“Este é um filme sério”. É assim que a dupla de diretores, André Sigwalt e Augusto Soares introduz a sessão de O Mestre da Fumaça (2022), longa-metragem de kung fu que inaugura a primeira comédia stoner brasileira. O sub gênero stoner normalmente traz o uso da maconha no centro da narrativa, e os diretores deixam a intenção de retratar maconheiros funcionais explícita na trama: seus personagens lutam, constroem famílias e fogem do estereótipo de bobalhões.
Daniel (Thiago Stechinni) e Gabriel (Daniel Rocha) são irmãos vítimas da maldição das três gerações, que já ceifou a vida do pai e do avô da dupla. A Tríade, uma organização do mal internacional responsável pela maldição, se prepara para uma batalha que levará um deles à morte. A única forma de lutar pela sobrevivência seria aprender o segredo do Estilo da Fumaça, vertente ancestral do kung fu canábico, ensinado pelo Mestre da Fumaça (Tony Lee). No longa, a técnica busca ensinar seus aprendizes a como dichavar a planta da maconha, bolar os baseados, fumá-los e incorporar a brisa na luta, e pede que seus pupilos “sejam a fumaça” para enfrentar os desafios. Criado pelos diretores para o filme, o Estilo da Fumaça pode ser ensinado e utilizado na vida real.
As muitas lutas presentes no filme trazem ação e homenageiam os filmes de artes marciais, sobretudo dos anos 1980, com Bruce Lee e Jackie Chan. O longa faz uma ode aos clássicos sem perder a originalidade e o ar brasileiro, seja com um vilão estadunidense grosseiro, muitas aparições internacionais, diversos idiomas em cena ou um treinamento impetuoso. Boa parte da ambientação e emoção pode ser creditada à excelente trilha sonora original assinada por André Abujamra e Eron Guarnieri. Recheada de referências do rock, reggae e melodias orientais, ela tem um resultado grandioso e emocionante – às vezes até mais do que as cenas simples que a acompanham na tela.
Quanto ao elenco, os irmãos e o mestre estão excelentes nos papéis, o que desloca os demais personagens, que parecem não interagir de forma tão orgânica com as câmeras. Além disso, alguns núcleos são pouco mostrados ao longo do filme, o que por vezes deixa suas reaparições sem ganchos confusa.
A produção totalmente independente trabalhou com um micro budget (menos de 150 mil dólares) e atingiu um resultado de qualidade surpreendente nos figurinos, efeitos visuais e coreografias. O longa participou de diversos festivais e premiações pelo mundo: venceu o Golden Ganja Awards de melhor filme no festival canábico The Amazing Stoner Film Fest; levou o Prêmio do Público de Melhor Filme de Ficção Brasileiro na 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo; ganhou o prêmio do júri de melhor direção e o prêmio do público de melhor filme no 7º Rio Fantastik Festival, festival de cinema fantástico do Rio de Janeiro.
Vale a pena conferir o filme: recheado de ação, boas risadas e surpresas agradáveis, o novo olhar para a cultura canábica apresentado em O Mestre Da Fumaça é muito bem-vindo, com um tópico que ainda é tabu no Brasil. Apesar de não ser um filme abertamente ativista, com viés panfletário e agenda política clara, admitir que a maconha faz parte da vida de muitos e explorar possibilidades em um longa leve e descontraído é um passo para a desmistificação ainda que demorada da droga recreativa. E é com a leveza da fumaça que o filme se propõe a iniciar essa história no Brasil.
O filme já está em cartaz em alguns cinemas brasileiros. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/Lança Filmes