Por Isabella Lopes (isabella.tomaz.lopes@usp.br)
Liam James Payne, ex-integrante do grupo musical One Direction, faleceu no último dia 16 ao cair do terceiro andar do hotel Casa Sur, em Buenos Aires, na Argentina.
O compositor contribuiu para canções de sucesso nos anos 2010, como What Makes You Beautiful, History e Strip That Down. Assim que sua morte foi divulgada, fãs se emocionaram e prestaram homenagens ao ídolo.
Relembre a vida e os sucessos do cantor britânico:
Trajetória pessoal
Liam James Payne nasceu no dia 29 de agosto de 1993, em Wolverhampton, cidade inglesa localizada no condado de West Midlands. O artista chegou ao mundo de forma prematura — três semanas antes do esperado — e logo apresentou problemas de saúde que só foram descobertos pelos médicos três meses após o seu nascimento. Com mau funcionamento em um dos rins, Liam precisou tomar 32 injeções diárias como tratamento, além de passar parte da infância em hospitais.
O cantor relatou as consequências de seu adoecimento em Coragem para sonhar: Nossa vida como One Direction (Editora Prumo, 2012), livro lançado junto com seus colegas de banda em 2011. “Ainda tenho os dois rins, mas um não funciona, então tenho que ter cuidado para não beber muito, nem mesmo água, e tenho que me manter o mais saudável possível.”
Aos seis anos, já demonstrava talento para o canto, mas não pensava em viver da música. Seu sonho de infância era ser corredor olímpico. Desde criança, o jovem acordava todos os dias às cinco horas da manhã e corria cerca de oito quilômetros antes de ir para a escola. Porém, aos 14 anos, sua carreira esportiva chegou ao fim, quando ele não entrou para um time escolar inglês da categoria.
No início da adolescência, aos 12 anos, o artista começou a dedicar um tempo para o canto, conciliando com o atletismo. Após ser cortado do esporte, passou a focar em seu lado musical e fez parte do grupo de artes cênicas Pink Productions. Liam conquistou 11 Certificados Gerais de Educação Secundária (The General Certificate of Secondary Education) — qualificações acadêmicas — na Saint Peter’s Collegiate School e chegou a estudar tecnologia musical na City of Wolverhampton College, antes de participar pela primeira vez do programa de talentos britânico The X Factor (2004 – presente).
Além disso, Liam era alvo de bullying na época: “Eu tinha que aprender a me defender, e aos doze anos, lutava contra o treinador de 38 anos. Eu quebrei meu nariz, tive meu tímpano perfurado e chegava em casa com o rosto machucado e inchado. Mas isso me deu confiança. Eu me saí muito melhor nos anos seguintes”, diz.
“One dream. One band. One Direction.”
Em 2008, Liam fez a audição para o The X Factor. Com uma apresentação da música Fly Me To The Moon, de Frank Sinatra, o jovem ganhou elogios dos jurados e chegou a passar para a segunda fase do programa. Entretanto, foi eliminado por Simon Cowell — produtor que depois passou a gerenciar a One Direction — e recebeu o conselho de se inscrever novamente na atração depois de dois anos, visto que estaria mais desenvolvido e preparado para os palcos.
Liam seguiu o que foi dito por Simon e, em 2010, voltou ao palco do The X Factor com a canção Cry Me a River, na versão de Michael Bublé. Ele foi ovacionado pela plateia e passou para a fase seguinte, na qual cantou Stop Crying Your Heart Out, da banda Oasis. Porém, ele não passou para a categoria “Garotos” do programa e foi realocado junto com Harry Styles, Louis Tomlinson, Niall Horan e Zayn Malik para a banda One Direction. Marcella Arraes Oswald, 22, fã de Liam, conta que o conheceu a partir da boyband: “Eu sempre gostei dele. Os favoritos de todo mundo eram geralmente o Harry ou o Zayn, e o Liam era um dos mais ignorados. Eu sempre fui mais tímida e tinha uma identificação com ele”. O músico estrelou momentos marcantes para os fãs, como sua explicação para uma fobia à colheres e as “guerras de água” com Louis durante os shows.
O grupo chegou à final da atração, na qual terminou em terceiro lugar. Apesar de não terem ganhado o prêmio máximo, eles assinaram um contrato com a Syco Entertainment, gravadora de Simon Cowell — que se envolveu em escândalos, com acusações de exploração por parte dos artistas que mentoreou.
Cinco álbuns foram lançados com a formação original da One Direction (Zayn, Harry, Liam, Niall e Louis): Up All Night (2011), Take Me Home (2012), Midnight Memories (2013) e Four (2014). Após a saída de Zayn Malik, em março de 2015, os membros restantes ainda produziram Made In The A.M. (2015), último álbum de estúdio da banda, com tom de despedida nas canções.
Os integrantes restantes entraram em hiato em 2016 e se dedicaram a suas carreiras solo. “Eu cheguei a chorar quando o Zayn saiu. Quando a banda anunciou a pausa, eu já era mais velha e esperava que isso fosse acontecer a qualquer momento”, conta Marcella. Até o falecimento de Liam, fãs acreditavam em uma possível volta à ativa do grupo, inclusive a entrevistada: “Acreditei que em algum momento eles voltariam, talvez quando estivessem com as carreiras solo feitas e quisessem dar um adeus à banda”.
“Além do suporte emocional, realizei incontáveis sonhos e amizades — inclusive uma das minhas melhores amigas — graças a eles. Sou muito grata ao Liam e aos outros meninos por terem me proporcionado tantos momentos incríveis.”
Marcella Arraes Oswald
A boyband chegou a patamares atingidos por outros grupos do gênero, como os Backstreet Boys e o N’SYNC. No total, eles foram indicados a 580 premiações e conquistaram 412 delas. Além disso, também estiveram em quatro turnês, com passagens pelo Rio de Janeiro e São Paulo em 2014. Marcella foi ao show feito no Rio: “Eu nem ia porque tudo tinha esgotado. Mas minha mãe me deu o ingresso de surpresa um dia antes da apresentação deles. Eu consegui ficar pertinho e foi incrível”.
Apesar das experiências positivas proporcionadas pela banda, os cinco vocalistas desenvolveram distúrbios mentais devido à rotina exaustiva e à pressão às quais foram submetidos desde o fim da adolescência. Em 2019, no programa Straight Talking with Ant Middleton (2021 – presente), Liam contou que lutava contra pensamentos suicidas, além de depressão e ansiedade. Estresse, crises ansiosas e depressivas, distúrbios alimentares e uso de álcool fizeram parte da vida dos cantores, que seguem enfrentando as consequências da fama desde a juventude.
Carreira Solo
O primeiro single lançado por Liam foi Strip That Down em 2017, coproduzida por Ed Sheeran e performada com o rapper Quavo. A canção conquistou o primeiro lugar da lista “US Radio Chart” da Billboard, revista estadunidense com enfoque na indústria musical. No mesmo ano, nasceu o filho do artista, Bear Grey Payne, fruto de sua relação com a cantora Cheryl Cole.
Em 2018, Payne lançou For You, em parceria com a cantora Rita Ora. A canção fez parte da trilha sonora do filme Cinquenta Tons de Liberdade (Fifty Shades Freed, 2018), sequência de Cinquenta Tons de Cinza (Fifty Shades of Grey, 2015).
No mesmo ano do lançamento de For You, a fã Marcella Arraes se deparou com Liam no sofá de sua casa. Na época, havia um quadro no programa Caldeirão do Huck (2000 – 2021), da rede Globo, no qual o apresentador recebia cartas ou indicações de fãs que gostariam de conhecer determinados cantores, brasileiros ou internacionais. Em entrevista à Jornalismo Júnior, ela contou detalhes do encontro: “O Liam tinha anunciado que viria ao Brasil uns dois dias antes de acontecer. A equipe do programa começou a pedir recomendações de pessoas que gostassem dele e morassem próximo à Barra da Tijuca, por causa da locomoção”.
Um amigo de Marcella — na época, dono de um portal sobre o cantor — enviou o nome dela, que foi o segundo a ser selecionado. Ela relata como o amigo e a família preparam a surpresa: “Eu não fazia ideia do que iria acontecer. Meu amigo falou que o Liam faria um show fechado para a imprensa e alguns portais convidados e que tentaria me levar, até pediu o número da minha mãe para pedir uma indicação de hotel”.
No dia da gravação, a fã conta que sua mãe havia dito que ela precisaria sair mais cedo do colégio, por causa de um exame de sua avó: “Eu tive que fazer uma prova de recuperação rápido e minha mãe demorou a me buscar. Ela falou que estava procurando os exames antigos da minha vó’’. Marcella recorda que em sua casa era regra tirar os sapatos ao entrar, mas sua mãe falou que estava com pressa e pediu para ela não realizar a ação. “Quando eu estava indo para a sala, comecei a escutar a melodia de Strip That Down no violão e pensei que o meu irmão e um amigo dele estavam tocando. Mas lembrei que eles não sabiam essa música”, brinca.
Depois do fim da gravação, Marcella lembra que Liam conversou com ela e sua família com ajuda de uma tradutora, gravou vídeos, tirou fotos e passou por uma situação curiosa: “Ele ficou conversando com a minha avó. Teve um momento em que ela ofereceu um café e uma empadinha e o Liam não entendeu nada”.
Somente no ano seguinte veio o lançamento do primeiro álbum solo do músico, intitulado LP1, com 18 músicas de estilos diferentes do pop – característica reprovada pelos críticos – e Alesso, A Boogie Wit Da Hoodie, Cheat Codes, J Balvin, Jonas Blue, Lennon Stella e Zedd como parcerias, além das já lançadas com Rita Ora e Quavo. Charlie Puth, Ed Sheeran e Ryan Tedder participaram nas produções. Apesar de ter obtido três milhões de cópias vendidas, o LP1 não alcançou bons números nas listas musicais: chegou ao 111º lugar na Billboard 200 nos Estados Unidos e em 17º no Reino Unido.
Durante a pandemia de COVID-19, Liam Payne incentivou a quarentena por meio de um projeto de vídeos sobre a sua rotina e lives frequentes. Em 2021, a canção Sunshine – produzida durante o período pandêmico – para o filme Ron Bugado (Ron’s Gone Wrong, 2021), da Disney.
Devido às deficiências renais enfrentadas desde o nascimento, Liam chegou a ser hospitalizado duas vezes nos últimos anos por problemas no órgão. O cantor chegou a cancelar o seu show na primeira edição do festival de música The Town, em 2023, bem como sua turnê pela América do Sul, que seria na mesma época. Ele havia sido escalado para ser um dos artistas principais do evento.
Em março de 2024, o músico lançou o single Teardrops, que mostraria um pouco como seria o seu segundo álbum solo. Entretanto, a música não atingiu os valores comerciais esperados: ficou na 43ª posição entre as mais ouvidas no Reino Unido, enquanto a meta era chegar à 30ª colocação. Por conta disso, a equipe de Liam decidiu adiar a estreia, sem uma data definida. A quebra da parceria com o seu empresário, no início do ano, tornou-se outro motivo para essa escolha.
Maya Henry, ex-noiva do cantor, publicou o livro ficcional Looking Forward (“Esperando ansiosamente”, em tradução livre) em maio de 2024. Segundo a autora, a obra conta com partes autobiográficas que envolvem agressão física, um relacionamento abusivo e um aborto forçado. A personagem principal é Mallory, que tem uma relação com um artista que fazia parte de uma banda e passou a ter um comportamento tóxico graças à estagnação de sua carreira.
Maya relatou em suas redes sociais que foi perseguida pelo músico após o término: “Desde que terminamos, ele me manda mensagens, vai explodir meu telefone. Não só do telefone dele, é sempre de números de telefone diferentes também, então nunca sei de onde isso vai vir”. Entretanto, nada foi confirmado.
Embed from Getty ImagesRelacionamento entre Maya e Liam teve um fim em 2022 [Imagem: Reprodução/Stuart C. Wilson/Getty Images for The Business of Fashion]
Morte em investigação
Por volta das 17h de quarta-feira (16), o hotel argentino Casa Sur realizou uma ligação à emergência, com o objetivo de informar sobre um hóspede agressivo que poderia estar sob efeitos de álcool e drogas. Poucos minutos depois, Liam Payne caiu da sacada do terceiro andar da construção. O cantor estava na Argentina para acompanhar o show de Niall Horan no país, ocorrido no dia 4 de outubro.
Alberto Crescenti, profissional que atuou na equipe enviada ao hotel, afirmou ao jornal La Nación que o artista “apresentava lesões incompatíveis com a vida”. Não havia possibilidade de ressuscitação.
Segundo a autópsia preliminar emitida pelo órgão responsável pelo caso, Liam sofreu “politraumatismos”, além de “hemorragia interna e externa”. O jornal argentino Clarín divulgou imagens do quarto onde o cantor estava, no qual haviam fósforos, velas, champagne e um pó branco, que o veículo considerou ser cocaína. A polícia também encontrou uísque, um isqueiro e um celular no local da queda.
De acordo com a autópsia do corpo do cantor, divulgada pelas autoridades argentinas, haviam indícios de cocaína rosa — que mistura uma droga estimulante e um depressor, geralmente metanfetamina, cetamina, ecstasy e opióides —, o remédio ansiolítico benzodiazepina, crack e cocaína normal. A polícia suspeita que algum funcionário do hotel tenha fornecido as substâncias ao artista. Até o momento da publicação desta matéria, as investigações não foram finalizadas.
Em julho de 2023, Liam falou ao portal Metro que estava passando por dificuldades relacionadas à sua saúde mental e ao abuso de substâncias: “Nesses momentos em que eu estava super deprimido, eu perdia minha sobriedade”. Na ocasião, o cantor esclareceu: “Eu só queria deixar isso claro, porque sei que provavelmente há algumas pessoas que passam pela mesma coisa, talvez você nem saiba às vezes. Mas, só para você saber, você não é o único”. No mesmo ano, Liam foi a uma clínica de reabilitação e comemorou ao canal do Youtube IFL TV que estava sóbrio havia mais de 100 dias.
Artistas e ex-colegas de banda também fizeram homenagens em suas redes sociais:
Marcella também deixou uma mensagem para Liam: “Fico triste em saber que ele, uma pessoa tão parecida comigo, acabou tendo esse fim. Ele tinha essa questão de ser perfeito e amado. Eu gostaria de falar para o Liam que tudo bem pedir ajuda e que ele era sim muito querido”.
*Imagem de capa: Reprodução/Instagram/@liampayne
Adorei a reportagem, pois me ajudou a entender todo o contexto da trágica notícia da morte de Liam.
Parabéns pelo excelente trabalho.