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A pseudociência por trás de ‘A física da alma’

“O difícil problema da ideia de reencarnação foi resolvido. Alguém interessado?”

Por Ester de Brito (ester.brito@usp.br)

“A explicação científica para a reencarnação, a imortalidade e a experiências de quase morte.” Essa é a afirmação instigante estampada na capa de A física da alma, livro escrito pelo indiano Amit Goswami e publicado no Brasil pela Editora Aleph. Apesar do ceticismo quanto à capacidade de provar cientificamente um dilema que é discutido pela humanidade há milhares de anos, a ousadia do tema desperta um grande interesse no processo de pesquisa e comprovação do autor. Infelizmente, o que se encontra no livro não é tão promissor.

O livro mostra as teorias de Amit a respeito dos conceitos de reencarnação, usando como base a física quântica, partindo da ideia de “não-lugar”, e o livro tibetano dos mortos, uma compilação do século XVII de fragmentos de textos tibetanos religiosos originários. Já nos primeiros capítulos, o autor apresenta em sua explicação uma sugestão ousada que talvez já afaste os que buscavam uma teoria científica: considerar dados de pesquisas paranormais como telepatia, percepção extra-sensoriais, experiências de quase morte e encontros com OVNI’s. O objetivo seria adquirir conhecimento sobre a alma e a consciência. 

Amit relaciona o que entendemos como consciência com a alma, colocando-a como um fenômeno quântico. Dessa forma, sobrevive à morte do corpo físico, transmigrando e reencarnando em outro corpo físico, formando um continuum, ou seja, passando de um para o outro sem interrupções. O autor traz conceitos de diferentes religiões e povos para a sua argumentação, como a transmigração, uma crença filosófica de origem indiana: nela, a alma pode ir de um corpo humano para um animal e vice-versa, diferente da reencarnação, em que a alma passa de um corpo humano para outro corpo humano. 

A física quântica entra na argumentação quando o autor mostra o corpo físico como uma estrutura localizável, enquanto a alma representa possibilidades quânticas e possui correlação não-local, ou seja não pode ser localizada em um espaço físico, podendo estar em qualquer lugar no espaço-tempo. Dessa forma, ele argumenta que o continuum da alma que permite a reencarnação ocorre através de fenômenos quânticos não-locais, afinal, se é possível estar em qualquer lugar no espaço-tempo, isso inclui passado e futuro. 

O livro tem uma linguagem técnica que envolve muitos termos de física quântica, o que talvez afete a compreensão de quem for leigo no assunto. É útil estar com o dicionário e os livros de física abertos porque em algum momento eles virão a calhar, principalmente na parte em que Amit fala sobre a memória dos corpos — a forma como esse trecho é escrito não contribui para a compreensão. Mas a teoria basicamente diz que a memória do corpo vital e mental é de natureza inteiramente quântica, ou seja, não localizada no espaço-tempo. A memória do corpo seria composta por padrões de hábito causados pelo condicionamento da estrutura de possibilidades quânticas graças a experiências repetidas. Essa seria a descrição científica para o que sobreviveria dos seres após a morte, onde as memórias passadas seriam transportadas pela matemática quântica modificada dos corpos vital e mental. 

Isso poderia ser chamado de mônada quântica, ou alma, em outras palavras: uma cápsula de vidas passadas que atravessa o espaço-tempo, possibilitando que hábitos e propensões de outras vidas sejam transferidos para outras. Entretanto, boa parte do que éramos em vidas passadas morreria com o corpo físico. Mesmo assim, o autor traz alguns exemplos de pessoas capazes de se lembrar de coisas acontecidas em vidas passadas para ilustrar o que seria essa memória reencarnacional. A mesma definição de mônada quântica também pode ser encontrada em crenças religiosas com o nome “karma”.

O fato de na capa do livro estar escrito “explicação científica” e não “comprovação” é muito significativo, porque o autor não tenta seguir o método científico para comprovar as teorias apresentadas, e sim teoriza enquanto mostra “evidências” extremamente questionáveis. O livro muito provavelmente não é um trabalho que vá ser levado a sério na comunidade científica, mas a abordagem de Amit Goswami pode conquistar aqueles que tenham interesse em espiritualidade ou misticismo. Além disso, é importante ressaltar que leitura é densa e com muitos termos técnicos, então fique preparado para reler muitas páginas e pesquisar informações constantemente.

*Imagem de capa: Divulgação/Editora Aleph

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