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Mais de 70% dos pacientes com doença renal crônica têm sobrepeso, aponta estudo

Pesquisa da UFJF mostra que sobrepeso, fibrose renal e baixa renda são fatores associados à progressão da doença
Por Carolina Passos (anacarolinapassos@usp.br)

Um estudo sobre o perfil epidemiológico de pacientes com doença renal crônica  (DRC), realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), foi publicado na última sexta-feira (15). A pesquisa observou 417 pacientes da região da Zona da Mata Mineira (Juiz de Fora, MG) de 1998 até 2023, e concluiu que a maioria das pessoas que desenvolvem DRC possuem menor taxa de filtração glomerular estimada (TFGe) inicial, um IMC alto – índice de massa corpórea, relacionado a condições de sobrepeso e obesidade – ou fibrose intersticial e atrofia tubular (FIAT) nos rins.  

O que são doenças glomerulares?

De acordo com o autor da pesquisa, Fernando Sales, as doenças glomerulares (DGs) afetam os néfrons, estruturas presentes nos glomérulos renais que são fundamentais para a filtração do sangue. As DGs podem se classificar em dois tipos: as primárias: doenças  restritas ao rim que não possuem relação com doenças sistêmicas; e as secundárias, condições derivadas de outra doença ou quadro clínico. Segundo o pesquisador, alguns exemplos são “nefrite lúpica, amiloidose, vasculites associadas ao ANCA e processos infecciosos.”

Essas patologias podem ocasionar a doença renal crônica – quando os rins apresentam alterações estruturais ou funcionais que duram 3 meses ou mais e afetam a saúde. Ela se caracteriza pela “perda progressiva e irreversível da função dos rins (devido à queda da taxa de filtração glomerular) ou por sinais de lesão renal”, explica o pesquisador.

Fernando Sales alerta que os principais sintomas e sinais de doenças glomerulares são edemas em membros inferiores e na região ao redor dos olhos, urina espumosa ou com presença de sangue – tanto visível a olho nu quanto através de exames laboratoriais –, pressão alta de difícil controle e diminuição de filtração glomerular sem explicação. 

Ele enfatiza que a biópsia renal, procedimento em que se retira uma pequena amostra do rim para análise microscópica, é essencial para chegar mais rápido ao diagnóstico e garantir um tratamento adequado. No entanto, a realização desse tipo de exame se restringe, na maioria das vezes, aos centros especializados, o que limita o acesso em muitas regiões.

Segundo a coordenadora-geral de Prevenção às Condições Crônicas na Atenção Primária à Saúde, Aline Xavier, cerca de 10% da população brasileira possui DRC
[Imagem: Reprodução/Unsplash]

Novo perfil epidemiológico

A pesquisa recente atualiza uma anterior, publicada em 2008, que analisou os dados de pacientes da região de 1996 a 2006. Sales explica que surgiu a necessidade de uma nova avaliação, pois os perfis epidemiológicos se modificaram com o decorrer do tempo. O objetivo do novo estudo foi “realizar uma nova análise dos padrões de glomerulopatias, identificar as apresentações clínicas e histopatológicas predominantes, bem como avaliar os fatores associados à progressão e aos desfechos da doença renal.”

Dentre os novos resultados, está uma alteração da doença glomerular predominante. Antes, a glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF) estava presente na maioria dos casos. No entanto, agora a nefrite lúpica assume a primeira posição, enquanto a GESF cai para terceiro lugar. De acordo com o pesquisador, essa mudança indica um avanço na compreensão local sobre a GESF e melhorias no processo de diferenciação dos diagnósticos.

Foi observado, também, que fatores como uma menor TFGe inicial, fibrose e atrofia tubular no rim e sobrepeso ou obesidade contribuem para a progressão da DRC. Além disso, 23,3% dos pacientes com doenças glomerulares possuem histórico familiar de doença renal, o que, segundo Sales, pode sugerir que existe uma influência genética.

Obesos, mulheres e jovens, são mais acometidos

Indivíduos com IMC acima de 25 possuem maior tendência a desenvolver doença renal crônica e têm os piores desfechos, conforme o estudo. Sales explica que isso acontece porque o excesso de peso pode contribuir para hiperfiltração glomerular (quando os rins filtram o sangue muito rápido e em grande quantidade, podendo sobrecarregar o órgão) e inflamação crônica. O pesquisador aponta que, quando uma pessoa está obesa, o tecido adiposo (local em que são armazenadas as gorduras no corpo) começa a produzir e liberar citocinas inflamatórias, agravando a lesão renal.

“O manejo adequado da obesidade constitui um componente essencial na estratégia terapêutica desses pacientes, com potencial impacto na melhoria dos desfechos renais e cardiovasculares”, enfatiza.

Dos 417 pacientes observados, 78% possuíam IMC acima de 25, qualificando-se como pessoas com sobrepeso ou obesidade 
[Imagem: Reprodução/Unsplash]

Mulheres e jovens foram os perfis mais frequentes com doença renal crônica, observação que coincide com outras pesquisas realizadas na América Latina. Sales explica que isso pode ser justificado pelo maior número de ocorrência de nefrite lúpica em mulheres em idade fértil – a mesma patologia que pode ocasionar DGs secundárias e que foi predominante na região da Zona da Mata Mineira.

Influências externas e sociais

O estudo apontou que 66,7% dos pacientes possuíam renda familiar de até dois salários mínimos, e mais da metade tinha escolaridade limitada ao ensino médio ou estava realizando o superior. Sales destaca que esses dados evidenciam o impacto direto de fatores sociais na evolução da doença. Segundo ele, a baixa renda e o menor nível educacional estão associados a dificuldades para ir regularmente a consultas médicas, o que reduz o acesso ao diagnóstico precoce. Além disso, a condição econômica pode ser um empecilho para manter o uso contínuo das medicações. 

O pesquisador enfatiza, também, que a doença renal crônica pode progredir mais rapidamente quando esses fatores são somados às comorbidades e riscos cardiovasculares, em alta na população observada.

Perspectivas para o futuro

Fernando Sales comenta que o grupo continuará acompanhando pacientes com doenças glomerulares do Hospital Universitário da UFJF. Os próximos passos serão observar questões genéticas e proteômicas (estudo em larga escala de proteomas, ou seja, um conjunto de proteínas produzidas em um organismo) de pessoas com DGs primárias ou que possuíram uma evolução atípica, principalmente em indivíduos que têm histórico familiar de doenças renais. Ele também sugere realizar estudos em conjunto com outros centros, para desenvolver uma comparação do perfil epidemiológico em diferentes regiões do Brasil e avaliar possíveis desigualdades regionais. Ademais, é crucial investigar novas formas de tratamento para as DGs.

Sales afirma que a pesquisa foi fundamental para otimizar o diagnóstico precoce e correto das doenças glomerulares e oferecer um tratamento mais eficaz para os pacientes. “É necessária a promoção de políticas públicas com foco na prevenção e diagnóstico precoce de DRC, não apenas entre diabéticos e hipertensos [principais comorbidades associadas a doenças renais em geral], mas também entre casos suspeitos de doenças glomerulares”, conclui o pesquisador.

Imagem da capa: Reprodução/Unsplash

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