Sob várias perspectivas, a astrologia se desdobra como arte imprecisa
Por Thaislane Xavier (thaislanexavier@usp.br)
A astrologia, arte milenar que tenta decifrar a influência dos astros nos acontecimentos terrestres e na vida das pessoas, teve sua possível origem na Mesopotâmia.
“Os antigos observaram que certos fenômenos sempre ocorriam em determinadas épocas do ano, com um certo padrão, e que durante cada um dos períodos uma constelação estava passando por ali. Começaram fazer associações e a astrologia começou a surgir”, é o que acredita o astrólogo, ator e publicitário Claucio André.
No início, ela era utilizada para prever catástrofes, períodos de abundância e dificuldades, melhores momentos para iniciar guerras ou comemorações. Com o tempo, a astrologia começou a ser utilizada para fazer mapas astrais de reis prevendo mortes, fracassos e glorificações.
Durante a Segunda Guerra Mundial, houve uma forte perseguição dos nazistas aos astrólogos e Adolf Hitler dizia que a crença em astrologia era estupidez de mentes infantis. O que ele não imaginava era que um astrólogo iria prever que sua vida estava em risco. Em 1993, o astrólogo Karl Enrst Krafft escreveu para um de seus amigos avisando que a vida de Hitler estaria em perigo entre os dias 7 e 10 de novembro. Seus cálculos estavam certos e no dia 8 de novembro uma bomba explodiu em uma cervejaria. O líder alemão só permaneceu vivo porque saiu alguns minutos antes. Krafft tornou-se uma espécie de “oráculo” durante a Guerra e auxiliando o líder nazista em tomadas de sérias decisões.
Progressivamente, a astrologia se torna algo acessível a todos. Os mapas astrais, que antes eram coisa para reis, passaram a ser feitos até de forma online e quase instantânea. Claucio André diz que com o surgimento da tecnologia os mapas que demoravam meses para serem desenhados começaram a ser feitos de forma bem mais rápida.
Hoje, as pessoas procuram, através de previsões astrológicas, antecipar os acontecimentos de seus dias. Ao mesmo tempo que esses presságios trazidos pelos horóscopos de forma diária, semanal, mensal ou anual ganham fãs ao redor do mundo, também recebem duras críticas daqueles que acreditam que tudo não passa tolice.
Apesar de serem mais baratos e acessíveis que os mapas astrais, por serem encontrados em jornais, revistas e sites, os horóscopos são muito gerais, podendo ser encaixados facilmente com qualquer dia que o indivíduo teve ou terá. “Quando criadas por astrólogos sérios, as previsões são feitas de acordo com o céu naquele dia. Mas o cálculo é feito superfluamente e não leva em conta todas as casas do mapa que também tem influência sobre a pessoa”, explica Claucio.
Para a astróloga Laís Pinheiro, não faz sentido acreditar na astrologia de almanaque que se tem hoje. “Uma astrologia baseada apenas no dia do seu nascimento não tem coerência nenhuma. Mas quando se vai para o campo de mapas astrais e o astrólogo dá informações que não teria como ele saber, a astrologia começa a ter lógica”, afirma Laís.
“Uma foto do céu no exato momento que você nasceu”. Nas palavras de Laís, essa é a definição simples e sucinta do que é um mapa astral. A partir dessa foto a vida inteira de uma pessoa pode ser escrita para aqueles que confiam na astrologia.
Para alguns, as informações obtidas a partir dessa imagem podem ser simplistas. Julgar uma pessoa pelo momento em que ela nasceu constitui uma forma de discriminação. Construir toda a personalidade de um indivíduo com base em seu signo deveria ser considerado preconceituoso.
A estudante de letras modernas, Gabriela Panighel, tem um pensamento bem parecido: “Talvez seja sim reducionista pensar em uma pessoa como um mapa astral, não levando em conta de onde ela veio ou como ela cresceu.”
Há aqueles que defendem que os astros não definem a personalidade ou o destino do indivíduo, mas sim mostram quais são suas inclinações. A antiga frase em latim “Astra inclinant, sed non congut” (Os astros inclinam, mas não determinam) define bem a ideia. “O mapa astral dá à pessoa uma forma, porém é ela quem a vai preencher com suas experiências. Ele não reduz o indivíduo por que a pessoa não é Aquário, ela tem formas de manifestar Aquário”, explica o Claucio.
Desse ponto de vista, a astrologia não deve ser entendida como uma previsão. Deve se enquadrar como uma forma de autoconhecimento, para que cada um saiba que pontos devem ser trabalhados e como fazer isso. “Tem muita coisa nos mapas que batem com a vida individual. Eles mostram nossas forças e fraquezas e podem ajudar a melhorar essas coisas”, afirma Gabriela.
Quem procura a astrologia costuma estar com incertezas existenciais: grandes decisões que podem mudar a vida do indivíduo, desilusões amorosas, problemas que não consegue resolver. O astrólogo então reserva um tempo do seu dia para conversar com essa pessoa e entender o perfil psicológico dela. Para só depois conseguir ajuda-lá de forma eficiente. Isso torna a leitura de mapas astrais parecidas com sessões de terapia, onde busca-se o conhecimento de si mesmo.
“A astrologia separa os 12 fatores da vida em áreas e faz uma análise aprofundada de cada uma delas. Isso mostra como a pessoa lida com cada aspecto de seu cotidiano, identificando suas diversas facetas e ajudando o indivíduo a melhorar certos pontos”, diz Laís.
O papel do astrólogo, então, seria auxiliar a pessoa a entender melhor quais são seus talentos, sua forma de lidar com diferentes situações. Não a crença popular: prever o futuro. Além disso, estaria entre suas funções orientar cada um que atende sobre os melhores caminhos a serem seguidos a partir dessas predileções.
No entanto, a ciência não conseguiu provar a validade da prática astrológica. Estudos mostram que se alguma pessoa comum tentasse prever a influência dos astros, seus resultados não seriam muito diferentes daqueles obtidos por profissionais.
Gabriela, por exemplo, não possui nenhuma formação específica na área de astrologia, mas consegue criar mapas. “É bem simples entender e fazer um mapa através de tabelas”, diz. Ela conta que sempre gostou muito de tudo que é esotérico, por isso sempre pesquisou sobre a astrologia e tem vários livros acerca do tema. Com eles, ela fez um estudo aprofundado de como o céu influenciaria a vida na Terra.
Para a estudante de letras modernas, “se a lua influencia as marés, ela também é capaz de influenciar nossos corpos, que são compostos em sua maioria de água. O mesmo ocorre com os outros astros.”
De alguma forma, todo corpo que se encontra no universo exerce uma força gravitacional sobre os demais. Porém, os planetas estão tão longe que a influência exercida por eles seria quase nula. Em um artigo, o biólogo e escritor Richard Dawkins disse que, pela distância que planetas se encontram de nós, sua atração gravitacional seria nula perto da atração do “tapa médico”.
“Quando um planeta passa por certa região, ele interage com a constelação e canaliza [energia]. A gente recebe essas influências na Terra, só que a ciência ainda não consegue alcançar essa interferência. Por isso, a base da astrologia vem de ensinamentos antigos”, é a explicação do publicitário para a falta de provas científicas.
O planeta Terra, que é aquele que se encontra mais perto do indivíduo, deveria ser considerado o astro mais influente. Porém, não participa da criação do mapa, pois a astrologia é uma arte geocêntrica. Pode não se encontrar no céu nos momentos de observação, mas faz parte dele e também é um astro.
Nossa galáxia é enorme e possui muito mais estrelas e constelações do que as que são levadas em conta pela astrologia na hora da criação de um mapa. Se uma estrela ou astro consegue influenciar a vida de um indivíduo, todos os outros também deveriam ser levados e consideração. Assim os presságios astrológicos são incompletos.
“As estrelas são algo bem específico e para trabalhar com elas é preciso se preparar muito. Cada astrólogo tem sua maneira de lidar com o que está no céu. Alguns utilizam mais estrelas e asteroides, contudo a base usada por todos são os planetas”, é o que explica Laís para a não utilização de todas as estrelas. Além disso, ela considera que são muitas e é quase impossível de aplicar a influência de todas.
A base da astrologia é muito antiga, e a tecnologia existente naquela época era bem diferente da que temos hoje. O movimento de precessão da Terra faz com que, neste momento, o sol passe por uma constelação diferente da que passava a exatos 2 mil anos atrás.
Para que fosse mais fácil dividir céu em ângulos exatos, foram consideradas apenas 12 das 13 constelações pelas quais o sol passa. Além disso, o tempo que o sol se mantém em cada constelação não é de um mês: ele passa cerca de sete dias em escorpião e 40 em virgem, por exemplo.
“Talvez o resto da galáxia também influencie, mas estamos dentro desse sistema planetário e levamos em conta apenas os astros que conseguimos ver. É preciso estudar para saber se o resto da galáxia influência ou não”, afirma Gabriela.
A mãe da astrologia, a astronomia, se desenvolveu ao longo dos séculos baseada na ciência. Enquanto isso, a filha continuou com sua base antiga sem considerar a mudança de posição da Terra. Sem a abertura para novas constelações descobertas, aprimoramentos ou grandes mudanças. As técnicas empregadas não mudaram e o que os astrólogos atuais fazem é quase a mesma coisa que os antigos faziam, só que de forma mais rápida graças ao surgimento de certas tecnologias.
Inúmeras informações podem coincidir entre a personalidade do indivíduo e aquelas fornecidas pelo seu mapa astral. Isso também se deve a dois mecanismos que todos nós temos: o viés da confirmação e o viés da retrospectiva.
Nós costumamos optar por informações que já sabemos e acreditamos, segundo a confirmação. Já para o viés de retrospectiva, costumamos nos lembrar mais dos acertos que dos erros. Ou seja, se uma informação estiver certa no mapa astral, a pessoa tende a lembrar dela e não de outras que estavam erradas.
A astrologia pode acertar em diversos quesitos, mas também erra em outros. A falta de embasamentos e provas científicas fazem com que os conhecimentos por ela empregados sejam contestados e tenham menos credibilidade do que os usados por terapeutas em seus consultórios.