Entre as décadas de 1990 e 2000 uma geração inteira cresceu sonhando em estudar nos colegiais norte-americanos e viver as histórias do primeiro amor retratadas nos filmes adolescentes da época. No entanto, não se pode dizer o mesmo sobre os adolescentes brasileiros de hoje, que agora podem identificar-se com a própria cultura nos romances adolescentes nacionais. De 2011 para cá, o cinema nacional passou a investir pesado no nicho infantojuvenil e vem lançando cada vez mais filmes voltados para esse público. E os altos investimentos têm dado retorno mais que satisfatório, ao alcançar a casa dos milhões de reais em arrecadações.
O grande público brasileiro, de todas as faixas etárias, acostumou-se a ir ao cinema para assistir às tradicionais comédias estreladas por Leandro Hassum e Ingrid Guimarães. Porém, de um tempo para cá, a popularidade dessas comédias têm caído, fazendo com que seus consumidores fossem para a internet buscar conteúdo. E foi na tentativa de atrair o público de volta às salas de cinema que o audiovisual passou a olhar também para esse lado.
O crescimento dos romances adolescentes explica-se então pela união de duas paixões dos jovens brasileiros: a literatura e a internet. Em entrevista para a Folha de S. Paulo, o diretor de desenvolvimento da produtora Panorâmica, Rodrigo Guimarães, explica que: “Filme juvenil não tem espectador, tem fã. Para chamar público, não precisa mais botar um outdoor na frente de uma escola, é só o ator postar nas redes sociais”. Gabriel Kessler, sócio da produtora Investimage, acredita que até as plataformas de streaming ajudaram a impulsionar os filmes adolescentes: “O cinema continua sendo a vitrine. Se um filme for bem lá, as plataformas estarão dispostas a pagar um valor vinculado ao número de ingressos vendidos”.
O filme Desenrola (2011), que marcou o início dessas novas produções brasileiras, vendeu cerca de 211 mil ingressos durante as duas semanas em que esteve em cartaz. A trama conta a história de Priscila, que depois de ser desiludida por um garoto mais velho, resolve fazer uma pesquisa com as meninas de sua escola sobre suas experiências durante a primeira vez.
Três anos depois, Confissões de Adolescente (2014) ficou quase um mês em exibição nas salas de cinema, ultrapassando a marca de 700 mil ingressos vendidos. Na história, as irmãs Tina, Alice, Bianca e Karina tentam ajudar o pai com as despesas da casa quando o apartamento onde moram, na zona nobre do Rio de Janeiro, sofre aumento de aluguel. Ao mesmo tempo, as quatro irmãs ainda têm de lidar com questões da vida adolescente.
Ambos os filmes são voltados para o público entre 16 e 18 anos, por tratarem de questões como sexualidade e gravidez na adolescência. Além disso, os longas são derivados de séries feitas para televisão: Confissões de Adolescente foi lançada pela TV Cultura em 1994, tendo duas temporadas de enorme sucesso no Brasil; enquanto Desenrola passou de websérie para série de TV, também lançada pela TV Cultura, antes de chegar às telonas.
As produções do últimos anos seguem essa mesma linha de basearem-se em obras prévias, o que acaba sendo uma característica comum aos títulos juvenis e contribui para fidelizar o público ao filme antes mesmo do lançamento oficial.
Cinderela Pop (2019), Fala Sério, Mãe (2018), Tudo por um Popstar (2018), Meus 15 anos (2018) e É Fada (2016) são baseados nos bestsellers das escritoras Thalita Rebouças e Paula Pimenta, que, após adaptação para os cinemas, venderam milhões de ingressos Brasil afora.
As redes sociais também fazem a diferença: não só fazem parte dos roteiros ao ligar as tramas e os personagens, como também é de lá que vem alguns dos integrantes dos elencos, de maneira que se tornou comum ver digital influencers fazendo participações ou ainda estrelando seus próprios filmes. Felipe Neto, por exemplo, atuou como o vilão de Tudo por um Popstar, e Kéfera já estrelou dois filmes, É Fada e Eu sou mais Eu (2018), longa baseado em um livro da própria youtuber.
Uma vez que o público brasileiro acostumou-se a ver as histórias adolescentes na televisão — como no seriado Malhação que permanece no ar mesmo depois de vinte anos de sua estréia — nada mais justo do que assistir aos longas sendo estrelados por atores que também surgiram na TV. Larissa Manoela, Maisa, Klara Castanho e Mel Maia são exemplos de atrizes que iniciaram suas carreiras ainda crianças, desenvolveram-se diante do público e agora protagonizam nos cinemas histórias de grande sucesso.
As duas primeiras, inclusive, são campeãs nos papéis de destaque, tendo, cada uma, protagonizado duas produções até agora — Maisa retornou às telonas em outubro de 2019, com Ela Disse, Ele Disse (2019). A Netflix, visando ampliar suas produções brasileiras, firmou parceria com Larissa e Maisa para que as jovens atrizes estejam também em filmes da gigante do streaming.
Embora os filmes não sejam grandes histórias sobre um dos mais complexos períodos da vida, ainda sim tem cumprido bem seu papel junto ao público: são leves, divertidos e representativos. Afinal, melhor que sonhar em estudar nas escolas estadunidenses, com seus armários e cheerleaders, é realmente conseguir enxergar-se nos personagens ali representados, reconhecer os cenários e ter familiaridade com aquelas histórias.
Mais do que isso, investir hoje em produções desse gênero abre possibilidade para que temas mais profundos sejam tratados diretamente com o público infantojuvenil e ainda dá fôlego ao audiovisual brasileiro. Produções essas que podem se popularizar e, principalmente, continuar existindo.