Continuando com o inabalável sucesso do seu álbum “A Mulher do Fim do Mundo”, Elza Soares prossegue com turnês pelo Brasil e o mundo: agenda cheia aos 80 anos de idade. Além disso, não possui apenas um show único, diversificando a gama de apresentações com propostas diferentes no âmbito temático, sonoro e visual. É o caso do show “A Voz e a Máquina”, apresentado na última sexta-feira (09) na Casa Natura Musical, em Pinheiros.
É uma releitura de outras canções de Elza, além da interpretação de versões também reformuladas de outros artistas. Homenageando cantores como Seu Jorge e Cazuza, Soares demonstrou sua grande versatilidade e afirmatividade em palco, além de uma produção audiovisual contemporânea e viva, mas não menos coerente com suas temáticas recorrentes (racismo, assédio, condição social da mulher), conseguindo se adaptar perfeitamente a sua maestria.
Os DJs Ricardo Muralha e Bruno Queiroz, em conjunto com o habilidoso guitarrista Caesar Barbosa, encarregados da produção musical e arranjos, parecem se juntar a Elza para complementar e remodelar sua voz, auxiliada por sintetizadores, samples de diversos artistas e composições eletrônicas atreladas ao som mais clássico do samba e do jazz. A veterana de voz inconfundível demonstra mais uma vez a sua capacidade de reinvenção e inovação.
Carregado na crítica, o show atravessa diferentes momentos sonoros e rítmicos, adentrando em batidas que poderiam pertencer a uma pista de dança europeia, enquanto outras relembram aquelas mais tradicionalmente brasileiras. “Vamo acordar galera! Acorda Brasil!” bradou a carioca várias vezes durante o show, principalmente em momentos de maior protesto (que não foram poucos). Dentre as canções interpretadas, estiveram, remixadas e rearranjadas: “Cálice” (Chico Buarque), “Milagres” (Barão Vermelho), “O Tempo Não Para” (Cazuza) e Hoje é Dia de Festa (Zeca Pagodinho) e a que ganhou clipe sob sua voz: “A Carne” (Seu Jorge). A reinterpretação de Barão Vermelho foi um dos momentos mais intensos da apresentação, em que a voz de Elza ficou em destaque com a instrumentação acústica mínima e impregnou a casa de shows com sua imponência já conhecida, enquanto entoava as notas sob a mensagem de crítica que a música evidencia.
Sentada, Soares foi acompanhada por projeções vivas, que mostravam imagens mais carregadas nas canções mais fortes, como de Brasília em construção, e pobreza em “O Tempo Não Para” ou do clipe de “A Carne”. Além dessas, também apresentou suas músicas mais recentes, como a colaboração com Pitty (“Na Pele”), e os sucessos de seu último álbum, como a titular “A Mulher do Fim do Mundo” e “Maria da Vila Matilde” ao final, servindo como uma forma ideal de amarrar todas as emoções e posicionamentos evidenciados ao longo do show.
Elza Soares possui uma carreira de décadas e parece disposta a continuar por mais, não limitando-se por nenhuma barreira, seja ela musical, visual ou mesmo temporal:
“Eu sou mulher do fim do mundo
Eu vou, eu vou, eu vou cantar
Me deixem cantar até o fim.”
Por Daniel Medina
danieltmedina@gmail.com