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Copa do Mundo Feminina: em busca de reações

Domingo, dia 9. Sou acordada pelos gritos de empolgação. Laísa e Hugo estão arrumando a cozinha para ver o jogo. É a estreia do Brasil na Copa de 2019. Pela primeira vez em minha vida, desperto animada para assistir uma partida de futebol. O hino começa a tocar. Olho para TV empolgada. Na tela, finalmente, …

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Domingo, dia 9. Sou acordada pelos gritos de empolgação. Laísa e Hugo estão arrumando a cozinha para ver o jogo. É a estreia do Brasil na Copa de 2019.

Pela primeira vez em minha vida, desperto animada para assistir uma partida de futebol. O hino começa a tocar. Olho para TV empolgada. Na tela, finalmente, me reconheço. Laísa chega até a pular de empolgação. Leandro está sorrindo. Hugo aparenta estar ansioso: será que a Jamaica tem chances?

A bola começa a rolar. Todos ficam impressionados com a velocidade das jamaicanas e como são fortes. Hugo comenta que Marta não vai jogar para a seleção e temos um momento de silêncio. Mas, com o passar do tempo, nota-se que falta técnica às caribenhas, eles comentam que se tivessem um treino melhor, elas seriam invencíveis. Em nenhum momento relacionam seus erros ao fato de serem mulheres.

Primeiro gol do Brasil! Pena que Galvão, preocupado em comentar outras coisas, não o narrou e diz, atrasado, que foi gol da Jamaica. Laísa não aguenta: grita com a tela e o xinga de todos os nomes. Quando Daniel, que também acordou com os gritos, comenta que ele devia se aposentar, ela retruca: “Isso não é porque ele é velho, é porque ele é um machista que não valoriza a seleção!”. Leandro concorda e diz que sua narração é bem diferente quando o “menino ney” está em campo.

Ganhamos de 3 a 0 – mesmo com os diversos gols perdidos. Todos gritam de alegria e se sentem vitoriosos. No entanto, ninguém está mais feliz do que eu, que acabei por descobrir que, em minha casa, as mulheres são valorizadas.

Quarta-feira, dia 12. Estou na faculdade e almoço com pressa: Brasil vai jogar contra a Austrália. No laboratório, em meio aos computadores e seus textos abertos, os futuros jornalistas esquecem seus trabalhos finais  e se reúnem em volta da televisão.

Nunca tinha visto tantas mulheres juntas torcendo para um jogo. Amanda está radiante com o seu arco de girassol; Adriana está quase pulando em sua cadeira; Catarina está preocupada com o seu bolão; Gabriela, mesmo rouca, não desiste de gritar.

O jogo começa, todos comentam que a seleção parece melhor do que no último jogo. Porém, a Austrália (mostrando violência no campo) deixa os universitários ansiosos. Os meninos ficam calados observando. As meninas querem comentar sobre cada lance, gritar, comemorar em qualquer oportunidade. Nós sabemos que aquilo na tela é mais que um jogo: é a mulher lutando pelo seu espaço e provando que não há nada que não seja capaz de fazer.

A Marta está em campo e isso deixa todos animados. Quando ela se prepara para bater o pênalti, todos dão as mãos. É hora da corrente da positividade. A melhor jogadora do mundo não decepciona: é gol do Brasil!!!

Cristiane também faz um gol – depois do último jogo, ela tem uma reputação a zelar. A sala fica maravilhada, todas nós pulamos e rimos. Gabriela, quase sem voz, pergunta à Iasmin se tem chances dela estourar a garganta. Aparentemente não.

Chegou o segundo tempo, a Austrália já possui um gol. Enquanto tiro fotos da Amanda séria com um girassol na cabeça, o país pontua novamente. Palavrões não faltam, a alegria dá lugar à raiva. Danilo e José criticam Vadão. Adriana grita palavras motivacionais às jogadoras. Nessa altura do campeonato, já sabemos todos os nomes.

As correntes de positividade não foram suficientes e o Brasil perdeu por três a dois. Mas ninguém xingou nossas jogadoras de incompetentes ou fracas. O tempo do ensino fundamental, em que os meninos riam e debochavam das meninas jogando futebol, parece ter ficado para trás.

Sábado, dia 15. Resolvi sair da minha bolha social. Fui à Vila Madalena em busca de um bar que passasse o jogo do Canadá versus Nova Zelândia. Após subir e descer morros com o Daniel, finalmente, achamos um lugar. Era um hostel repleto de argentinos. Ao perguntar se passava a Copa Feminina, eles olham o relógio o jogo da Copa América começa às 19 horas – e falam que podem colocar para nós.

A partida começa e a televisão está no mudo. Ao som de Mano Brown, tento acompanhar o jogo. Os argentinos só olham para a televisão quando estão voltando do bar,  com certo descaso, desinteresse.

O jogo, finalmente, chamou atenção de um deles. Era escanteio e uma jogadora dá um cabeceio na bola. Ele se vira para os outros empolgado. Nesse momento eu penso que, finalmente, o jogo receberá atenção. Mas seus amigos chegam com carnes e o churrasco parece ser mais importante.

Chega a ser cômico: eu procurando desesperadamente reações para a matéria e Daniel questionando se ganharíamos um pouco da carne (ele já havia desistido do texto). Não aguento a situação e vou embora após o segundo tempo.

Procuramos por mais bares para ver o resto do jogo, mas nenhum passava a Copa do Mundo. Os diversos telões só mostravam os rostos masculinos da Copa América (era o jogo de Bolívia e Peru). Doeu, mas me dei conta que o futebol feminino não é tão valorizado quanto a minha bolha social faz parecer.

Um dia, quem sabe, não saio e me deparo somente com mulheres na TV.

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