Este filme faz parte da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique aqui.
Família Submersa (Familia Sumergida, 2018) é mais uma experiência cinematográfica do que um filme em si. Experiência porque ele pede e merece imersão. Todos os elementos apresentados durante os 91 minutos têm algum sentido para a narrativa, mesmo que pareçam estranhos ou deslocados. A história é centrada em Marcela (Mercedes Morán), uma mulher de meia-idade, casada e que tem três filhos. Sua vida muda completamente quando sua irmã morre e ela tem que lidar com tudo o que foi deixado para trás. Entretanto, a personagem de Morán tem uma epifania digna de Clarice Lispector de como sua vida tão normal não faz muito sentido.
Um dos pontos questionados por ela é a sua própria organização de família. Seu marido viaja a trabalho e ela fica encarregada de lidar com o apartamento e os pertences da irmã, sua casa e seus filhos. Com isso, é perceptível a associação do enredo do com o título, já que o sentimento de “submersão” se fortalece a cada cena através do descolamento da protagonista das situações em que ela se encontra. Um exemplo que aparece muito no filme é uma cena silenciosa de Marcela arrumando a casa da irmã ou andando na rua com sons de outras vidas se passando ao fundo. Isso dá a impressão de quando estamos debaixo d’água, vendo e ouvindo o mundo acontecendo de maneira abafada. Ainda nesse vácuo familiar, Marcela se apoia em um amigo de sua filha, Nacho (Esteban Bigliardi), que a ajuda a passar pelo luto com conversas, viagens e reflexões.
Outro peso que a protagonista enfrenta é ver as vidas de seus filhos passando. Uma delas termina o relacionamento, outra sai de casa, o terceiro é assaltado. Enquanto, ela lida com o luto da morte de sua irmã, a ausência de seu marido e os problemas dos filhos, a casa ainda parece se rebelar contra Marcela. As roupas estão sempre amassadas, a louça sempre suja, a máquina de lavar quebra, a iluminação das janelas é pobre, as plantas estão todas meio mortas. E tudo isso só a submerge mais.
Além disso, um aspecto que tem bastante peso no enredo são as memórias da protagonista de membros da família que teriam sido “esquecidos” por terem morrido. Esses quase personagens representam o esquecimento da própria Marcela e acentuam os questionamentos que ela tem da sua rotina. Alguns outros elementos interessantes presentes no longa são as referências a voar e a ser livre. Uma delas é uma brincadeira dela com os filhos, em que simulam um voo pela sala de casa. Outra é o casulo se desabrochando em uma das intervenções da memória de família.
Família Submersa é um filme que gera bastante reflexão sobre a rotina e a satisfação com a própria vida, que acaba virando um peso sem que percebamos. Ele faz parte da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Por Maria Carolina Soares
mcarolinasoares@uol.com.br