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Copa de 1958: a primeira estrela

Há 65 anos, acontecia a primeira conquista mundial da Seleção Brasileira de Futebol

Por Davi Caldas (odavicaldas@usp.br) e Miriã Gama (miria.g.s@usp.br)

No dia 29 de junho de 1958, o Brasil venceu a final contra a Suécia e sagrou-se campeão da Copa do Mundo de 1958. A primeira estrela na amarelinha veio após uma campanha marcada pelo talento de craques como Garrincha, Vavá e Gylmar e a ascensão do jovem Pelé. A Copa de 58 foi o primeiro passo significativo para a reconstrução da seleção depois do vexame na Copa de 50 e abriu espaço para uma geração que conquistaria o bicampeonato mundial em 62.

Em entrevista ao Arquibancada, Milton Leite, jornalista e locutor esportivo, comentou que essa conquista foi essencial para a projeção do Brasil entre as potências do futebol mundial, além de contribuir para hegemonia da seleção que viria nas duas décadas seguintes. “Provavelmente uma derrota naquele Mundial teria retardado um pouco o processo de mudança de patamar da seleção brasileira”, afirma.

Em 1958, a seleção brasileira foi a primeira seleção sul-americana a vencer uma Copa do Mundo fora de seu continente [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]

Maracanaço e a promessa de Pelé

Após 12 anos sem nenhuma edição, devido a Segunda Guerra Mundial, a Copa do Mundo voltou a ocorrer em 1950. Essa edição foi a primeira do torneio a ser sediada no Brasil e era a chance perfeita para a seleção da casa conquistar sua primeira Copa, logo na sua terra natal — assim como o Uruguai já havia feito em 1930 e a Itália em 1934. Na expectativa de realizar o feito histórico, um grande palco foi construído no Rio de Janeiro: o Estádio Maracanã.

E foi o Maracanã que recebeu a estreia da seleção brasileira, no dia 25 de junho, que terminou com uma vitória por 4 a 0 contra o México. O confronto seguinte foi diante da Suíça, no estádio Pacaembu, em São Paulo, e a partida acabou empatada, o que complicou a situação dos brasileiros no grupo 1. Para avançar às fases finais, o Brasil precisava de uma vitória contra a Iugoslávia, que felizmente aconteceu: no dia 1 de julho, no Maracanã novamente, a seleção brasileira venceu o adversário por 2 a 0.

Com a vitória, a equipe brasileira ficou na primeira colocação do grupo 1 e se classificou para a fase final, juntamente com os primeiros dos outros três grupos iniciais: Espanha, Suécia e Uruguai. O torneio foi decidido em uma final quadrangular, em que todos os times se enfrentaram e o maior pontuador se sagrou campeão. Nessa fase, o Brasil conquistou todo seu favoritismo, goleando os suecos por 7 a 1 e os espanhóis por 6 a 1. Embalado pelas duas grandes vitórias, o Brasil chegou como favorito absoluto para o confronto contra o Uruguai, já que até um empate daria o título aos brasileiros.

As manchetes dos jornais comemoravam o título antes mesmo da bola rolar e dava a vitória brasileira como certa. Precisando apenas de um empate e com a previsão de um grande apoio da torcida nas arquibancadas, perder para o Uruguai era algo impossível aos olhos de torcedores e jornalistas [Imagem: Reprodução/Twitter @FuteboleDebate]

No dia 16 de julho de 1950, a bola rolou no Maracanã para Brasil e Uruguai, com mais de 200 mil torcedores assistindo a partida (oficialmente, contabiliza-se cerca de 174 mil). Os donos da casa abriram o placar com Friança, aos 47’, mas levou a virada com os gols de Schiaffino, aos 66’, e de Ghiggia, aos 79’. O impossível aconteceu, a seleção brasileira foi derrotada pela uruguaia e perdeu o título. O jogo trágico para o Brasil ficou conhecido como “Maracanaço”. Ademir, centroavante brasileiro, foi artilheiro da edição com nove gols em seis jogos.

Ao ver seu pai chorando com a derrota, Édson Arantes do Nascimento, o Pelé, fez uma promessa ao seu pai: “Não se preocupe, pai, eu vou ganhar a Copa do Mundo para nós”. Na época, ainda estava prestes a completar 10 anos de idade, mas o jovem menino já previu o que aconteceria com ele em 1958, aos 17 anos.

Ao ver seu pai chorando com a derrota, Édson Arantes do Nascimento, o Pelé, fez uma promessa ao seu pai: “Não se preocupe, pai, eu vou ganhar a Copa do Mundo para nós”. Na época, ainda estava prestes a completar 10 anos de idade, mas o jovem menino já previu o que aconteceria com ele em 1958, aos 17 anos.

https://www.instagram.com/p/ClypqW3uOl1/?igshid=MzRlODBiNWFlZA==

Em entrevista ao Arquibancada, Pepe, o “Canhão da Vila”, que participou do elenco campeão em 1958, comenta sobre como o time se sentiu, de certa forma, pressionado a ganhar para eliminar o “fantasma de 1950”: “A seleção vinha de algumas desilusões, então esse time de 1958 mostrou que o Brasil era realmente um país do futebol. Foi um episódio marcante, porque daí para frente, o futebol brasileiro passou a ser respeitado no mundo inteiro”, conta.

Novas chances para a seleção

A edição seguinte da Copa teve como país-sede a Suíça, em comemoração aos 50 anos da FIFA, e foi marcada pela alta quantidade de gols – com média de 5,38 gols por partida. Em 1954, o Brasil teve uma campanha discreta na fase de grupos, com um empate e uma vitória, e acabou sendo superado pela forte seleção húngara nas quartas de final. O jogo, que terminou em 4 a 2 para Hungria, foi marcado pela violência e ficou conhecido como a “A Batalha de Berna”. A grande campeã daquele ano foi a Alemanha Ocidental, que venceu os húngaros na final.

Após a final de 50, o uniforme branco foi substituído em 54 por camisas amarelas e calções azuis. Foi a primeira vez que a seleção brasileira utilizou o uniforme que seria imortalizado anos depois [Imagem: Reprodução/Twitter @SaoPauloFC]

Quatro anos depois, em 1958, chegou a hora de mais uma Copa do Mundo ser disputada, dessa vez com sede na Suécia, que foi escolhida pelo posicionamento neutro na última grande guerra — já que a Europa ainda sofria as consequências do confronto. Essa foi a primeira edição realizada sem o idealizador das Copas, Jules Rimet, que havia falecido dois anos antes.

Das 53 equipes que se inscreveram para as Eliminatórias, apenas 14 se classificaram e se juntaram à Suécia, anfitriã, e à Alemanha Ocidental, vencedora em 54, para disputarem o mundial. Ficaram de fora grandes nomes como Uruguai, eliminado pelo Paraguai, e Itália, superada pela Irlanda do Norte. O Brasil enfrentou somente a seleção peruana — após a desistência da Venezuela — e a classificação não foi um algo fácil: depois de um empate por 1 a 1 em Lima, Didi marcou o único gol da vitória brasileira no jogo de volta, que aconteceu no Maracanã.

Apesar da nova geração de jogadores brasileiros, o fantasma do trauma de 1950 ainda assombrava a seleção. O grupo do Brasil, número 4, ainda contava com a União Soviética, uma das grandes favoritas ao título, além de Inglaterra e Áustria. Em um grupo considerado difícil e sem a confiança da torcida, a Copa de 58 tinha tudo para se tornar mais um trauma futebolístico brasileiro, mas a história foi escrita de forma diferente: contrariando toda lógica, o Brasil foi o grande campeão da Copa do Mundo.

Antes do início da Copa do Mundo, o Brasil não era visto como um dos favoritos para ganhar o torneio. Em entrevista ao Arquibancada, Fernando Rêgo Barros, autor do livro 1958 – Como ganhamos a Copa na Suécia, comenta: “A seleção saiu desacreditada do Brasil. Entre os cronistas esportivos, Nelson Rodrigues era um dos poucos que confiavam no time. Foi durante a competição que o Brasil foi ganhando o respeito da crônica esportiva brasileira e internacional”. Entre as seleções cotadas como favoritas, poderiam ser citadas a França, a Alemanha e a União Soviética.

Segundo Fernando, a conquista deste mundial foi importante porque mexeu e elevou a autoestima dos brasileiros, que estava abalada pelos dois fracassos anteriores. “Ganhar em 1958, e ganhar como ganhou, com goleadas na semifinal e na final, mostrou que os pessimistas estavam errados [em duvidar da seleção]”, comenta.

O triunfo brasileiro

A delegação brasileira embarcou para Suécia sob a liderança do empresário Paulo Machado de Carvalho, possuindo um esquema que priorizava a organização, e até mesmo um psicólogo integrou a equipe técnica. Na imagem, o cartaz promocional da Copa de 58 [Imagem: Divulgação/FIFA]

O Brasil teve a sua estreia no dia 8 de junho de 1958, contra a seleção austríaca. Em um jogo muito difícil no início, o desempate só veio a ocorrer aos 38’, em um cruzamento de Zagallo para José Altafini, o Mazzola, que pegou de primeira na bola e fez o gol. E logo no começo do segundo tempo, aos 49’, Nilton Santos roubou a bola um pouco à frente do meio do campo e fez uma tabelinha com Mazzola, que apareceu novamente no jogo para dar a assistência ao lateral, recebendo a bola dentro da área e finalizando para o gol. O último gol da partida veio só aos 89’, em um belo lançamento de Didi para Mazzola, que recebeu a bola na entrada da área, de frente para o goleiro, e fez o terceiro gol do Brasil para selar a primeira vitória na Copa do Mundo.

O segundo confronto foi contra a Inglaterra. Com um empate no primeiro jogo, a seleção inglesa estava em busca de uma vitória para aumentar as suas chances de classificação. Mas o jogo, na verdade, teve muitas boas chances do Brasil, que foram barradas pelo goleiro inglês Colin McDonald. Gylmar, goleiro brasileiro, também contribuiu fazendo boas defesas, e cooperou para o primeiro placar de 0 a 0 na história das Copas do Mundo.

Apesar do empate sem gols, esse jogo foi um marco na seleção brasileira, já que, além de ter sido a estreia de Vavá na competição, também foi o ponto de entrada para duas peças fundamentais. Isso ocorreu pelo fato do técnico Vicente Feola buscar uma tática mais ofensiva para a partida seguinte e optar por substituir Joel e Mazzola, que não estava 100% devido a uma lesão, por Garrincha e Pelé. Assim, o jogo contra a União Soviética representou o primeiro da dupla histórica  em uma Copa do Mundo. Além deles, Zito também foi promovido a titular, no lugar de Dino Sani, com a ideia de dar mais liberdade a Didi e deixá-lo flutuar pelo meio campo.

Logo nos minutos iniciais do jogo as mudanças do técnico já se mostraram muito acertadas: no primeiro lance, Garrincha aplicou uma sequência de dribles e, com uma bela finta na entrada da área, desnorteou a marcação de Kuznetsov e acertou um grande chute na trave do lendário Lev Yashin, o melhor goleiro do mundo. Na jogada seguinte, a União Soviética tentou um ataque, mas após um desarme de Zito, o Brasil aplicou o contra-ataque que resultou em mais uma bola na trave do, futuro Rei, Pelé.

A seleção brasileira nunca perdeu com Pelé e Garrincha jogando juntos dentro das quatro linhas [Reprodução/Instagram @pele]

A pressão brasileira foi tão intensa nos três minutos iniciais que, com tanta insistência, o empate não persistiu por muito tempo. Ainda aos 3’, Didi fez um passe incrível, de trivela, para Vavá. O passe deslocou a marcação, e Vavá saiu, na entrada da área, livre para chutar forte no gol, o que não deu chances de defesa para o Aranha Negra, o goleiro soviético, e abriu o placar para o Brasil.

O segundo gol do time brasileiro só saiu aos 65’, de novo com Vavá, que finalizou — em uma forma de carrinho e já quase dentro da pequena área — após uma tabela com o menino Pelé, que, na época, foi o jogador mais jovem da história a disputar uma Copa do Mundo, com 17 anos e 235 dias (no dia do jogo contra a União Soviética). Ao final da partida, o jornalista francês Gabriel Hanot, o idealizador da Liga dos Campeões e da Bola de Ouro, escreveu ao L’Equipe: “aqueles foram os melhores três minutos que o futebol já presenciou”, referindo-se aos três minutos iniciais da seleção brasileira.

Classificado como primeiro colocado do grupo, com sete pontos, o Brasil foi direto para as quartas de final, em que enfrentou o País de Gales. A única mudança no time que disputou o  jogo anterior foi a saída de Vavá, que sentiu uma leve lesão no tornozelo, para a entrada de Mazzola. Com o craque do time, John Charles, lesionado, e menos dias de descanso devido a uma rodada pré-quartas entre o segundo e o terceiro colocado de seu grupo — Hungria e País de Gales, respectivamente —, a seleção galesa conseguiu resistir muito bem ao ataque do Brasil, com uma boa marcação e ótimas defesas de seu goleiro, Jack Kelsey.

Porém, aos 66’ a história do futebol e das Copas do Mundo tinha algo escrito para Pelé: ele recebe a bola, escorada por Didi, dentro da área e, sem deixar a bola cair, dá um chapéu no zagueiro Mel Charles — encobrindo o joelho do marcador —, finalizando logo em sequência. Um golaço que garantiu a vitória do time brasileiro e rendeu ao Pelé o recorde, que perdura até os dias atuais, de jogador mais jovem da história a fazer um gol em uma Copa do Mundo, com 17 anos e 239 dias. O Brasil ainda chegou a balançar o travessão em um cabeceio após uma cobrança de escanteio, e Mazzola teve um golaço de bicicleta anulado por jogo perigoso, mas o placar final ficou em 1 a 0. Até então, Gylmar ainda não tinha tomado nenhum gol na Copa, com quatro jogos disputados.

Na semifinal, a seleção brasileira enfrentou a França de Just Fontaine — que tinha o melhor ataque da competição até então, com 15 gols em quatro jogos. Nesta edição, o francês entrou para a história com o recorde de mais gols marcados em uma única edição de Copa do Mundo, com 13 gols, que dura até os dias atuais. O Brasil abriu o placar logo aos 2’, com um cruzamento de Didi para Vavá, que dominou no peito na marca do pênalti e finalizou para fazer o gol. Pelo lado da França, Fontaine queria deixar o dele, e logo após uma boa tentativa que parou no goleiro brasileiro Gylmar, o francês recebeu a bola na área, driblou o goleiro e fez o gol de empate aos 9’.

O jogo continuou com boas chances dos dois lados, com a melhor delas sendo do Brasil, em um chute de Zagallo que acertou o travessão e fez a bola pingar dentro do gol, mas o árbitro da partida — Sandy Griffiths — não marcou após confirmar com o bandeirinha — Reginald Leafe. Houve também muitas grandes defesas do goleiro francês Claude Abbes. Mas apesar de estar em um dia inspirado, Abbes não conseguiu defender o chutaço no ângulo de Didi de fora da área, aos 39’, para dar a vantagem à seleção brasileira antes do intervalo de jogo. Ainda no primeiro tempo, poderia ter saído o terceiro gol do Brasil, mas foi marcado impedimento em um gol de Garrincha.

Um pouco antes do segundo gol brasileiro, o zagueiro e capitão francês Robert Jonquet se machucou em uma dividida com Vavá e teve que sair do jogo. Como na época ainda não existia a substituição, a França teve que continuar com um jogador a menos durante alguns minutos e praticamente durante o restante da partida, já que mesmo após a sua volta, Jonquet não tinha condições de jogo e foi apenas fazer número na ponta esquerda da seleção francesa, mancando.

No começo do segundo tempo, o jogo seguiu com os goleiros sendo os principais destaques da partida, com ênfase no goleiro francês. Mas por ironia do destino, aos 52’, Abbes falhou em um cruzamento na área, e deixou a bola sobrar para Pelé, que empurrou a bola para um gol sem goleiro. Apesar da falha, Abbes seguiu operando milagres para evitar mais gols do Brasil, mas aos 64’ não conseguiu evitar o segundo de Pelé, que após uma boa jogada de Mané, tentou um passe para Vavá dentro da área. Com o passe bloqueado, a bola sobrou novamente para Pelé, que aproveitou o rebote e chutou para o fundo das redes. 

Aos 75’, Didi fez um belo passe para Pelé dominar a bola com a coxa e, sem deixar a bola cair, chutar na entrada da área para fazer um golaço e completar o seu hat-trick (um triplete, ou seja, o jogador fazer três gols em uma mesma partida). Com esse quinto gol do Brasil, Pelé quebrou mais um recorde ao se tornar o jogador mais jovem a fazer um hat-trick em um jogo de Copa do Mundo, com 17 anos e 244 dias. Antes do fim do jogo, aos 83’, ainda saiu mais um gol da França, com uma bela jogada de Roger Piantoni, que deu uma caneta em Zito, cortou o capitão brasileiro Bellini e chutou de fora da área no cantinho do gol para fazer o 5 a 2, placar final da partida. Ainda durante a Copa, a imprensa francesa aclamou Pelé como “o rei do futebol”.

Na grande final, que ocorreu no dia 29 de junho de 1958, a seleção brasileira enfrentou a dona da casa, Suécia. E com a torcida a seu favor, a Suécia abriu o placar aos 4’ com um lindo gol do capitão sueco Nils Liedholm, que após cortar a dupla de zaga brasileira, Orlando e Bellini, chutou rasteiro no cantinho do gol. Pela primeira vez nesta Copa atrás do placar, o Brasil foi buscar o empate aos 9’, com Garrincha driblando o zagueiro sueco Sven Axbom e cruzando para a entrada da pequena área. A bola passou por Pelé e sobrou para Vavá colocar dentro do gol.

No minuto seguinte, Pelé ainda acertou uma bola na trave com chutaço de fora da área.  Mesmo com o Brasil melhor na partida, aos 26’ Zagallo teve que tirar uma bola, de cabeça, em cima da linha para evitar o gol sueco, após um cruzamento que ia em direção às redes. Apesar do susto, o Brasil teve mais algumas boas chances, e o desempate aconteceu aos 32’, com um gol muito parecido ao anterior: Mané driblou Axbom, cruzou na pequena área e Vavá fez o gol, dessa vez dando um carrinho na bola. O primeiro tempo seguiu com bons lances dos dois lados, mas sem muito perigo em nenhum deles.

E logo no início do segundo tempo, aos 55’, aconteceu um dos gols mais bonitos de uma final de Copa do Mundo na história: Nilton Santos lançou a bola para dentro da área, e Pelé dominou a bola com o peito já tirando a marcação em cima dele — do meia Sigge Parling —, deu um chapéu no zagueiro Orvar Bergmark e, sem deixar a bola cair no chão, chutou para concretizar o seu golaço na final. Sem parar de atacar, o Brasil conseguiu ampliar o placar aos 68’, com Zagallo ganhando uma dividida após uma bola respingada em um chute de Zito e deslocando o goleiro Kalle Svensson, finalizando por baixo dele.

A seleção brasileira ainda poderia ter um pênalti marcado a seu favor, já que, aos 77’, Garrincha sofreu uma falta em cima da linha da área, mas o árbitro Maurice Guigue marcou fora da marcação. Porém, aos 80’, quem ampliou foi a Suécia, com Liedholm fazendo um belo passe em profundidade para o atacante Agne Simonsson, que finalizou na saída de Gylmar para fazer o gol. Já aos 90’, para finalizar o show brasileiro, Pelé dominou a bola no peito após um lançamento, passou de calcanhar para Zagallo, que cruzou a bola no meio da área para o próprio Pelé cabecear e fazer o último gol da partida, terminando o jogo em 5 a 2 e com o Brasil campeão inédito.

Apesar da seleção brasileira ter jogado contra o time anfitrião, Pepe relata que a decisão foi um alívio: “A Suécia tinha um futebol sério e responsável, mas não era considerada uma seleção favorita para ganhar uma Copa do Mundo. Até certo ponto, ficamos felizes de saber que jogaríamos contra a Suécia.” Ainda comenta que o time sueco não era violento, e ao final da partida, viu o público do estádio ovacionar a seleção brasileira, mesmo tendo perdido a final.

Uma curiosidade dessa final é que, nela, ocorreram dois recordes: o jogador mais jovem e o mais velho a marcar um gol na final de uma Copa do Mundo. O mais jovem foi Pelé novamente, com 17 anos e 249 dias, e o mais velho foi o capitão da Suécia, Liedholm, com 35 anos e 263 dias. Ao final da competição, o meia Didi foi eleito o melhor jogador da competição, enquanto Pelé, vice-artilheiro da Copa com seis gols (atrás apenas de Fontaine, com 13), foi o melhor jogador jovem. 

Além disso, é importante ressaltar como o Brasil jogava naquela Copa: no esquema tático, o Brasil era escalado em um 4-2-4, mas Zagallo recuava para ajudar na marcação, criando um 4-3-3 (novidade na época). Além disso, em entrevista ao Arquibancada, o jornalista Paulo Vinícius Coelho, o PVC, explica que a seleção brasileira de 1958 teve influência húngara: “O Feola foi o técnico assistente do Béla Guttmann no São Paulo campeão paulista de 1957, e o húngaro fazia parte da comissão técnica da Hungria de 1954, que eliminou o Brasil. Então, o Feola aprendeu muita coisa com o Guttmann e levou para a seleção brasileira”.

Sobre o título, Fernando encara a organização da seleção brasileira como fator fundamental para a conquista: “Parece mentira, mas, pela primeira vez, o Brasil teve uma comissão técnica, com técnico, supervisor, médico, preparador físico e até dentista. Antes, o treinador decidia tudo sozinho”. Ainda elogia o técnico Vicente Feola por não ser centralizador e escutar os outros membros da comissão.

Pepe também comenta a sua falta de sorte sobre ter se lesionado logo antes da Copa, o que o impediu de jogar (apesar de continuar no elenco), e conta como foi a experiência como torcedor nas arquibancadas: “Foi uma oportunidade boa pro Zagallo, que fez uma boa Copa. Na arquibancada, a gente [ele e outros jogadores reservas] ficava torcendo. Eu me lembro de que quando o Brasil estava sendo pressionado, o Nilton Santos gritava ‘Dá a bola pro Mané!’. E o Garrincha realmente arrebentava. Ele foi, talvez, o maior assistente da história do futebol brasileiro”.

Sobre a seleção, afirma: “Foi uma das melhores do futebol brasileiro de todos os tempos. Um time genial e maravilhoso que encantou a Suécia inteira com Pelé e Garrincha, jogadores de outro mundo. A gente sentia que os adversários temiam muito a seleção brasileira depois que a viam jogar”.

Na comemoração, ao receber a taça Jules Rimet, o capitão brasileiro Bellini levantou o troféu a pedido dos fotógrafos.  Isso fez nascer a marca registrada não só dos campeões de Copa do Mundo, mas de qualquer campeonato no futebol: a de levantar a taça de campeão [Imagem: Reprodução/Twitter @SaoPauloFC]

A primeira coroa para o Rei

A Copa de 1958 foi a primeira grande exposição a nível mundial da genialidade e do talento de Edson Arantes do Nascimento. Milton categoriza essa competição como a apresentação do craque para o mundo e Fernando ressalta a importância do jovem Pelé ter entrado em um time com jogadores experientes — como Didi, Nilton Santos e Zito —, o que o permitiu jogar sem sentir tanta pressão e com confiança. PVC ainda afirma: “Você não tem um craque de 17 anos brilhando se você não tem uma referência mais velha”, citando Didi, craque da competição, como a grande referência da seleção, aos 29 anos.

Dessa forma, o jovem de apenas 17 estabeleceu recordes que até hoje não foram superados, consagrando-se como uma referência no futebol mundial e, nos anos seguintes, mudou completamente a forma do Brasil jogar, tornando-se a grande estrela do time naquela geração. “A presença de Pelé na seleção foi fundamental para que o Brasil alcançasse o prestígio que alcançou no mundo. A partir daquela Copa, o Brasil passou a ser reconhecido como uma potência do futebol”, afirma Fernando. 

Companheiro de Pelé no Santos durante praticamente toda a sua carreira, Pepe comenta: “Eu reverencio o Pelé desde que ele chegou na Vila Belmiro. Quando o Waldemar de Brito o trouxe, fui a primeira pessoa a conhecer o Pelé. Ele sempre fazia coisas novas a cada jogo, é eterno, fantástico, maravilhoso, tudo que falarem do Pelé eu assino embaixo”.

Após a conquista, Pelé não conseguiu conter as lágrimas e foi consolado por Djalma Santos (à esquerda) e Gylmar (à direita) [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]

Um fato curioso é que a camisa 10 foi parar com Pelé acidentalmente. O dirigente Paulo Machado de Carvalho, entre as tantas responsabilidades que tinha cuidando da delegação e do time, garantindo cuidados como alimentação e planos de voos, se esqueceu de mandar a numeração dos jogadores para a FIFA. A entidade então definiu de forma aleatória a numeração dos convocados e, por uma feliz coincidência, o Rei ficou com o número 10.

Depois de Pelé, a seleção nunca mais foi a mesma de antes. Após o Rei, o número 10 ganhou um significado e destaque diferente. A partir de Edson Arantes do Nascimento, o futebol conhecido foi elevado de patamar. O jogador encantou, emocionou, revolucionou e mudou completamente a história do futebol brasileiro. 58 foi o primeiro grande passo na trilha de sucessos dele, a primeira coroa para o Rei do futebol. 

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