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A ‘Megera domada’: Eta Carinae é um dos sistemas estelares mais raros e complexos já observados 

Pesquisas conduzidas por Augusto Damineli revelam mistérios sobre a estrela mais estudada por astrofísicos depois do nosso Sol, que intriga cientistas há mais de um século
Por Victor Gama (victorgamasilva@usp.br)

Na última quarta-feira, 10 de setembro, aconteceu mais uma edição do programa “Astronomia para Todos”. O projeto existe desde 2017 e busca tornar a astronomia mais acessível para o público leigo por meio de palestras realizadas por professores e especialistas do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). A palestra contou com transmissão ao vivo no YouTube.

O evento foi conduzido pelo Professor Doutor Augusto Damineli, um dos especialistas mais respeitados atualmente no meio da astrofísica. Ele foi o responsável por aprofundar estudos sobre o sistema estelar de Eta Carinae, a estrela mais estudada depois do Sol.

“Você pode gastar a sua vida fazendo um monte de coisas. Eu escolhi Eta Carinae”  

Prof Dr Augusto Damineli, IAG-USP

Por que estudar Eta Carinae?

No início de sua trajetória acadêmica, a falta de informação acessível sobre Eta Carinae motivou o professor a se aprofundar no conhecimento sobre a estrela. Segundo ele, atualmente este campo de estudo é uma fonte de trabalho e muitos jovens estão se formando e estudando sobre ela.

apresentação eta carinae
A palestra contou com um público diverso, com participação de várias crianças. [Reprodução/Acervo Pessoal Victor Gama]

Desde 1996, mais de 350 artigos foram publicados com mais de 14 mil citações sobre o tema. O interesse por uma estrela tão distante se dá porque ela é a estrela mais massiva do universo local – ou seja, da parte do universo mais próxima de nós, que conseguimos observar com maior detalhe.

“Eu vivo entre o céu e a terra, nos lugares mais altos, conheço todos os perfumes do alto das montanhas. É uma vida interessante.”                              

Prof Dr Augusto Damineli, IAG-USP

Para o professor, o mais instigante sobre Eta Carinae é que ela não deveria estar aqui. “É como se tivesse um dinossauro no quintal para estudar”, explica Damineli. Esse tipo de estrela é uma raridade atualmente, mas elas moldaram a química e a dinâmica das galáxias no passado.

Uma das primeiras descobertas de Damineli foi que Eta Carinae é um sistema binário. Isso significa que é um sistema formado por duas estrelas, uma maior e outra menor. Atualmente, a estrela está no seu período de maior aproximação – chamado de periastro. 

Esse fenômeno foi descoberto pelo professor, e é importante porque permite entender todo o funcionamento e características do astro. “Assim como se descobre fatos sobre alguém ao se aproximar dela e ouvir suas conversas no ônibus, esse é o período em que podemos descobrir coisas sobre Eta Carinae”, explica o professor.

ilustração eta carinae
O desenho apresentado pelo professor foi feito pelo seu neto e, segundo ele, “ilustra melhor o momento de periastro entre as estrelas do que uma representação de inteligência artificial”. [Reprodução/Acervo Pessoal Victor Gama] 

A Megera Domada (em três atos)

Damineli explica que dividiu em três partes a história recente das pesquisas sobre Eta Carinae. Ele denomina essas partes como atos de uma peça, e pede licença a Shakespeare para apelidar a estrela de “A Megera Domada”. 

O seu primeiro ato toma lugar nos séculos XIX e XX, quando começaram as observações. Até esse momento, ninguém conseguia prever nada sobre Eta Carinae e a consideravam uma estrela ‘problemática’ – ou uma megera. Por não terem descoberto ainda que se tratava de uma estrela binária, diversas hipóteses e suposições não se confirmavam.

Damineli narrou o seu processo de pesquisa. Após muita análise, ele percebeu que a estrela sofre um apagão a cada cinco anos e meio. Isso se deve ao fato de ela ser uma estrela binária com alta massa, mas também extremamente estável. Esse fenômeno ocorre logo após o periastro – momento em que as estrelas se aproximam, a menor dá um mergulho na atmosfera gasosa e gera um aumento de luminosidade. Logo após, acontece um eclipse, e a menor se “esconde” na maior, fazendo com que aconteça o apagão. 

Em 1996, ele escreveu um artigo no qual previa que o próximo apagão aconteceria entre o fim de 1997 e início de 1998. Essa previsão atiçou os incrédulos, que ainda estavam muito reticentes sobre os estudos.

Nenhum dos observatórios quiseram ceder tempo para Damineli observar a estrela e confirmar a sua hipótese. Mas um amigo que estava com tempo em um observatório viu que a estrela estava, de fato, apagada. 

Esse fato trouxe repercussão nacional à pesquisa do professor, além de aumentar a visibilidade e o interesse por Eta Carinae. À partir desse momento, Damineli pode considerar que essa megera estava “domada”.

Atualmente, vivemos o terceiro ato dessa peça teatral cósmica. O professor demonstrou que, no momento, talvez a megera não esteja mais domada. Algumas descobertas recentes nos levam a acreditar nisso.

A principal delas é que agora, em 2025, foi observado que as órbitas das duas estrelas entre si podem ser instáveis. A cada ano, o local de colisão entre as estrelas está mudando, o pico de luminosidade está acontecendo cada vez mais cedo em relação ao periastro e o brilho da colisão está aumentando. Segundo o professor, essas mudanças ainda são muito recentes e é necessário que sejam profundamente analisadas para se confirmar quaisquer hipóteses. 

Nos próximos meses, o telescópio espacial James Webb irá observar Eta Carinae para desvendar as moléculas que compõem o sistema estelar binário. 

O evento instiga a curiosidade do público, e funciona como um espaço de debate e conhecimento que expande as fronteiras da Universidade. Sessões de “Astronomia para todos” ocorrem periodicamente no IAG-USP, e as próximas datas previstas são 08/10/2025 e 12/11/2025. Mais informações podem ser encontradas no site do instituto.

observando as estrelas e o sistema eta carinae
A palestra foi seguida por uma sessão de observação do céu no estacionamento do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). As condições meteorológicas permitiram que fosse observado Saturno com extrema nitidez. [Reprodução/Acervo Pessoal Victor Gama]

*Imagem de capa: Wikimedia Commons

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