Este filme faz parte da 43ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique na tag no final do texto.
Reflexões nostálgicas, histórias tradicionais e concepções universais. E Em Cada Lentilha Um Deus é basicamente um retrato memorialístico da vida familiar do roteirista Luis Moya, mesclado com imagens que contam um pouco da história tradicional espanhola.
O documentário retrata a jornada de Luis na visita a seu irmão, Kiko Moya, e seu primo, Alberto Redrado. O motivo da visita era contribuir na composição de um livro sobre o restaurante da família, o L’Escaleta, premiado com duas estrelas Michelin. O retorno à cidade natal traz uma série de questões e memórias à tona e a produção assume um tom íntimo e sentimental.
O roteiro é dividido pelos pratos que vão sendo criados pelo chef Kiko, de forma que cada um traz consigo uma história da Espanha e da família, seja ela atual ou antiga. Assim, os momentos íntimos ligados ao L’Escaleta são mesclados com cenas típicas da região da pequena cidade de Cocentaina e da produção local, retratadas por uma fotografia belíssima. Através das câmeras, é possível sentir de fato o interior da Espanha em todas as suas características primordiais, sem grandes clichês midiáticos envolvidos.
Entretanto, a direção de Miguel Ángel Jiménez falha em estruturar a clareza do filme. A proposta de filmagem se excede na poeticidade e assume ângulos e estruturas típicas da ficção, de forma que é difícil identificar o caráter documental do longa. Em muitos momentos, as cenas parecem excessivamente ensaiadas e um espectador desatento poderia sair do cinema acreditando ter assistido a uma ficção.
Embora repleto de reflexões interessantes e histórias familiares tocantes, em muitos momentos E Em Cada Lentilha Um Deus assume um ritmo lento que beira o entediante. Há longos minutos de intervalo entre os acontecimentos interessantes, o que dá um tom monótono ao filme e dispersa a atenção. Pode ser difícil manter-se interessado e acompanhar a história após os momentos de lentidão do filme, que tem dificuldade de se recuperar desses.
O longa tem como propósito mostrar uma realidade intimista da cozinha espanhola, fazendo o público se reaproximar de uma gastronomia real e simples, ao mesmo tempo em que é refinada e tradicional. Através dele, os donos do L’Escaleta anunciam que a boa culinária de verdade está ligada às raízes, memórias e sentimentos de quem a cozinha e de seu povo. Nesse ponto, é muito bem sucedido. Contudo, certamente poderia fazê-lo de forma mais sucinta e, talvez, concreta.