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Impressoras 3D: revoluções e controvérsias

Por Laura Alegre (lauraalegre@usp.br) Imagine uma tecnologia capaz de criar tecidos humanos, próteses, casas, carros,  móveis, armas de fogo, instrumentos musicais, action figures e diversos outros objetos – tudo isso feito pelo mesmo tipo de máquina. Parece algo de outro mundo, ou no mínimo futurista, não é? Mas essa ferramenta já existe e é bem …

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Por Laura Alegre (lauraalegre@usp.br)

Imagine uma tecnologia capaz de criar tecidos humanos, próteses, casas, carros,  móveis, armas de fogo, instrumentos musicais, action figures e diversos outros objetos tudo isso feito pelo mesmo tipo de máquina. Parece algo de outro mundo, ou no mínimo futurista, não é? Mas essa ferramenta já existe e é bem mais comum do que pensamos. Estamos falando das impressoras 3D, recurso que vem ganhando cada vez mais popularidade no mundo inteiro e, particularmente, no Brasil.

Comecemos do início, então: como surgiu a impressão 3D?

O criador desse aparato foi Chuck Hull, um engenheiro da Califórnia. Há 34 anos, Hull valeu-se da estereolitografia, um recurso precursor da impressão 3D, para desenvolver o tipo de máquina que usamos hoje. Obviamente, muitas melhorias foram implementadas com o passar dos anos, mas o princípio continua sendo o mesmo de 1984.

Divulgação. Foto: O criador e a criatura – Chuck Hull posa para a foto com busto de si mesmo feito com uma impressora 3D.

A impressão tridimensional passa por algumas etapas básicas. A primeira é a modelagem, cujo princípio é usar um software para criar, no computador, um molde para o objeto a ser impresso. Os moldes podem ser encontrados online ou feitos pelo próprio usuário desse tipo de impressora usando programas específicos.

O segundo passo é a adição de materiais. As impressoras 3D vão depositando, camada por camada, diferentes tipos de materiais para dar forma ao molde. Plástico, resina, metais e até papel são usados como matéria-prima dos objetos. Um filamento injeta o material em altas temperaturas, a fim de que se torne mais maleável, e o processo se repete até que a peça esteja totalmente formada.

Outra questão importante envolvida na impressão 3D é o tempo. Dependendo do tamanho, do tipo de máquina usada e da complexidade do molde, uma impressão pode ser feita em minutos, horas ou até dias. Flávio Vallejo, engenheiro e fundador da empresa SolidSolutions conta: “Já fizemos muitas impressões complexas e problemáticas. Uma que posso me lembrar foi uma maquete do Taj Mahal que apresentava falhas numa fase bem avançada da impressão e tivemos que parar, mudar a estratégia e recomeçar. Entre três tentativas e muito desperdício de material, passaram-se três dias”.

Foto: Flávio Vallejo. A réplica do monumento indiano é fiel à construção original.

Se interessou pela impressora 3D? Então você deve estar se perguntando quanto custa ou como se consegue uma delas, mas antes de sair comprando pela curiosidade, é bom saber algumas coisas. Segundo Vallejo, existem prós e contras em trabalhar com esse tipo de atividade. Para ele, alguns dos fatores positivos são as margens de lucro altas, baixa concorrência e a inovação que atrai consumidores. Entretanto, essas vantagens são inevitavelmente seguidas de certas dificuldades, como preços altos, poucos fornecedores e um mercado ainda incipiente no Brasil. Trata-se de um verdadeiro investimento.

Existem vários modelos, cada um com um sistema diferente. Esses variados tipos têm impacto direto nos valores das máquinas. Em uma pesquisa rápida feita na internet, é possível encontrar vários modelos que custam desde R$800,00 a quase R$100.000,00. Não se espante com o preço, pois no começo dos anos 1990 quando essa tecnologia era extremamente recente era necessário desembolsar cerca de um milhão de dólares para adquirir uma delas!

Independentemente dos custos, o fato é que essa nova forma de fabricar objetos está revolucionando o nosso cotidiano, e essa é uma tendência que se prolongará por um bom tempo. Já é possível morar em casas artificiais, dirigir carros impressos e valer-se de protótipos usados na medicina para suprir a carência de tecidos, tudo por meio dessa tecnologia ainda em desenvolvimento. No Brasil, de acordo com o fundador da SolidSolutions, “há perspectiva de crescimento expressivo da utilização da Impressão 3D nos próximos dez anos. A tendência é a redução dos preços das máquinas, materiais e também evolução dos processos facilitando cada vez mais a experiência dos usuários”.

Na região do estado de São Paulo, uma pesquisa realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) está fazendo com que as impressoras 3D, antes usadas apenas para fabricar protótipos, sejam usadas para desenvolver fibras ópticas no Instituto de Física da universidade. Até na moda, produtos impressos tridimensionalmente ganharam as passarelas e causaram controvérsias entre os estilistas: alguns defendem as roupas feitas à mão como uma forma de arte e são contra a intervenção de uma máquina modeladora nesse processo. De qualquer maneira, o resultado estético fica incrível!

Divulgação. Foto: O designer Michael Schmidt e o arquiteto Francis Bitonti elaboraram esse vestido impresso em nylon para a atriz e modelo Dita Von Teese.

Partindo-se de tantos exemplos, a importância da difusão da impressão 3D é inegável. Para a designer industrial Thaís Guerra, formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e que trabalha há quase três anos com essa tecnologia, “só o fato da impressão 3D estar mais democrática é a prova de que as barreiras entre o digital e o físico estão cada vez menores, e [é preciso] desmistificar a ideia de que a tecnologia é algo mirabolante e que não está ao alcance de todos. Se as pessoas soubessem que impressão 3D não é algo restrito para poucos, e se houvesse mais serviços de impressão 3D disseminados, o acesso seria muito maior”.

Entretanto, nem todos acham que a impressão 3D seja algo completamente positivo na sociedade. Há aqueles que defendem o argumento de que a possibilidade de imprimir os próprios objetos domesticamente representaria a quebra de muitas indústrias que fabricam os mesmos tipos de coisas.

Além disso, recentemente, houve grande repercussão no que diz respeito a armas de fogo impressas por essa tecnologia. Particularmente nos EUA, onde a Defense Distributed, uma organização do Texas em prol do armamento, disponibilizou o molde da chamada “The Liberator” o primeiro molde disponível para impressão de uma arma que realmente funciona. A polêmica se prolongou, e o governo de Donald Trump aprovou e revogou a liberação dos downloads desses projetos.

Eric Gay – Gizmodo. Foto: A arma “Liberator” é pequena e só é capaz de disparar uma vez, mas já é um perigo em potencial.

O grande problema é que essa fabricação caseira apresenta riscos à segurança pública: pela impressão 3D, as armas podem ser usadas sem precisar de número de rastreamento considerado obrigatório pela constituição americana ou checagem da quantidade de passagens pela polícia do portador. Atualmente, não é mais possível encontrar os arquivos no site da Defense Distributed, mas pode-se fazer download deles via torrent em sites de pirataria online.

Thaís Guerra defende que o controle deve ser feito pelos sites em si: “O problema maior é sempre barrar a presença de um conteúdo na internet. Eu acho complicado haver um controle da impressão em si, porque é o tipo de coisa que, se eu fizer em casa, não tem como ninguém saber ou monitorar. O que acho que deve ser feito é o que o site Thingiverse fez: quando colocaram arquivos de arma para impressão no site deles para serem baixados, eles deletaram o conteúdo rapidamente”.

Outro fator de discussão, principalmente no Brasil, é a questão do descarte dos resíduos e materiais utilizados nas impressoras. Thaís acredita que a conscientização sobre esse assunto deve ser proporcional ao avanço da tecnologia: “Ao mesmo tempo em que as impressoras 3D ficam populares, as máquinas de reciclagem dos plásticos que elas produzem também deveriam ficar mais acessíveis, porque nem todos os filamentos são ecologicamente corretos, e consegue-se um resultado muito bonito usando os resíduos de impressão 3D”. Flávio Vallejo ressalta: “No Brasil ainda não temos processos de reciclagem desses termoplásticos [usados na impressão 3D], mas as quantidades [de resíduos] são ínfimas perto de qualquer outro setor da indústria. Lá fora já estão bolando algumas máquinas de reciclagem em pequena escala, mas elas também não chegaram aqui ainda”.

Ele ainda acrescenta que o plástico PLA, usado pela empresa SolidSolutions, é de origem vegetal e biodegradável, o que já contribui com a questão ecológica do processo industrial.

De qualquer forma, vimos que a impressão 3D, embora não seja muito recente, vem ganhando notoriedade nos dias de hoje graças a inovações e polêmicas. O que parecia ser coisa de ficção científica já pode ser considerado algo palpável na atualidade, e a tendência é que essa tecnologia se desenvolva cada vez mais, trazendo suas revoluções e controvérsias para a sociedade.

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