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Rivalidade feminina nos filmes dos anos 2000

Como a falta de sororidade nos filmes teens do início do século 21, afetou as relações entre mulheres da geração millenial

Por Fernanda Silva (fernandarsilva@usp.br)

Os anos 2000 foram caracterizados por muitos elementos: a popularização da internet, o RBD, a moda emo, as calças de cinturas baixas e… filmes teens cheios de rivalidade feminina! A primeira década do século 21 é recheada de obras cinematográficas marcantes como Meninas Malvadas (Mean Girls, 2004), A Nova Cinderela (A Cinderella Story, 2004) e High School Musical (2006). 

Em todas essas produções, vemos uma presença muito forte das brigas entre mulheres adolescentes. Conflitos  esses que, no geral, são motivados por motivos fúteis, ou pior: por conta de um homem no caminho das personagens. Diante desses roteiros, vem a seguinte dúvida: como os comportamentos vistos na tela influenciaram a falta de sororidade nas relações da vida real entre as mulheres do final da geração millennial e do início da geração Z?

O que é a sororidade?

Segundo a Academia Brasileira de Letras (ABL), a palavra deriva do latim com a união do termo soror, que significa irmã, e o sufixo -dade, que é aplicado para formar substantivos derivados de adjetivos. A ABL ainda explica que a sororidade é o sentimento de irmandade, empatia e solidariedade, por conta do compartilhamento da mesma identidade de gênero. Além disso, a palavra também pode definir uma conduta de oposição às formas de exclusão e opressão contra as mulheres.

Kate Millet foi a primeira mulher a usar o termo ‘sororidade’ dentro do movimento feminista [Imagem: Reprodução/ YouTube/Open Media]

Dentro do feminismo, a palavra foi proposta pela primeira vez, em 1970, pela autora e ativista Kate Millet, que sentiu a necessidade de se definir um termo que construísse um objetivo para a luta feminina. Ela queria uma palavra que representasse uma união que vazasse para além da etnia, da classe social, da religião, entre outras diferenças, algo que ligasse todas as mulheres.

Por que falta sororidade nos filmes teens dos anos 2000?

Para compreender o porquê da falta de sororidade nos filmes do início do século, é preciso observar e analisar as situações mostradas nas tramas. Apesar da falta de empatia entre as mulheres, é preciso deixar bem claro que não há problema algum em consumir e divertir-se com os filmes que serão citados abaixo. O importante é compreender seus possíveis efeitos nas mentes de seu público-alvo.

High School Musical

Sharpay não mede esforços para conquistar Troy [Imagem: Reprodução/Youtube/Disney]

Em High School Musical, durante a disputa de Troy (Zac Efron) e Gabriella (Vanessa Hudgens) contra os vilões Ryan (Lucas Grabeel) e Sharpay Evans (Ashley Tisdale), é visível como o incômodo da antagonista é mais direcionado à garota da dupla rival. 

Sharpay  faz questão de procurar tudo sobre o passado de Gabriella, a fim de afastá-la do papel de teatro pelo qual as duas estão concorrendo. Além de intimidá-la nas inscrições para as audições e acusá-la de atirar alimentos em cima da concorrente. Entretanto, contra Troy, a jovem mantém uma postura calma e amigável, pois existe um interesse romântico pelo atleta.

A situação fica ainda mais escancarada em High School Musical 2 (2007), quando Sharpay faz de tudo para trazer Bolton para perto de sua família. Em um determinado momento ela chega a dizer a Gabriella que venceu, mostrando a clara competitividade entre as duas.

A Nova Cinderela

Dentre todas as mulheres do elenco principal de A Nova Cinderela, apenas uma é amiga da protagonista [Imagem: Reprodução/Warner Bros. Pictures]

Um ponto curioso em A Nova Cinderela, filme que reinventa o conto de fadas da Cinderela, é que a rivalidade não acontece apenas por parte da garota popular da escola. Sam (Hilary Duff), a protagonista, já sofre dentro de sua casa, graças a sua madrasta Fiona (Jennifer Coolidge) que a odeia e a enxerga como uma rival. A mulher também incentiva suas filhas a atacarem a enteada sem motivo algum, criando uma atmosfera de competição feminina o tempo todo. 

Outro ponto a se destacar é que, com exceção de Rhonda (Regina King), que representa a figura da fada madrinha, todas as figuras femininas do filme tentam fazer algum mal para a protagonista. Por outro lado, os homens estão sempre em uma posição de amizade e companheirismo, mesmo quando Austin (Chad Michael Murphy) faz algum mal para Sam, o roteiro dá um jeito de colocar a culpa sobre as mulheres da história.

Meninas Malvadas

Regina George é lembrada até hoje como um mau exemplo de comportamento. [Imagem: Reprodução/Paramount]

Meninas Malvadas pode até ser um clássico moderno cheio de referências marcantes para a cultura pop, mas é inegável que o filme é um dos mais tóxicos no quesito disputas entre mulheres. 

A obra apresenta relações traiçoeiras entre todas as personagens femininas. Ao entrar em uma escola nova, Cady (Lindsay Lohan) inicia uma amizade com Janis (Lizzy Caplan). Essa por sua vez convence a novata a prejudicar Regina George (Rachel McAdams), se infiltrando no grupo da antagonista, já que fizeram bullying com Janis. Entretanto, não demora para Cady entender que as garotas populares estão sempre “se apunhalando pelas costas”, mas ela mesma fica cega com o poder e trai a confiança de Janis.

O filme consegue se redimir ao fim da trama com a professora Norbury (Tina Fey) que consegue explicar às garotas do Colégio North Shore, os problemas existentes na forma como elas se relacionam.

Por que adolescentes são influenciáveis?

A professora de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Alda Elizabeth, explica que durante a adolescência, além das mudanças hormonais, também existem mudanças significativas no campo cerebral. Sobretudo, nas regiões do córtex parietal, núcleo acumbente, córtex pré-frontal e amígdala.

O córtex parietal desempenha o papel de registrar as mudanças nos movimentos e na imagem do corpo, causando assim uma necessidade da mente acompanhar as alterações físicas. Logo, os adolescentes sentem a necessidade em testar novos estilos e imagens para si. 

Já o núcleo acumbente sofre uma perda na dopamina circulante, substância responsável pelo sentimento de motivação e prazer. Então, o indivíduo sente-se menos empolgado e começa a buscar meios para suprir o vazio, ficando mais suscetível à impulsividade. 

Por fim, o córtex pré-frontal está relacionado ao desenvolvimento da capacidade de tomar decisões, mas também compete a sensação das fortes emoções por conta da amígdala.  Esta região só completa seu desenvolvimento aos 25 anos de idade do ser humano. 

Então, até o fim deste processo, o cérebro provoca nos adolescentes uma necessidade em buscar meios e orientações para suas motivações e tomadas de decisões. Assim, a mente adolescente torna-se um território fértil onde as situações abordadas nos filmes são levadas para a vida real como uma forma de exemplo a ser seguido.

Opinião da profissional

A psicóloga Dariana Ferreira Rodrigues trabalha com a terapia cognitivo comportamental e seu foco profissional é em atender mulheres e trabalhar a autoestima delas. Em entrevista a Jornalismo Júnior, ela contou mais sobre o cérebro adolescente as influências dos filmes sobre este público. 

A psicóloga Dariana Ferreira Rodrigues trabalha atendendo mulheres [Imagem: Acervo Pessoal/Dariana Ferreira Rodrigues]

A profissional conta como a adolescência é uma fase de desprendimento da família, pois antes disso, na infância, os indivíduos vivem mais próximos aos pais. Porém, na fase adolescente, existe uma leve rebeldia que provoca uma busca por referências fora do lar, aí entram as informações que estão na mídia como os filmes, as músicas e as celebridades em geral. 

Além disso, ela explica que existe o fator da intensidade da adolescência, que atrapalha a habilidade de medir consequências: “É uma fase da vida em que a gente fica mais sugestionável ao que está em alta.”

Sobre a dinâmica de rivalidade feminina nos anos 2000, Rodrigues afirma que ela acontecia por conta de três pilares que se faziam presentes não apenas nos filmes mas em todo o universo feminino: beleza, popularidade e atenção masculina. A busca por esses pontos provocam um clima competitivo.

“Os filmes, eles retratam muito essa dinâmica. Alguns de maneira mais direta, outros de maneira indireta, mas o que fica nítido é que as mulheres raramente podem ocupar o mesmo espaço juntas em segurança, sem ameaças”, afirma a psicóloga. “Então, tem que ter uma que é malvada, uma que faz mal para outra, a que é cruel, que é injusta, que é desonesta… Então, parece que não tem espaço para mulheres, tem espaço para uma mulher e você vai competir com as outras por esse espaço.” 

A psicóloga também contou porque muitas meninas e mulheres possuem um desejo tão forte em se parecer com as vilãs das histórias e não com as mocinhas. Ela explica que as antagonistas possuem algo que muitas mulheres desejam ter: autoconfiança. “As vilãs, elas trazem um poder, apesar de ter toda a questão da rivalidade, da competição e um pouco de crueldade. Mas elas trazem um poder feminino que chama muito a atenção. A gente não quer se sentir boazinha e boba, a gente quer se sentir autoconfiante, com uma presença forte, marcante.”

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