por Júlia Pellizon
juliapellizon@gmail.com
Há quem pense que o monopólio cinematográfico é de Hollywood, mas quem acredita nisso está completamente errado. A Índia possui uma indústria do cinema tão grande quanto a dos estadunidenses, mas com uma diferença importante: o objetivo das produções é atender ao consumo interno da população de, aproximadamente, 1,2 bilhões de pessoas. Mesmo com esta gigantesca demanda nacional, o cinema indiano também é reconhecido e apreciado mundialmente. Os cativantes roteiros destacam um lado do Oriente desconhecido, cujas músicas, cores vibrantes e danças trazem a alegria de uma cultura tão rica em 100 anos de cinema indiano.
O nascimento
O termo Bollywood faz alusão à mistura do antigo nome da cidade sede desta indústria, Bombaim (atual Mumbai), com a irmã ocidental, Hollywood. Os fãs dos clássicos acreditam que o termo não designa corretamente o cinema indiano, uma vez que os filmes bollywoodianos têm um viés mais comercial, enquanto os independentes são considerados essencialmente autênticos e originais. No entando, desavenças a parte, é inegável o alcance das produções artísticas do país, que começaram em 1913, com um filme mudo chamado O Rei Harishchandra (Raja Harishchandra). O enredo melodramático e uma reviravolta na vida da personagem principal já anuncia as que seriam principais características desse cinema.
Logo após os anos 30, iniciou-se a elaboração de obras sonoras, que resultaram em um estrondoso sucesso de público. Mas, mesmo com o fascínio perante a arte que já estava colhendo frutos na Índia, a crise de 29 e outras movimentações políticas intensas no país durante o período vieram como um fôlego a mais para a permanência e o incentivo à industria cinematográfica. Lutas sociais e temas que fogem de trajetórias românticas não são muito abordados, principalmente nesse período tenso, em que os filmes eram tratados como uma distração para a realidade complicada e violenta.
O que não pode faltar em um filme bollywoodiano
Dramas, romances, aventuras e musicais. Quatro categorias que juntas constituem um pacote Bollywood completo. Uma explosão de cores também pode ser adicionada ao contexto em geral, já que faz parte da própria cultura indiana. Os ambiente bucólicos, reais ou cenários, apresentam uma originalidade ao ressaltar a tradição rural do povo, que veio mudando com a urbanização recente e caótica, quel também reflete nos padrões bollywoodianos atuais de cinema.
As características como a excessiva passionalidade, com amores impossíveis, tragédias catastróficas e muitos musicais são presentes durante o século de história do cinema indiano. A música é tratada de diversas formas no cinema indiano, sendo como canções cantadas pelas personagens, coreografadas ou apenas como trilha sonora.
Por falar em trilha sonora, quem assistir a esses filmes pela primeira vez com certeza estranhará o som. Isso porque nos filmes de Bollywood mais antigos, a imagem era gravada antes dele. Assim, com os próprios atores se dublando, o filme ganha uma dinâmica diferentes e até engraçada pela falta de coincidência entre o movimento da boca e a fala.
Outra peculiaridade tradicional indiana é o uso do chamado item number, que é a execução de uma dança por um personagem não-principal na narrativa. Pode ser feita por um ou mais atores, mas diferentemente de musicais, as estrelas do espetáculo não são os protagonistas, e sim figurantes. No filme Om Shanti Om, uma história com muita cara de Grease, os atores também participam de um número musical extremamente animado, na canção Deewangi Deewangi. Mais um exemplo é dança final do filme Quem quer ser um milionário (Slumdog Milionaire, 2008), ao som da música Jai Ho.
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Outra questão interessante é a inserção da imagem da mulher nos filmes. Com a influência da colonização inglesa e até mesmo dos sucessos nas telas ocidentais, a figura feminina não é repudiada, muito menos colocada em segundo plano. Apesar de o país manter claras distinções sexistas, alguns filmes como e Mãe Índia (Mother India, 1957) , mostram a mulher como forte e sobrevivente, protagonista valente da história.
Alguns clássicos
Considerado um dos maiores clássicos do cinema mundial, A Canção da Estrada (Panther Pachali, 1955) ganhou dois prêmios no Festival de Cannes de 1956. Desviando do senso comercial e pisando em um solo alternativo, itens menos maquiados, com pitadas de realismo, imprimem um outro olhar para o cinema indiano. O preto e branco, a escassa trilha sonora – explorando sons da natureza – e as tomadas diferentes – até com focos em sombras – são indispensáveis para expressão desse novo caráter.
No caso de Mãe Índia, uma metáfora do próprio país pode ser interpretada: o altruísmo da protagonista, ao sacrificar seu próprio bem estar para cuidar de seus filhos. Lançado em 1957, o longa vai além dos musicais colocando, após o fim da colonização britânica, a luta de uma mulher para sobreviver e criar independentemente os filhos. Sendo a “mãe” de sua pequena cidade, as mudanças de ângulo da câmera – principalmente em horas de desespero da protagonista -, a excessiva maquiagem e o fundo musical alegre até em momentos mais tristes, além de uma narrativa bem estruturada nos 172 minutos, fizeram com que concorresse ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1958.
Amor, Sexo e Traição (Love, Sex aur Dhokha, 2010) é um exemplo de Bollywood bastante contemporâneo. Com os temas polêmicos e chamativos, o longa é influenciado pela vida ocidental, com três histórias marcantes e críticas sobre a televisão. O caráter mais incisivo e questionador da vida cotidiada integram ao novo estilo bollywoodiano de fazer cinema.