Este filme faz parte da 43ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique na tag no final do texto.
Imagens das ruas de Istambul, carros, mar e edifícios são o cenário da primeira metade do filme turco Pertencer (Aidiyet, 2019), escrito e dirigido por Burak Cevic. Sobre as imagens que não mostram pessoas, é possível escutar uma música suave e contínua, além da voz de um homem não identificado que lembra detalhes de como conheceu sua namorada.
Ela estava num bar, mas parecia triste e não prestava atenção na música. Isso chamou a atenção do narrador, que decidiu segui-la e puxar conversa do lado de fora do estabelecimento. A partir daí, ele e a jovem Pelin, cujo nome faz referência a uma flor, desenvolvem uma relação e tornam-se namorados.
Em uma cena cinzenta que mostra ondas quebrando num rochedo, o narrador conta que um dia a moça diz estar descontente e deseja terminar o relacionamento. Ele não aceita a decisão e promete fazer de tudo para ficarem juntos, até que ela pede ajuda para matar os próprios pais. O narrador concorda e a partir daí, ainda sem revelar o rosto dos protagonistas ou de qualquer pessoa, o filme mostra como os dois planejaram e executaram os pais de Pelin.
A desconexão entre texto e imagem faz com que a atenção na história narrada seja dobrada, apesar de também cansar o espectador. Quando o narrador termina de contar como planejou o crime a sangue frio, o fundo da tela fica preto e sobem créditos com o nome do filme, mas a ação não acaba aí.
A segunda metade longa recupera a história contada pelo narrador de maneira direta e convencional, mostrando com diálogos e imagens correspondentes os fatos apresentados anteriormente. Agora, é possível conhecer o narrador Onur (Çaglar Yalçinkaya) e a estudante Pelin (Eylül Su Sapan), de apenas 21 anos, e acompanhar o desenrolar de seu relacionamento e dos planos para matar os pais da jovem, que nunca são mostrados no filme.
É curioso assistir à segunda parte do longa sabendo como a história termina e perceber como o acontecimento narrado de forma distanciada na primeira parte torna-se pessoal e cruel. Nas cenas finais da obra, os personagens voltam a sumir, dando lugar novamente à narração que traz uma revelação importante, sobre uma sequência de imagens que agora fazem sentido.
Mesmo sem mostrar imagens violentas, Pertencer provoca desconforto por mostrar a banalização da vida e o raciocínio que leva ao planejamento de um assassinato. Se filmado de maneira convencional, provavelmente a narrativa não teria o mesmo impacto e entraria sem fazer alarde para a enorme lista de filmes sobre psicopatas.
Confira o trailer: