Esse filme faz parte da 44ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique na tag no final do texto.
Mosquito (2020) é um filme que se passa no contexto da Primeira Guerra Mundial, mais precisamente em 1917, retratado a partir da participação de Portugal nos confrontos ocorridos em Moçambique contra as tropas da Alemanha. Mas a história está longe de ter seu foco nas batalhas propriamente ditas, como nos filmes mais populares de guerra. Aqui, tem-se uma narrativa centrada nas batalhas internas do protagonista: Zacarias (João Nunes Monteiro).
Zacarias cumpre o perfil do jovem destemido e patriota que faz de tudo para defender seu país e provar sua honra para seus superiores. Com apenas 17 anos, ele se alista no exército português com o objetivo de prestar serviço na França, mas vê seu trajeto mudado quando recebe a notícia de que seu destino será Moçambique. O roteiro, feito por Fernanda Polacow e Gonçalo Waddington, é inspirado na história real do avô de João Nuno Pinto, diretor da obra, que serviu ao exército português em Moçambique também aos 17 anos.
As expectativas e a visão idealizada de Zacarias são postas constantemente à prova no decorrer do filme. O protagonista deixa claro o que busca: “que a guerra devolva o homem que sempre me cobraram que fosse. E se for a vontade do vosso altíssimo que eu tombe no campo de batalha, pois que assim seja”. Descontente com sua ocupação e decidido a pegar em armas e lutar no fronte das batalhas, Zacarias decide travar uma caminhada para chegar ao pelotão da Quarta Companhia Expedicionária Portuguesa para defender sua pátria tal como imaginava que seria.
Nessa trajetória Zacarias contrai malária — doença parasitária transmitida pelo mosquito infectado. Então, o longa estabelece sua abordagem e justifica seu nome. Os delírios do personagem, decorrentes da manifestação da doença em seu corpo, se misturam à realidade da guerra, o que acaba construindo um espaço permanente de tensão.
Os efeitos sonoros elevados nos momentos de mais apreensão também contribuem para provocar essa tensão no espectador, bem como os sons dos animais e de batidas — hora ritmada, dando mais tensão a cena, hora desritmada, dando a impressão de desespero.
Zacarias demonstra para o espectador as mais diferentes emoções e características de sua personalidade. Suas lágrimas são os exemplos mais evidentes disso, pois expressam medo, felicidade, tristeza e decepção ao longo da história. A forma como o personagem age diferente quando está sozinho ou com outra pessoa ajuda a entender um pouco do que se passa na cabeça do jovem.
Sobre a interação do protagonista com os outros personagens, de outras nacionalidades, cabe reparar que os outros idiomas não foram traduzidos para o público. Ou seja, o público não é colocado em uma instância superior de compreensão em que recebe pistas daquilo que virá pelos próximos minutos. O espectador é igualado a Zacarias e segue, assim como ele, sem saber o que vai acontecer.
Mosquito é um filme português que se passa na guerra, mas que tem seu conflito protagonizado individualmente pelos personagens, com cada um expressando sua própria forma de encarar a guerra de seu lugar na narrativa. O longa mostra para quem assiste, a partir da história desse jovem de 17 anos, uma perspectiva da guerra guiada pelo instinto de sobrevivência, por interesses e também pela maneira de lidar com a solidão.
Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/Alfama Films