Jornalismo Júnior

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A história do DVD: do player às paredes

Mesmo com a chegada do streaming, o DVD ainda é utilizado de diversas formas
Por Isabela Nahas (isabelanahas@usp.br)

Quem viveu os anos 2000 talvez se lembre bem de um disco cinza, com um furo no meio e que reflete várias cores quando colocado contra a luz. O Disco Digital de Vídeo, popularmente conhecido como DVD, era usado para reproduzir vídeos dos mais diversos tipos. Mas, nas últimas décadas, com o avanço da Internet e do armazenamento de arquivos na nuvem, onde foi parar o DVD?

Além de vídeos, o DVD também reproduz músicas, assim como os CDs [Imagem: Reprodução/PickPik]

VHS: o avô do DVD

Antes de introduzir o DVD, é preciso apresentar o que veio antes. O Video Home System (VHS) foi inventado em 1976 pela empresa JVC. O aparelho ganhou popularidade pois permite gravar programas de televisão e filmes de até duas horas, o que não era possível para pessoas que não tinham acesso a aparelhos mais caros, como a película cinematográfica. O slogan da Betamax, primeira máquina a permitir o armazenamento de programas de TV, resume a inovação que a tecnologia trouxe na época: “assista o que quiser, quando quiser”.

A fita do VHS grava informações em trilhas e, por isso, é preciso rodar o círculo interno para que o vídeo seja transmitido [Imagem: Isabela Nahas/Acervo Pessoal]

Em 1996, o DVD foi lançado no Japão. Com imagem de qualidade duas vezes maior que a do VHS, o Disco Digital alcançou popularidade e, já em 1997, chegou ao Brasil. O primeiro DVD do país foi o da empresa FlashStar, com o filme Era uma vez na América  (Once Upon a Time in America, 1984).

DVD para quê?: os filmes

Nos anos 2000, o principal uso do DVD era a reprodução de filmes. No seu auge, as televisões eram conectadas a um reprodutor de vídeo. Colocado o disco dentro dele, não era mais preciso esperar a Sessão da Tarde para assistir a um filme. Na verdade, era possível, então, até escolher o que passaria na televisão, com uma qualidade melhor que a do VHS. 

Uma preocupação comum na época do auge do Disco Digital, era que qualquer sujeira ou risco poderia atrapalhar a leitura do vídeo, feita por reflexão nos chamados DVD Players. A depender da quantidade e tamanho dos danos, o filme travava tantas vezes que era preciso descartar o disco.

As locadoras

O aluguel de filmes era muito comum. Os DVD eram alugados nas locadoras de vídeo, que começaram com o VHS e, depois, adotaram as novas tecnologias de armazenamento. Antes, para devolver a fita à loja, era preciso rebobiná-la, ou seja, enrolar no sentido contrário para que o vídeo voltasse ao início. Já com a tecnologia do Disco Digital, bastava guardá-lo de volta na caixinha. Nas locadoras, as prateleiras ficavam lotadas de títulos, como em uma livraria, mas com filmes. Os preços da compra ou aluguel variavam conforme a popularidade das obras. Por isso, na época em que o streaming não existia, era comum frequentar casas de amigos e familiares para assistir a lançamentos.

Hoje em dia, a quantidade de locadoras de vídeo diminuiu consideravelmente. Segundo a União Brasileira de Vídeo (UBV), estima-se que, entre 2003 e 2005, havia quase 14 mil delas no Brasil. Com o declínio do DVD no começo da década de 2010, os lojistas e especialistas ficaram preocupados com o possível sumiço das locadoras. E, de fato, a maioria delas fechou: no início dos anos 2000, a cidade de São Paulo contava com 2,6 mil locadoras. Em 2024, então, restam apenas 4 unidades

Rodrigo Drysdale, coach e mentor executivo de liderança internacional, foi entrevistado pela Folha de S. Paulo em 2010, quando era diretor de marketing da Warner Bros. Segundo ele, os donos das locadoras “precisam acreditar que vão sobreviver. Aluguel, venda e internet vão coexistir.” E ele estava certo. Essas lojas não desapareceram. Um exemplo é a Video Connection, que fica no centro de São Paulo, dentro do Edifício Copan. O lugar é uma pequena galeria repleta de filmes clássicos em DVD, como De volta para o futuro (Back to The Future, 1985), Clube da Luta (1999), entre outros.

Ao entrar na Video Connection, é possível perceber a grande quantidade de obras da loja [Imagem: Acervo pessoal/Isabela Nahas]

O dono da locadora do Centro é Paulo Sérgio, de 67 anos. Sua loja existe desde 1985, quando havia apenas o VHS. Com a chegada do DVD, e, depois, do Blu-ray, o lugar mudou de aparência, com prateleiras preenchidas por caixas mais finas. Apesar disso, Paulo ainda vende filmes em VHS, que se encontram no andar superior. Ele relatou como foi essa transformação: “a imagem do VHS era analógica, então o DVD provocou uma revolução porque deixou bastante prazeroso assistir o filme digital. Depois, a televisão se adequou e passou, também, para o digital.”

A chegada do Blu-ray, em 2008, visou a substituição do DVD. Com capacidade de armazenamento maior que a do Disco Digital, as imagens passaram a ser full HD, ou seja, de alta definição. Mesmo assim, por conta do avanço da internet, o Blu-ray não atingiu tanta popularidade quanto o esperado. 

Ao subir as escadas da Video Connection, é possível encontrar algumas prateleiras com caixas grossas de fita VHS [Imagem: Acervo pessoal/Isabela Nahas]

O usuário do DVD: do que vive e o que faz?

Em entrevista ao Sala33, Paulo conta como as pessoas usavam o DVD nos anos 2000. Ele diz que os discos digitais eram uma alternativa ao cinema, pois possibilitavam que as famílias vissem os filmes em casa. Elas, então, alugavam ou compravam o Disco Digital nas locadoras, que ficavam espalhadas pelas cidades.

Mas os frequentadores dessas lojas mudaram. Hoje, algumas pessoas as visitam para procurar filmes que não encontram nas plataformas de streaming. Outras sentem falta da prática de entrar em uma locadora, olhar entre as prateleiras, escolher um filme, levar para casa e colocar no player. Ele acrescenta: “pensam que são só pessoas de idade que vêm [na loja]. Mas tem bastante jovem. Eles estão procurando filmes antigos, com diretores consagrados.”. A nostalgia e a busca por antigos clássicos são responsáveis pela manutenção do comércio de vídeos do Centro, um dos únicos que resta na região da Grande São Paulo.

A sensação de pegar um filme nas mãos é algo que apenas mídias físicas de vídeo, como o DVD, proporcionam [Imagem: Isabela Nahas/Acervo pessoal]

O dono da Video Connection relata que existem, inclusive, compradores que vêm de outras cidades e alugam vários DVDs. Também há aqueles que querem passar fitas VHS para formatos mais acessíveis hoje em dia, como o DVD ou o pen-drive.  “As pessoas têm muitas fitas das quais querem se livrar porque não têm onde guardar. Aniversário, casamento, formatura.“ Até porque não é somente para ver filmes que serve um armazenador de vídeo.

DVD para quê?: os vídeos

O DVD não era usado apenas para ver filmes, mas também para armazenar outros tipos de arquivos, como gravações de câmeras e jogos. Nos anos 2000, era comum guardar nele recordações de casamentos, apresentações, aniversários e outros momentos especiais. 

O costume de guardar memórias em formato de vídeo veio do VHS. Assim como na fita, para guardar vídeos no DVD era preciso comprar um vazio, ou seja, sem conteúdo armazenado. A diferença é que, depois, era necessário um software que passasse o arquivo selecionado para o Disco, como um computador. Por conta dessa nova tecnologia digital, além de mais barato, ficou mais fácil gravar e reproduzir filmes com qualidade no DVD, ao comparar com o VHS. Mas quais as consequências disso?

Piratas do DVD

Falar sobre DVD e não falar sobre pirataria é deixar de lado uma parte importante da história. Segundo pesquisas da Fecomércio-RJ, em 2005, cerca de 79 milhões de brasileiros consumiam pirataria. O auge foi em 2011, quando mais da metade do país comprou esses produtos. Nas duas datas, os itens mais presentes nesse mercado foram os DVDs e CDs

Com a popularização do Disco Digital, a falsificação de filmes cresceu de forma abrupta. O pioneiro foi o norueguês Jon Johansen, conhecido como DVD Jon. Em 1999, com 15 anos, ele quebrou o código de segurança anti cópia dessa mídia. Jon, então, ficou amplamente conhecido como um grande hacker. Em 2003, o jovem foi julgado inocente por ter apenas criado um programa de cópias de vídeo, o DeCSS, o que não é considerado pirataria em si.

Porém, o episódio marcou a indústria de filmes. Nos anos 2000, o comércio pirata de DVDs se tornou internacional e chegou ao Brasil em grandes quantidades. As empresas fabricantes dominavam o transporte, criavam comércios de fachada, passavam pelas alfândegas e entravam no país. Joseph Silva (34), entrevistado pela Jornalismo Júnior, vivenciou a chegada da pirataria de filmes e lembra o quanto ela cresceu com a popularização do Disco Digital. Joseph ainda aponta que isso possibilitou maior acesso a obras de cinema para ele e a família.

Por conta desse fenômeno, foram criados programas para fiscalizar e desincentivar a falsificação no Brasil. Em 2004, foi criado o Conselho Nacional Combate à Pirataria, vinculado ao Ministério da Justiça. Ainda assim, os DVDs piratas se tornaram comuns e camelôs com filmes baratos marcaram presença no cotidiano da população. 

A pirataria foi difundida de tal forma que, em 2012, um vendedor de DVD falsificado no centro da cidade da Alvorada foi preso e, depois, absolvido pelo princípio da adequação social. Isso significa que a conduta julgada – no caso, vender mídia pirata – era tão aceita pela sociedade que não podia ser comparada com um crime. Após reavaliações de casos, o Superior Tribunal de Justiça parou de admitir a aplicação do princípio de adequação social para absolver vendedores ambulantes de DVDs e CDs piratas.

Esses DVDs da Video Connection são originais. Para entender como identificar os falsos, continue lendo [Imagem: Isabela Nahas/Acervo pessoal]

Existem algumas características que podem diferenciar o DVD original do pirateado. O modo como a luz reflete é diferente: no falsificado, há uma forte reflexão de luz azul ou arroxeada, que indica uma mídia gravável, enquanto nas mídias de fábrica prevalece o prateado. Mas o principal jeito de descobrir uma falsificação é por meio da verificação da existência do código de IFPI (Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI), presente apenas nos discos oficiais, na parte do centro.

Hoje em dia: o DVD como enfeite

Apesar de o crescimento do streaming ter reduzido a utilização do DVD, este ainda é usado. E não apenas para ver filmes, como Paulo Sérgio menciona, mas também como enfeite. É o mesmo que acontece com a decoração vintage, que usa itens antigos, como discos de vinil, TVs e rádios dos anos 60, mas sem sua utilidade original. Quando marca presença nas casas, o Disco Digital é pendurado por fios, colado em paredes e até pintado. É parte do que se chama na internet de decoração indie.

A reflexão de luzes e a nostalgia atraem aqueles que querem decorar as suas casas [Imagem: Reprodução/Instagram/@why_not_do_it_yourself]

Para explorar melhor o tema, a Jornalismo Júnior fez um questionário que obteve 159 respostas. Pessoas de 10 a 61 anos responderam e 33% delas ainda usam DVDs. Dessas, quase 36% como item decorativo. A maioria das que usa como enfeite têm entre 18 e 20 anos, mas uma de 14 e outra de 54 também respondem que usam. O Disco Digital, afinal, ganhou uma nova utilidade, mas não perdeu a original. Para ver filmes, decoração, em locadoras, estantes e paredes, o DVD continua presente na vida das pessoas nas mais variadas idades.

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