Foram aproximadamente 6 anos e 6 meses de espera. Em abril de 2012, Roger Waters havia vindo para o Brasil, pela última vez, em turnê comemorativa do épico álbum “The Wall”. Até o anúncio da turnê “Us + Them”, em 2017, havia um forte rumor de que o ex-icônico membro do Pink Floyd não voltaria mais aos palcos. Porém, com a novidade, veio o novo álbum “Is This The Life We Really Want?”, em junho do mesmo ano. O trabalho quebrou um jejum de 25 anos sem discos do baixista.
O grande dia
A terça-feira (09/10) mais esperada da vida de muitos floydianos havia chegado, finalmente. O início das vendas para o show em São Paulo ocorreu em dezembro de 2017 e, desde então, foram 10 meses de expectativas, acompanhando vídeos e muitos comentários positivos sobre a turnê. A abertura dos portões se deu por volta das 17 horas. Apesar de ser no meio da semana, o público procurou chegar com antecedência para garantir um bom lugar. Nas filas, era possível notar pessoas de todas as idades, dos mais velhos às crianças.
A partir daí, iniciou-se mais uma contagem regressiva. Desta vez, para às 21 horas, horário em que começaria o show. Em meio à espera, eram notórias a ansiedade e a emoção de estar diante de uma lenda do rock. Muitos fãs aproveitaram o momento para comprar suas camisetas nas lojas oficiais, além de tirar muitas fotos e comentar sobre o amor pela banda, por Roger Waters ou pela música.
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Ao escurecer, o Allianz Parque foi se enchendo. Naquela noite, os ingressos estavam esgotados e, de fato, assim ocorreu. O tempo parecia estar cada vez mais devagar rumo ao grande momento.
Primeira parte
Com duração de aproximadamente três horas, Waters dividiu a sua apresentação em duas partes, separadas por um intervalo de 20 minutos. Ao soar das 21h, as luzes começaram a escurecer e uma projeção no grande telão de 70 metros de largura por 14 de comprimento surgiu para delírio do público.
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Inicialmente, o vídeo provocou grande ansiedade no público. No entanto, a sutileza das mudanças provocava certa impaciência em algumas pessoas, que não entendiam o que se passava. Ao longo dele, uma música leve e o sopro do mar começavam a se destacar. Por quase 20 minutos, a situação se manteve assim, até o céu passar a esboçar um vermelho intenso e aterrorizante. Era o início de uma noite inesquecível!
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As músicas de abertura foram “Speak to Me” e “Breathe” do álbum “The Dark Side Of The Moon”. O público foi ao delírio e cantou junto. A emoção era impossível de ser contida e muitos iam aos prantos ou ao êxtase. Ao assimilar o que aconteceu, logo outro clássico do Pink Floyd: “Time”.
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O guitarrista Jonathan Wilson foi o responsável por fazer as vezes de David Gilmour, e muito bem. Ao final da música, o show passou a mostrar qual seria a sua entonação: protesto, resistência e denúncia. A imagem de alguém vagando pela rua, à noite, em meio ao lixo e à indiferença de São Paulo, foi exibida e os fãs reagiram com aplausos.
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Logo em seguida, o clipe de “Welcome To The Machine” passou a ser exibido. A semelhança da música ao vivo com a gravada em estúdio foi estarrecedora e encantou os presentes. A sensação provocada veio em forma de pergunta: aquilo era real ou era sonho de um “floydiano”? Em meio à reflexão, Waters convidava a plateia a participar do show.
O ótimo trabalho realizado no álbum “Is This The Really Life We Want?”, obviamente não permitiria deixar algumas músicas de fora. A primeira a ser apresentada é “Dejá Vu”, seguida por “Picture That” e “The Last Refugee”. Músicas que abordam problemáticas atuais, como as guerras e a onda de refugiados e, por meio do forte olhar crítico do baixista, buscam trazê-las para o debate.
“Wish you were here” tomou conta após a apresentação dessas novidades. Com grande comoção, o público cantou loucamente esse grande hit do Pink Floyd. As mãos que se unem na turnê “Us + Them” apareceram pela primeira vez e, com a ascensão da música, foram se regenerando e se aproximando. Mas, no final da faixa, elas voltam a se desintegrar.
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O final da primeira parte foi concluído com “Another Brick In The Wall – Part 2” e “Another Brick In The Wall – Part 3”. A junção de feitos de iluminação, telão e som foram cruciais para tornar toda a narração das músicas em algo muito vivo para quem assistia. Durante toda a apresentação, crianças de São Paulo apareceram marchando e cantando a música e, ao final, as camisetas com a palavra “Resist” (resistir) foram exibidas e o telão reproduziu a frase em vermelho sangue.
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Segunda Parte
Durante a pausa, diversas mensagens críticas foram exibidas no telão. Waters preocupou-se em falar sobre aprendermos a resistir à indústria bélica, ao fascismo, à exploração infantil, ao antissemitismo, à tortura e à desigualdade social. O candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL) apareceu na lista de países onde o neofascismo estava avançando.
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O ex-Pink Floyd também criticou a forma como Israel tem lidado com a questão da Palestina. Ademais, foram exibidas mensagens sobre a importância de se respeitar os animais e não tratá-los de forma desigual, além de se preservar o meio ambiente.
A segunda parte viria cheia de expectativas, já que o CD “Animals” do Pink Floyd teria alguns hits tocados, até porque é o pilar crítico de toda a turnê. O fim do intervalo voltou com “Dogs”. Antes disso, porém, a Usina Termelétrica de Battersea (Inglaterra), que é capa do álbum citado, começou a ser projetada no telão. Ela surgiu do chão, crescendo de tal forma que as suas chaminés foram dispostas para fora da tela, com direito à fumaça. Uma superprodução que levou o público ao delírio.
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Na música também houve uma espécie de teatro. Enquanto a usina navegava pelo espaço, os porcos eram servidos por uma ovelha. Sim, você não leu errado. “Animals” divide a nossa sociedade em porcos (aqueles que mandam), os cachorros (que obedecem aos porcos e querem ser como eles) e as ovelhas (que servem os porcos e são submissas a eles), inspirado no livro “Revolução dos Bichos”, de George Orwell. O momento foi aproveitado para exibir placas com as seguintes mensagens: “Os porcos mandam no mundo!” e “Os porcos que se danem!”, esta última erguida por Waters.
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A sequência ficou por conta de “Pigs” e muitas satirizações apareceram projetadas no telão sobre Donald Trump, já que a música é usada como uma forte crítica ao presidente dos Estados Unidos. O grande porquinho, convidado especial que é recorrente nos shows do Roger Waters, vagou pelo público com ilustrações pelo seu corpo.
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“Money”, outro grande clássico do “The dark side of the moon”, foi executada de forma magistral, com o imponente solo do britânico. Atrás dele, era possível notar célebres figuras políticas mundiais em uma clara crítica ao sistema e seus protagonistas. A projeção da bomba de Hiroshima também apareceu no telão, em meio ao som das moedas. “Us and them” tocou em seguida, com imagens de repressão policial, protestos contrários e guerras.
Outra faixa do novo disco de Waters foi apresentada – “Smell the roses”. O cantor mostrou-se “acorrentado”, em claro repúdio aos governos autoritários e suas práticas de tortura. Outros clássicos do “The Dark Side of the Moon” foram tocados logo em seguida: “Brain damage” e “Eclipse”. Nesta, na pista premium foi formado o prisma da capa do álbum e, posteriormente, a hashtag #EleNão apareceu no telão pela primeira vez, dividindo o público entre vaias e aplausos.
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Após uma breve conversa com o público, a respeito da importância de nos mantermos unidos e da luta pelos Direitos Humanos, Waters fez uma breve pausa. Na volta, dois belos clássicos da banda de rock progressivo fecharam a noite mais mágica de qualquer fã “floydiano”: “Mother” e “Comfortably Numb”. Durante a execução da primeira, no trecho “Mother, should I trust the government?” (“Mãe, devo confiar no governo?”) novamente a hashtag #EleNão apareceu no telão. A repercussão no público foi tão alta que durante um pedaço da música era difícil escutar o artista. Mas “Comfortably Numb” surgiu e veio confortar os corações dos fãs que conhecem e respeitam verdadeiramente a importância, o ativismo e a luta de Roger Waters. Luta essa que deveria também partir de cada um de nós, pois em tempos difíceis, “Us + Them” nos ensina a resistir.
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Por Karina Merli
karina.merli@gmail.com