilemas da profissão e o potencial de transformação da prática jornalística.
“Para a gente é realmente um sonho, é uma escala muito maior do que poderíamos ter imaginado para nós, como indivíduos que integram a gestão do Grêmio. Mas também em uma escala que totalmente faz jus ao tamanho do ‘O Politécnico’.”
Laura Carmieletto, presidente da atual gestão do Grêmio Politécnico
A exposição, que ficou disponível para visitantes até o dia 30 de setembro, atraiu os olhares de antigos alunos da Escola Politécnica e reuniu colegas de longa data. Os veteranos tiveram a oportunidade de conversar com a atual gestão, trocar ideias, dar dicas e sobretudo elogiar o que tem sido feito. “Fico realmente tocado. Acho bom estar aqui e encontrar essas pessoas. Estava lendo algumas edições antigas do Poli Campus [nome antigo do jornal] e fiquei tocado de ver a participação dos estudantes desde aquela época”, relata Sérgio Mindlin, engenheiro de produção e presidente do Grêmio de 1968 a 1969.
O jornal de ontem
O Politécnico nasceu em 1944, fundado por um grupo de estudantes do qual fazia parte Adolfo Lemes Gilioli (1912-2012), que registrou o periódico no Departamento de Imprensa e Propaganda como um “boletim informativo”. Em plena ditadura Vargas, o jornal decidiu se posicionar politicamente e, mesmo sem poder veicular propagandas para custear a produção, atuou como um veículo de informação e mobilização estudantil.
“É preciso muito idealismo para, na Segunda Guerra, no meio da ditadura Vargas, decidir criar um jornal.”
Carlos Dias, professor e editor do Valor Econômico
Em 1945, a redação chegou a defender a anistia para os presos políticos da ditadura. O projeto só foi integrado oficialmente ao Grêmio em sua 12° edição, quando decidiu manter o sistema de sucessão de diretores e se estruturar.
Nos anos que se seguiram, o periódico apoiou diversas mobilizações sociais. Como o movimento “O Petróleo é Nosso”e a Campanha Paula Souza para alfabetização de adultos, que foi iniciativa dos membros do Grêmio nos anos 1960.
Foi após o golpe de Estado de 1964 que a tensão aumentou. O jornal se fez presente ao lado do movimento estudantil, dos operários e camponeses, e se opôs ao regime militar, repudiando as prisões de estudantes da USP ocorridas nos anos 1970. “Era um ambiente pesado de discussão política, porque era um ano de repressão mais dura”, relembra Sérgio Mindlin, presidente do Grêmio durante o período do AI-5.
Em 1973, o periódico testemunhou o “Show Proibido” de Gilberto Gil feito na Poli, uma forma de denúncia contra os atos repressivos do regime ditatorial organizada pelos alunos. No evento, o cantor carregava no bolso a letra da canção Cálice, que faria sucesso nas vozes de Chico Buarque e Milton Nascimento anos depois.
As “Diretas Já”, ocorridas na primeira metade da década de 1980, foram apoiadas pelo jornal, que era a favor da retomada das eleições diretas para a Presidência da República. Em 1988, a Constituição Cidadã também foi debatida nas colunas do periódico.
“Engenheiros participam da vida nacional e tem que continuar participando”, comenta Mindlin. Ele também constata que os politécnicos, pessoas que cursam gratuitamente um curso de alta qualidade, devem estar preparados para devolver ao país, de alguma forma, uma contribuição por terem tido essa oportunidade.
O jornal de hoje
O Politécnico atualmente é lançado em quatro edições por ano, com uma tiragem de mil cópias por lançamento. Os alunos responsáveis distribuem o periódico pelos diversos departamentos da Escola Politécnica e da USP, sendo possível encontrá-lo na maior parte do campus.
As colunas e páginas hoje servem para divulgar a arte e as opiniões dos estudantes, acolher os ingressantes, e criar um canal de contato entre diferentes figuras da comunidade da Poli. “As vezes eu vejo os professores comentando sobre o jornal. O professor comentando com o outro ‘Ah, eu apareci aqui, quando você vai aparecer?’ é muito divertido”, comenta César Vargas, diretor de Cultura do Grêmio.
Para o futuro, a direção diz esperar o melhor. “Acho que tem um potencial de atingir cada vez mais pessoas, de ser cada vez mais impactante e de, articulando com as pessoas certas, causar impacto a nível estadual e nacional”, conclui Roiphe.