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Da palavra à tela: Manoel de Oliveira e seu brilhantismo no cinema lusitano

por Lidia Matos lidiamcapitani@gmail.com A tarde de 2 de abril de 2015 foi um dia de luto para Portugal. Morreu o cineasta mais renomado do país: Manoel de Oliveira. Atrizes e atores se recolheram em silêncio, familiares lastimaram e toda a rede cultural do mundo ficou de luto. Com 106 anos de idade, Manoel era o …

Da palavra à tela: Manoel de Oliveira e seu brilhantismo no cinema lusitano Leia mais »

por Lidia Matos
lidiamcapitani@gmail.com

A tarde de 2 de abril de 2015 foi um dia de luto para Portugal. Morreu o cineasta mais renomado do país: Manoel de Oliveira. Atrizes e atores se recolheram em silêncio, familiares lastimaram e toda a rede cultural do mundo ficou de luto. Com 106 anos de idade, Manoel era o mais velho cineasta ativo – trabalhou até os 105 em plena lucidez.

Em nome de toda uma carreira brilhante, o CINUSP inaugurou no dia 6 de junho uma amostra sobre o cinema português, que além de contemplar diversos longas desse brilhante gênio do cinema, inclui outros diversos diretores reconhecidos do país, como João César Monteiro, Pedro Costa e Vítor Gonçalves. A amostra vai até o dia 5 de julho e conta com diversos títulos desse grande diretor, como Um Filme Falado, Viagem ao Princípio do Mundo, Palavra e Utopia, Inquietude, entre outros.

No dia 17 de junho, o CINUSP exibiu o longa Non ou a Vã Glória de Mandar, de Manoel de Oliveira, e logo após, chamou dois críticos para debaterem. Pedro Maciel Guimarães e Sérgio Alpendre traçaram um panorama tanto da carreira do diretor, dando maior destaque ao filme Non, quanto da produção cinematográfica em Portugal.

Trabalhando até a hora de sua morte, Oliveira teve uma carreira longa e frutífera (cerca de 70 anos em atividade), sendo reconhecido desde de 1942 com Aniki-Bobó, até a sua última obra, um curta chamado O Velho do Restelo. O curioso de Manoel é que ele, além de ter sido o mais velho cineasta ativo, é um dos únicos que presenciou a mudança do cinema mudo para o falado, e do preto-e-branco para o colorido.

Uma das características mais marcante de seu cinema é a aproximação da literatura, no sentido de que ele dá muita atenção ao texto, ao roteiro original, aos diálogos. A palavra é o que rege seus filmes. Em Non isso fica muito claro: o longa é feito de poucos cenários, a importância é dada justamente aos diálogos, tanto que metade do filme retrata apenas as personagens conversando e discutindo. A narração também é imprescindível, e por vezes é feita pelo próprio Manoel, que acaba se tornando um personagem-ambiente. A composição de imagens é feita com planos longos, justamente para ressaltar essa importância que ele dá ao roteiro, à narração, já que é a palavra que sobressai na maioria das cenas.

Em outros filmes isso fica bem claro. Inquietude é baseada em 3 textos, uma peça, um romance e um conto, que depois conseguem compor uma coesão entre si. Em outro longa, A Carta, Manoel utiliza um texto do século XVII quase na integra para construir seu roteiro, tamanho apego ao texto original.

Sua filmografia é composta aproximadamente por 70% de filmes com roteiros adaptados, enquanto apenas 30% são de roteiros originais, mas muitos desses são baseados em documentos oficiais. Dentre esses, muitos têm a temática histórica, como por exemplo, Um Filme Falado, que conta um pouco de Portugal pelos olhos de uma professora de história, O Quinto Império que retrata O rei D. Sebastião, muito aclamado pelo povo português e o próprio Non ou a Vã Glória de Mandar, que faz um paralelo entre a batalha nas colônias de Portugal em 1975 com a história lusitana e suas guerras passadas.

Non se passa na África durante a Revolução dos Cravos, que depôs a ditadura do Estado Novo de Portugal, o chamado Salazarismo, e instaurou um regime democrático de cunho socialista em sua constituição. No longa, os soldados levantam questionamentos acerca da necessidade da guerra e a relaciona com conflitos passados, por isso, é considerado por muitos um filme anti-guerra e que enaltece a derrota de Portugal.

“O ideal era não ter vencedores nem perdedores” diz um dos personagens principais em meio a uma das diversas discussões entre os combatentes. A ideia do diretor não foi menosprezar a história portuguesa, tanto que o seu frequente retrato demonstra a importância que Manoel dá a história de seu país, porém, ele quis apontar o horror e a sua descrença nos conflitos armados. Por isso, Oliveira se atenta a episódios em que Portugal saiu perdedor, como a batalha de Alcácer-Quibir, em que o rei D. Sebastião comanda quase uma ação suicida do exército português contra o marroquino. É dessa batalha que surge a lenda do Sebastianismo que até hoje perpetua, mesmo em pequena escala, que acredita no retorno do rei D. Sebastião.

Chamado de O Mestre, tal apelido não reflete a popularidade de Manoel de Oliveira em Portugal. Mesmo sendo reconhecido como um grande cineasta, seus filmes não chegavam a agradar ao grande público lusitano, que preferiam filmes mais “dinâmicos” aos seus extensos diálogos e planos. Apesar disso, Manoel tinha muita visibilidade em países como França, Espanha e Itália, que patrocinavam seus filmes e os exibiam em larga escala. Tal fato o deu a fama de ser um cineasta que produz para fora, já que era muito mal compreendido em seu país.

Alguém que viveu tanto, trabalhou tanto e produziu tanto quanto ele, merece tal reconhecimento. Manoel de Oliveira nos deixou uma extensa filmografia, rica em história, arte e genialidade. Seu corpo pode ter morrido, mas sua essência perpetuará em seus filmes, por isso, venha conferir a amostra Português Falado, Cinema Encarnado do CINUSP, e veja mais alguns brilhantes longas desse mestre da sétima arte.

 

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