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‘The Last of Us’: um presente não só para fãs antigos, mas para o mundo do audiovisual

A adaptação faz coro ao game de 2013 ao entregar fidelidade, profundidade e novos aspectos a uma linda história sobre amor e cura

The Last of Us (Sony Computer Entertainment, 2013-2020) é uma das maiores franquias de videogames do mundo: até o momento, são mais de 37 milhões de cópias vendidas desde o lançamento do jogo. Elaborado pela Naughty Dog e publicado pela Sony Computer Entertainment, o título já foi lançado em múltiplas plataformas, acumulando fãs e importantes premiações com o passar dos anos. Diante do sucesso, a rede de streamings da Warner, a HBO Max, assumiu a grande responsabilidade de produzir uma série live-action que não só agradasse os milhares de fãs da franquia, mas também se equiparasse ao estrondo da produção original. 

É fato que adaptações de videogame para o audiovisual não têm uma boa reputação. O recente filme da franquia Uncharted — outra obra da desenvolvedora Naughty Dog é um exemplo desse fracasso. Com uma pré-produção conturbada e adiamentos por conta da pandemia de Covid-19, o longa-metragem desagradou tanto a fanbase quanto aqueles que nunca haviam ouvido falar no jogo. A superficialidade com a qual elementos importantes da narrativa são tratados, como a relação de amizade entre os personagens principais e a ausente conectividade entre o material base e seu filme se destacaram ao provocar grande descontentamento nos espectadores. 

Porém, a série televisiva The Last of Us (2023- ) surpreende por todos os fatores pelos quais o longa Uncharted decepciona. Com uma participação ativa não só do criador da história, Neil Druckmann, como também da equipe criativa por trás do desenvolvimento do jogo, a produção da HBO contempla a essência e a fidelidade com a narrativa enquanto explora inovações que enriquecem ainda mais o universo do game

O AMOR CONQUISTA TUDO

A dupla principal dá um show de atuação e química. Bella Ramsey traz a forte personalidade de Ellie com um toque de inocência, enquanto Pedro Pascal, como Joel, apresenta uma atuação dura, mas que transmite os profundos dilemas do protagonista. A escolha de Bella Ramsey para o papel gerou muita polêmica entre os fãs de The Last of Us, por falta de similaridades físicas com a personagem e pelo gênero de Bella, que se identifica como uma pessoa não-binária. Apesar das críticas, os intérpretes conseguiram dar vida aos personagens dos games, mantendo sua essência e adicionando aspectos novos às suas representações. 

Bella Ramsey e Pedro Pascal interpretam perfeitamente a dupla principal, trazendo novos aspectos e camadas em suas atuações [Imagem: Reprodução/HBO]

O último episódio, intitulado “Look For The Light“, é a maior prova da dinâmica entre Ramsey e Pascal. Os diálogos travados ao longo do capítulo se constroem de forma tão natural que o carinho entre os personagens e a estima entre Bella e Pedro fica palpável. Na cena em que conversam sobre o futuro acompanhados por um bando de girafas fica explícito como um não consegue imaginar sua vida sem o outro, dando um final poderoso para a construção do relacionamento entre eles: a partir daquele momento, viram pai e filha. 

O elenco secundário também não fica atrás dos protagonistas. Vale destacar o difícil trabalho dos atores que é fazer o público se apaixonar por seus personagens e sofrer por suas mortes em somente 50 minutos. O aclamado pela crítica “Long, Long Time”, terceiro episódio da trama, é um ótimo exemplo de como a atuação, quando bem feita, consegue envolver o telespectador e fazê-lo imergir no universo ficcional — mesmo em um curto período de tempo. Nick Offerman como Bill e Murray Bartlett como Frank conseguiram arrancar lágrimas do público ao retratar, de forma simples e emocionante, a pura necessidade humana de vivermos em companhia e de proteger aqueles que amamos. 

RESISTIR E SOBREVIVER

Na produção, o ponto mais elogiado pelos fãs foi a fidelidade com o jogo de 2013. Ao final de todo episódio, internautas realizavam montagens sobrepondo cenas da série e do game, destacando sua similaridade. O roteiro idealizado por Craig Mazin e Neil Druckmann é um dos principais responsáveis por recriar a forte narrativa de The Last of Us, sem reduzi-la a sequências de luta contra infectados pelo fungo. A história mostra o desenvolvimento da relação entre Ellie e Joel, assim como o trabalho dos dois personagens em lidarem com os traumas adquiridos ao longo de suas jornadas. A suave construção dos diálogos e as cenas de violência bem colocadas ao longo da temporada explicitam a intenção dos roteiristas em deixar muito claro que não é uma série sobre violência, mas sim sobre amor e paternidade.

A trilha sonora é outro importante aspecto da produção que corrobora com a presença da essência do jogo na série. Composta por Gustavo Santaolalla, também responsável pelos games, a música é uma peça-chave não só na construção da atmosfera apocalíptica, mas no complemento das cenas. Vencedor de dois Oscars por O Segredo de Brokeback Mountain (2005) e Babel (2006), o toque do artista garante um aspecto único ao conjunto da obra, com a utilização de instrumentos inusitados, como o banjo e o ronroco. Essa atenção especial à trilha e todas as músicas utilizadas nos episódios oferecem ao espectador uma imersão mais profunda e uma experiência personalizada. 

A utilização de faixas já conhecidas, como Never Let Me Down Again”, da banda Depeche Mode, intensifica essa sensação de proximidade com o público e complementa a atmosfera da série. Uma curiosidade interessante acerca da escolha dessa música, que é repetida ao longo da série, é que a letra, quando traduzida, se encaixa perfeitamente na descrição da jornada de Ellie e Joel.

Eu estou dando uma volta com meu melhor amigo

Espero que ele nunca me desaponte de novo

Ele sabe aonde está me levando

Levando-me aonde eu quero estar

Eu estou dando uma volta com meu melhor amigo

Never Let Me Down Again, Depeche Mode   

A atenção aos pequenos detalhes também não se limita à trilha sonora. Os chamados easter eggs — elementos escondidos que conectam personagens ou universos — também agradaram ao despertar um espírito de nostalgia em relação à obra de 2013. A exemplo disso, a série realiza uma adaptação das próprias dinâmicas de jogabilidade, além de utilizar cenários do game. As cenas em que Ellie anda entre prédios por meio de uma tábua de madeira no episódio dois, e Joel dá um mata-leão em um dos saqueadores no episódio seis, são amostras perfeitas que remetem ao gameplay do jogo. 

Os atores que interpretam e dão voz aos personagens originais também podem ser vistos atuando na produção. Ashley Johnson, que dublou e fez a captura de movimento de Ellie em The Last of Us 1 e 2, agora tem o papel de Anna, a mãe da personagem principal. Troy Baker, que é Joel nos games, dá vida a James, o capanga de David (Scott Shepherd) que é sarcasticamente assassinado por Ellie no oitavo episódio. Jeffrey Pierce, que fez a voz de Tommy, agora faz Perry, aliado de Kathleen (Melanie Lynskey) que faz uma aparição no quarto e quinto capítulo. Para completar o time, Merle Dandringe reprisa seu papel de Marlene, a líder do grupo rebelde Vagalumes. Os dubladores brasileiros também foram mantidos: Luiza Caspary e Luiz Carlos Persy (Ellie e Joel, respectivamente) continuam a dar voz aos protagonistas.

Esse cuidado com o material base, além de enriquecer a produção, destaca a série em meio a tantas adaptações que não têm um compromisso de retratar as histórias originais. A riqueza de detalhes também garante a The Last of Us um certo caráter interativo com sua base de fãs, uma vez que, ao colocar discretos elementos que despertam a curiosidade e falam com o espectador, os produtores fazem a fanbase se sentir acolhida e nostálgica.

PROCURE PELA LUZ

The Last of Us já se consolidou como a maior audiência cumulativa de qualquer série da HBO desde a temporada final de Game of Thrones, o que indica a grandiosidade de seu sucesso mesmo dias após o lançamento do episódio final. A direção dos episódios, a construção da narrativa e as atuações de Bella Ramsay e Pedro Pascal remetem à nostalgia do jogo que marcou uma geração, e emocionam tanto quanto. As novas adições surpreenderam positivamente: certas mudanças foram necessárias para trazer novidades a um lançamento datado de dez anos atrás. 

A série não é um presente apenas para apaixonados pelos games, mas também para aqueles que ainda não tinham familiaridade com a história. Ao trazer The Last of Us para o mundo do audiovisual, os produtores quebraram com a maldição de adaptações de videogames e apresentaram o conteúdo de forma muito competente e apaixonante. A popularidade do seriado contribui para a noção de que o mundo dos jogos detém grandes produções artísticas e criativas, e que também devem ter seu espaço no campo do entretenimento.

Porém, a importância da adaptação não se limita apenas a isso. O protagonismo LGBTQIA + trazido pelos personagens faz com que fujamos dos clássicos estereótipos utilizados em produções hollywoodianas. Em The Last of Us, temos uma perfeita amostra de como construir histórias que tenham representatividade, mas que não a façam de forma caricata e sem substância. No episódio três fica evidente a delicadeza do roteiro ao colocar um casal gay no centro de uma história de amor cotidiana, que termina de maneira trágica, mas garante lágrimas de alegria e emoção. Aqui, fugimos do clássico Bury your gays com o lindo discurso final de Bill na última cena entre seu personagem e Frank. 

Bill e Frank fogem de estereótipos hollywoodianos ao entregar uma encantadora e comovente história de amor [Imagem: Reprodução/HBO]

Apesar de ser uma série violenta, The Last of Us também consegue ter momentos doces e sutis. A história, na verdade, não é sobre o surto de Cordyceps e o desejo de matança dos estaladores; é sobre Ellie e Joel, e sobre como a natureza humana se comporta em meio a um cenário desordenado. Os questionamentos morais trazidos pelo enredo são profundos e mexem com o espectador ao deixar um gosto amargo, mas necessário. O último episódio é um convite para um dilema ético, forçando o telespectador a se colocar no lugar de Joel e se perguntar o que faria no lugar dele. 

Para a alegria dos fãs, The Last of Us já foi renovada e deve seguir a narrativa do segundo jogo. Fica a expectativa para sabermos se o roteiro seguirá à risca a história de Ellie e Joel, e o possível desafio que pode ser consequência dessa escolha. O último episódio da trama termina a história do jogo de 2013 com a mesma potência narrativa, sem medo de incomodar e inquietar o público. Os importantes ganchos deixados tranquilizam ao indicar que a fidelidade com a história continuará sendo um dos mais fundamentais fatores de produção.

Ellie: Então o tempo cura todas as feridas?

Joel: Não foi o tempo que curou.

The Last of Us

Imagem de Capa: Divulgação/ HBO

1 comentário em “‘The Last of Us’: um presente não só para fãs antigos, mas para o mundo do audiovisual”

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