Ada Hegerberg, atual vencedora da bola de ouro, escolheu não disputar a Copa do Mundo na França. O motivo? A inequidade entre os gêneros dentro do futebol. Desde 2017, quando deixou de atuar pela seleção norueguesa – devido a defesa desta causa -, a jogadora vem se tornando um dos grandes símbolos da luta por igualdade no futebol.
Um fenômeno dentro e fora das quatro linhas
Nascida em Molde, noroeste da Noruega, no dia 10 de julho de 1995, Ada Hegerberg é considerada a melhor jogadora de futebol feminino do mundo. A tradição esportiva está em seu sangue: seus pais, Stein Erik Hegerberg e Gerd Stolsmo, foram jogadores e treinadores de times noruegueses. Seu irmão mais velho, Silas, jogou futebol em sua juventude e sua irmã, Andrine, joga no Paris Saint Germain.
Ada iniciou sua carreira aos 15 anos no Kolbotn IL. Permaneceu entre 2010 e 2011 no clube e, atuando por este, foi eleita Melhor Jogadora da Liga Toppserien. Em 2012, se transferiu para o Staebek, onde marcou incríveis 25 gols em 18 jogos. Os números surpreendentes suscitaram o interesse de times do exterior.
O Turbina Potsdam da Alemanha, em 2013, contratou a norueguesa – o que lhe rendeu dois vice-campeonatos (um da Bundesliga e um da DFB Pokal). Do território alemão, Ada Hegerberg transferiu-se para a França. Chegou finalmente ao Olympique Lyonnais, time no qual atua até hoje.
Pelo Lyon, Ada fez e continua fazendo história. Já conquistou cinco ligas da França, quatro copas francesas e quatro Liga dos Campeões. Por sinal, em seu último grande título, deu, além de um show, um tapa na cara das grandes entidades futebolísticas do mundo: após anunciar que não participaria da Copa, marcou um hat trick na final da Champions e provou o tamanho da perda que sua ausência ocasionaria ao mundial.
Os feitos da atleta não ficam só no campo coletivo. Individualmente, Ada já conquistou dois BBC Women’s of the year, um título de melhor jogadora da Europa e, mais recentemente, o Ballon D’Or – a primeira bola de ouro entregue à uma mulher. Porém, nem mesmo quando premiada pelo seu desempenho dentro das quatro linhas, Ada deixou de ser um fenômeno fora delas.
Durante a premiação da bola de ouro, o anfitrião da cerimônia, o DJ francês Martin Solveig convidou a norueguesa para dançar o twerk, dança baseada em agachamentos e movimento dos quadris. Ada foi pragmática: “Não”. Virou-se e deixou o palco. A jogadora retornou ao seu assento com dois troféus na mão, um concreto – de melhor do mundo – , e um abstrato – de exemplo de ativismo.
A desigualdade
Quando a norueguesa anunciou que deixaria de atuar pela sua seleção até que medidas que visassem a equidade fossem tomadas, muito questionou-se sobre o tamanho do abismo existente entre os gêneros no futebol. E o abismo é, de fato, muito grande. Pra ser mais exato, os homens chegam a ganhar 325 vezes mais.
Messi, o jogador mais bem pago do mundo ganha, por temporada, 325 vezes mais do que Ada Hegerberg no mesmo período. A desigualdade ainda sai dos gramados e sobe para as arquibancadas. Para ver um jogo de Ada pelo Lyon, o torcedor deve desembolsar a partir de cinco euros, enquanto que, para assistir ao Messi no Camp Nou, o ticket mais barato custa 39 euros. Mesmo assim, se comparados os jogos, os do argentino possuem oito vezes mais espectadores.
A discrepância não para por aí: ela é marcante, inclusive, na Copa do Mundo. No ano passado, os franceses – campeões na Rússia – levaram para casa US$ 38 milhões, enquanto as vencedoras deste mundial levarão apenas US$ 4 milhões. No total, serão gastos cerca de US$ 30 milhões em prêmios para as 24 seleções participantes do torneio disputado na França. Valor muito inferior aos US$ 400 milhões distribuídos para os times masculinos que disputaram a Copa de 2018.
Contudo, a FIFA, maior entidade do futebol, nos últimos anos vem tomando decisões que visam diminuir esse abismo. Por exemplo, lançou, em dezembro de 2018, a cartilha “Estratégia Global para o Futebol Feminino” – um documento de 18 páginas que explica como ela trabalhará em conjunto com clubes, jogadoras, imprensa e fãs para alavancar o futebol feminino. “Encaro o momento em que vivemos como um marco, em questão de visibilidade [do futebol feminino], mas ainda há muito a percorrer, muito a desenvolver”, opina Jamille Bullé, repórter do grupo Globo, sobre a situação atual da modalidade.
Revolução em campo
Hegerberg não é a única a defender a equidade de gênero dentro do futebol. A desigualdade presente nos gramados é combatida por diversas jogadoras. No jogo do Brasil contra a Itália, após se tornar a maior artilheira da história das copas, Marta levantou sua chuteira e convocou os torcedores para conhecer sua causa. A jogadora, seis vezes melhor do mundo, usou uma chuteira preta e sem patrocínio, que no lugar do logo possuía duas faixas degradês em azul e rosa.
As faixas são símbolo da campanha “Go Equal”, projeto desenvolvido por Marta e pela agência publicitária Africa que possui como objetivo combater a desigualdade de gênero dentro do futebol.
Outra jogadora que também se utiliza de sua posição para lutar pelo direito das mulheres é Megan Rapinoe, capitã da seleção estadunidense. Nessa copa, ela – como mulher e homossexual – decidiu não cantar o hino de seu país em forma de protesto. Rapinoe também afirmou que, caso os Estados Unidos ganhem a Copa, ela não irá visitar a Casa Branca – gesto tradicional de estadunidenses campeões no esporte.
Todas essas manifestações contribuem para uma revolução dentro do esporte. Atletas com grande visibilidade, ao questionarem a desigualdade, pressionam por mudanças. Ary, promissora jogadora do São Paulo Futebol Clube, avalia a importância destes atos: “É importante para a nossa geração. A gente vê que mesmo elas, que chegaram ao topo, não deixam de se preocupar com o investimento no esporte. É um exemplo”.
Ada, na melhor fase de sua carreira, sacrificou a oportunidade de atuar em uma Copa do Mundo em prol de uma causa. “Abrir mão de um sonho pode ser muito frustrante, mas é muito mais constrangedor para a federação. Chega a ser vergonhoso não contar com a melhor jogadora do mundo por não oferecer condições dignas para as atletas”, avalia Jamille Bullé sobre a ausência da norueguesa na Copa.
As mulheres que conheço que curtem futebol, não falam sobre o futebol feminino, somente o masculino.
Não usam camisas com o nome das jogadoras nas costas, somente dos homens.
As meninas que jogam no meu time quando fazem um golaço ou uma ‘defezaça’ citam nomes dos jogadores e nunca gritam o nome da Marta por exemplo…
E por aí vai…. infelizmente.