Por Nícolas Dalmolim (nicolas.dalmolim@usp.br)
Um encontro de avô, mãe e filha. Foi com essa proposta que o Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) da USP, em parceria com a Jornalismo Júnior, organizou a aula magna “O Jornalismo pelo olhar de 3 gerações”. O encontro ocorreu na última segunda (18), no Auditório Freitas Nobre do departamento.
O evento teve a participação dos jornalistas Ricardo, Mariana e Laura Kotscho. Durante cerca de duas horas, eles repassaram os momentos mais importantes de suas carreiras, analisaram os desafios do jornalismo atual e deram dicas para os estudantes que acabam de entrar na área.
A família Kotscho
Ricardo Kotscho acaba de completar 60 anos de carreira e atua como colunista do UOL e do canal MyNews no Youtube. O jornalista passou por alguns dos principais veículos de comunicação do país, como O Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil, IstoÉ e Folha de S. Paulo. Também foi secretário de imprensa do governo Lula entre 2003 e 2004. Ganhou os prêmios Esso, Cláudio Abramo, Vladimir Herzog e Comunique-se.
“Hoje existem mil tipos de jornalismo. Mas, para mim, só tem dois: o jornalismo honesto e o desonesto, o bom e o mau jornalismo.“
Ricardo Kotscho
Ricardo Kotscho cedeu um exemplar de seu livro Uma Vida de Repórter: do golpe ao Planalto para a biblioteca da ECA (Escola de Comunicações e Artes da USP). [Imagem: Isabel Teixeira]
Mariana Kotscho está prestes a completar 30 anos como jornalista, e atuou na televisão na maior parte de sua carreira. Atualmente é colunista do Bem Estar, na TV Globo, e possui seu próprio site especializado em educação, saúde, comportamento e maternidade. Trabalhou em SBT, Record, TV Brasil e TV Cultura.
Laura Kotscho estuda Jornalismo na Faculdade Cásper Líbero e é redatora e produtora do ICL Notícias, veículo digital fundado pelo empresário Eduardo Moreira. Além disso, estagiou na rádio Antena 1.
“A nossa profissão é de prestador de serviço à sociedade.”
Laura Kotscho
A aula magna também contou com convidados ilustres, como o jornalista Heródoto Barbeiro (à direita). [Imagem: Nícolas Dalmolim]
Olhares de uma profissão
Em sua fala de abertura, Ricardo não escondeu o amor que tem pela área que exerce há seis décadas. “Jornalistas costumam reclamar muito. Mas se fosse tão ruim a profissão, eles já teriam a abandonado”, ironiza. Além disso, ele afirmou que o jornalismo não é apenas uma escolha de carreira, mas sim de vida.
“Dizia o mestre Audálio Dantas que repórter é um ser que pergunta. É isso: a gente pergunta, as pessoas respondem, e a gente conta uma história.”
Ricardo Kotscho
Por sua vez, Mariana destacou os desafios que a profissão enfrenta, seja pela chegada de novas tecnologias, como a inteligência artificial, ou pela popularização dos profissionais freelancers. “Eu noto que, hoje em dia, muita gente não tem um único emprego, mas colabora com vários [veículos]”. Segundo ela, nesse contexto a sindicalização dos jornalistas acaba sendo de extrema importância para a união da categoria.
Mariana Kotscho participou do evento por chamada de vídeo, ao vivo dos Estados Unidos. [Imagem: Isabel Teixeira]
Laura aproveitou sua primeira fala para explicar por que optou por seguir a área de sua mãe e seu avô. “Quando eu lia os textos na escola, eu fazia entonação de jornalista”, conta. De acordo com a jovem, ouvir as histórias da família foi outro fator que a motivou seguir na carreira.
Mariana até brincou com a escolha de profissão da filha:
Assim como meu pai me levava para fazer plantão [trabalhar aos fins de semana e feriados], eu levei a Laura para fazer plantão comigo. E ela cresceu achando que era legal!
Mariana Kotscho
Medos, escolhas e experiências
Ao responder às questões propostas pelos espectadores, a família não escondeu que é natural sentir inseguranças ao longo da carreira jornalística. “Acabei de fazer 76 anos e eu [ainda] morro de medo de perder o emprego”, afirmou Ricardo.
No auditório estavam presentes tanto jornalistas formados como estudantes de Jornalismo. [Imagem: Isabel Teixeira]
Mariana conta que teve de fazer certas escolhas para que pudesse aproveitar a profissão do jeito que desejava. Ela exemplifica seus dois anos como repórter da Globo no nordeste do Brasil: “Eu tinha recebido um convite da Bloomberg em Nova York, mas escolhi ser correspondente no Ceará e não me arrependo de jeito nenhum”.
Ricardo também relembrou seu período como repórter do Jornal do Brasil na Europa durante a década de 1980, no fim da Ditadura Militar. Segundo ele, a experiência mudou a forma como enxerga nosso país: “Às vezes, olhando de longe você tem uma visão melhor das coisas”.
Jornalismo, debate aberto
A família Kotscho também respondeu sobre temas atuais que envolvem a área jornalística, como a não necessidade de diploma para o exercício da profissão. “Eu sou a favor da faculdade, eu sou a favor de estudar”, enfatizou Ricardo.
Quando questionada sobre a existência ou não de um “jornalismo progressista”, Laura pontuou que o mais importante é a defesa da democracia, independentemente do espectro político. “Existe jornalismo de esquerda e jornalismo de direita, mas todos [devem trabalhar] com informação verdadeira.”
Laura Kotscho tem 20 anos e diz ter como meta cobrir o Carnaval e as eleições. [Imagem: Nícolas Dalmolim]
Reconhecimentos devidos
No início da aula magna, Ricardo brincou que não é um bom exemplo de jornalista, pois nunca se formou. Ele foi aluno da primeira turma de Comunicação Social da ECA (Escola de Comunicações e Artes da USP), em 1967, porém não pôde concluir o curso.
Ao final do evento, o profissional recebeu um certificado de reconhecimento do chefe de departamento do CJE, Luciano Guimarães. O documento busca exaltar as contribuições de Ricardo Kotscho à imprensa e à sociedade brasileira. Logo em seguida, o jornalista agradeceu falando: “esse é meu diploma”.
Ricardo aponta para o seu certificado de reconhecimento. Parte final do evento foi marcada por homenagens ao jornalista. [Imagem: Nícolas Dalmolim]
Também nos momentos finais da aula magna, organizadores do Troféu Audálio Dantas anunciaram que Ricardo Kotscho será um dos homenageados neste ano. A 5ª edição do Troféu está prevista para ocorrer no dia 7 de junho, às 19h, no Salão Nobre da Câmara Municipal de São Paulo. A data marca o Dia Nacional da Liberdade de Imprensa.
O evento “O Jornalismo pelo olhar de 3 gerações” foi organizado pelos professores Rodrigo Ratier e Luciano Guimarães do CJE, e pode ser conferido neste link:
CJE recebe família Kotscho para aula magna “O Jornalismo pelo olhar de 3 gerações”
*Imagem de capa: Nícolas Dalmolim