por Natan Novelli Tu
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O som de animais compete com uma música misteriosa. Em primeiro plano, uma fauna florestal preenche as laterais do quadro. Em segundo, uma colina imponente ocupa o que sobrou. De costas, um vulto portando um chapéu de cowboy e um chicote caminha até o centro da tela. Logo atrás, um grupo irrequieto o acompanha. Sempre oculto por folhas e sombras, o sujeito segue anônimo pela mata. Defrontados por estátuas disformes e flechas venenosas, parte do grupo logo debanda, mas o herói mantém-se resoluto. Enquanto confere o mapa, seu ouvido atento percebe a arma que um de seus assistentes engatilhava contra ele. Sem pestanejar, Indiana Jones saca seu chicote, desarma-o e se virando, finalmente exibe seu semblante à plateia.
Há exatos 35 anos, dia 12 de junho de 1981, os norte-americanos puderam testemunhar pela primeira vez o arqueólogo mais icônico do cinema (que logo mais vem para um quinta aventura). Inspirado nas histórias pulp (pai das revistas de super-heróis) e séries de TV da infância de seus criadores, Indy herdou o gosto por lugares inóspitos e o magnetismo de vilões excêntricos. Tinha-se também a intenção de concebê-lo aos moldes de James Bond, derivando assim os Indy gadgets e Indy girls. No entanto, mesmo remetendo a diversos símbolos da cultura pop, a originalidade de Steven Spielberg e George Lucas daria à franquia o protagonismo em nosso imaginário coletivo (que, mesmo após o muito criticado Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, aponta rumores para uma quinta aventura).
Em primeiro lugar, o que seria de Indiana Jones sem o carisma de Harrison Ford? Mais de 30 anos depois, é quase impossível nomear um sem lembrar do outro, e não é por menos. De um vigor físico invejável, Indy é tanto um sujeito determinado e capaz, quanto atrapalhado e canastrão. Além disso, os maneirismos de Ford, como o sorriso de canto e o olhar desesperado, fazem dele mais do que um mero brucutu, um ser humano pelo qual podemos criar empatia. Perceba, por exemplo, na continuação da cena supracitada, como após enfrentar armadilhas, aranhas, índios e uma bola gigante, Indy grita apavorado por uma cobra inofensiva em seu colo.
A sensibilidade de Indy só será, no entanto, mais empática pelo contraste que ela tem com o calculismo de seus vilões. Ainda assim, é interessante perceber como as ações destes, mesmo que racionais, acabam no fundo sendo produto de uma busca espiritual. E aqui, seja com nazistas, comunistas ou líderes religiosos, a franquia sempre primou pelo exagero de suas excentricidades. Com isso, de uma forma ou de outra, os antagonistas acabavam se tornando caricaturas inumanas, forçando o espectador a se agarrar ao que restava da humanidade da trama; em outras palavras, a Indy.
Qual seria também a graça da aventura sem a emoção da trilha de John Williams? Aparecendo do primeiro ao último minuto, o ritmo orquestrado embala tanto os momentos de ação, como os de calmaria e romance. Falando em ritmo, é ainda invejável como Spielberg impõe um constante senso de urgência, como se cada respiro fosse o prenúncio para uma nova empreitada. E cabe aqui a cena inicial de Indiana Jones e o Templo da Perdição (Indiana Jones and the Temple of Doom, 1984) para ilustrar a maestria da direção.
Assim que o musical de abertura acaba, somos levados a uma mesa repleta de chineses mal-encarados. No corte seguinte, Indy surge de costas dirigindo-se a eles. Ele então se senta, troca um de seus achados arqueológicos por um diamante e, conforme o debate começa a se inflamar, é evidente que algum desastre está por acontecer. Sempre carregado de suspense, a tensão tem seu ponto máximo quando Indy bebe de uma taça envenenada. A partir daqui, a montagem torna-se fundamental: através de cortes rápidos, vemos pistola, pessoas gritando, socos, correria, e no meio disso, o antídoto e o diamante batendo de pé em pé. Junto de uma das dançarinas do restaurante, Indy pula da janela e cai dentro de um carro amigo. Infelizmente, o descanso dura pouco porque os chineses já rapidamente voltam ao encalço. Mais uma vez, a tensão prospera, até que ele finalmente consegue despistá-los entrando em um bimotor. No entanto, quando tudo parecia ter se resolvido, Indy fecha a porta, revelando ao espectador que eles na verdade haviam entrado em um dos aviões do próprio chinês. Como é possível constatar, a tensão nunca para e, mesmo quando o faz, o suspense já começa a ser desenvolvido para a cena de ação que virá a seguir, ou seja, um constante senso de urgência.
Mais do que isso, Caçadores da Arca Perdida é também um grande exemplo de como se deve fazer cinema de ação. Com uma câmera sempre fixa, Spielberg alterna planos ora abertos, ora fechados que dão a dimensão espacial da cena. Uma vez tendo isso bem feito, os combates podem se utilizar dos objetos ao redor para criar dinamismo, sem que assim fiquem confusos ou repetitivos. Perceba, por exemplo, como na famosa cena em que o adversário de Indy acaba morto pela hélice do avião, que a luta não se trata só do embate físico dos dois. Muitos outros elementos próximos também servem de arma, como a areia, os suportes que fixavam as rodas para que o avião não se mexesse, a metralhadora do avião, e é claro, a própria hélice.
Em outros momentos, é a espontaneidade da situação que a torna memorável, como quando Indy atira a seco em um árabe que se exibia com a espada, quebrando totalmente a expectativa. Mas é a clareza das cenas o que mais impressiona, já que Spielberg nunca se utiliza de mais cortes do que o necessário. Se ele quiser uma cena em que Indy tenha que se segurar pelo chicote enquanto o carro se movimenta, é preciso um bom dublê, nada mais. Quanto menos cortes, mais realista é a cena, e portanto, o espectador se prende ao filme.
Por fim, mas não menos importante, existe um detalhe temático que enriquece em muito a beleza da franquia: o respeito às crenças alheias. Em todo final de aventura, o roteiro leva as personagens a serem confrontadas por forças sobrenaturais. A partir daí, os vilões são normalmente possuídos pela ganância, levando o artefato e todo o sítio arqueológico à auto-destruição. Diferentemente dos demais, Indy busca somente suprir sua contemplação pela história, difundindo seus achados à sociedade. No entanto, perceba como Indy nunca conseguiu levar um artefato sequer para o museu. E é aqui que descobrimos uma mensagem por trás de todas as lutas e tiroteios. Em museus, as peças seriam fatos. A fé, por outro lado, nasce e morre dentro de cada um, devendo ser portanto resguardada do olhar factual. Basta acreditar nela, não possuí-la. Sendo então sagradas em sua conjuntura, as peças devem permanecer somente e só na mesma. Assim, por crença, pode-se entender tanto a religião cristã (Arca da Aliança e Santo Graal), quanto outras, como a hinduísta (Pedras de Sankara) e a maia (Caveiras de Cristal). Uma lição que, assim como a franquia Indiana Jones, deverá permanecer por muitos outros 35 anos de maneira atemporal; atemporal como a fé.
Gostei muito do filme Indiana Jones e Os Caçadores da Arca Perdida, para mim, é Nota 9,5, e dá para Assistir este filme de Ação, Aventura e Fantasia Dublado em: https://tvcanais.com/os-cacadores-da-arca-perdida/