por Bianca Kirklewski
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Vivemos num mundo banhado a indiferença e repetição, onde ninguém parece estar preocupado em emergir à superfície em busca do inédito. Somos conformados, e não temos a menor pretensão de sair de nossa zona de conforto sequer para pensar. Nossos discursos e ideais são iguais. É como se fôssemos uma massa uníssona.
Michael Stone sabe disso. Sente isso. Escuta isso: em seus ouvidos, todas as vozes têm o mesmo tom. Não importa se quem está falando é criança, mulher ou idoso. A audição de Stone capta apenas uma única voz masculina apática.
Casado, pai de um filho e autor de Como Posso Ajudá-lo a Ajudá-los?, best seller motivacional voltado para atendentes de call center, Michael reconhece ser infeliz. E é durante uma viagem a trabalho que ele decide fugir de sua tristeza recorrendo ao passado. Mais especificamente, a um antigo amor. Michael não se recorda muito bem por que a deixou. Foram felizes por algum tempo. Mas ele tem essa mania, esse defeito. Enjoa das pessoas, deixando de enxergar o brilho delas subitamente. Ao telefoná-la, não reconhece sua voz: seu timbre havia se padronizado ao habitual tom grave e indiferente de sempre.
Stone tenta ignorar o inconveniente e arrisca convidá-la para beber algo no hotel onde está hospedado. Talvez, se satisfeitos, seus desejos carnais poderiam preencher o vazio que sentia. Tudo em vão. Seu egoísmo e falta de interesse transpareceram, afugentando-a.
Sozinho, de volta ao leito de seu quarto, Michael escuta uma voz diferente, intermediária entre o agudo e o grave – um timbre doce. O desamparado homem foge de seu quarto em busca da fala que ecoava em sua cabeça e bate de porta em porta até chegar ao dormitório de Lisa. Representante de vendas, a moça estava lá justamente para vê-lo palestrar. Sedento por sua voz, Stone a convida para sair. Teria ele encontrado a sua dissonante? Ou o hábito iria prevalecer e Lisa logo o aborreceria?
Anomalisa (Anomalisa, 2015) é a nova aposta do diretor Charlie Kaufman (responsável pelo roteiro de Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças). O grande atrativo do filme é que ele é todo rodado em stop motion. Com uma arte elaborada, roteiro e trilha sonora interessantes, o longa tem um ritmo pesado, que se arrasta do começo ao fim. Os personagens incomodam, provavelmente por causa de seus defeitos, que, expostos, nos causam inevitável comparação e identificação. O filme conta ainda com cenas hiper-realistas de sexo e nudez, um tanto quanto embaraçosas, por se tratarem de bonecos.
Anomalisa estreia dia 28 de janeiro nos cinemas. Assista ao trailer: