por Carolina Ingizza
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Este filme faz parte da 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para conferir a programação completa clique aqui
Virgem Juramentada (Vergine Giurata, 2015) é um filme escrito e dirigido por Laura Bispuri. Logo nas primeiras cenas, vemos uma mulher andrógina percorrer um longo caminho desde as montanhas da Albânia até chegar a Milão, na Itália. No entanto, ao chegar a seu destino, ela se apresenta como Mark (Alba Rohrwacher), o que provoca uma série de questionamentos no espectador.
De maneira silenciosa, com poucos diálogos e cenas longas de contemplação, o filme segue respondendo as dúvidas que gera a princípio. Alternando cenas do presente na Itália, com momentos do passado de Mark na Albânia, o longa nos revela a história dele.
Na verdade, Mark era Hana, uma orfã encontrada por uma família de um vilarejo tradicional nas montanhas albanesas. Ela foi criada como irmã da filha do casal, Lila (Flonja Kodheli), e ensinada do pouco valor e liberdade que as mulheres possuem naquela comunidade. Há cenas bem didáticas, como, por exemplo, aquela em que a mãe ensina para as meninas que mulheres não devem falar, comer ou beber antes dos homens, não devem caminhar desacompanhadas, nem são autorizadas a fumar ou a caçar.
No entanto, enquanto crescia, Hana não seguia os costumes e se rebelava por não poder expressar suas opiniões, andar sozinha e utilizar um rifle, como seu pai (Bruno Shllaku) fazia. Já Lila se preocupava com as tradições relativas ao casamento, que era arranjado entre famílias e que pregava a total subserviência da mulher perante ao marido.
Assim, para poder adquirir autonomia naquela sociedade, Hana decide se transformar em uma virgem juramentada, que segundo a tradição local, é uma mulher que escolhe viver como homem, prometendo se manter virgem para sempre. Em contrapartida, sua irmã, buscando liberdade, resolve abandonar o vilarejo e fugir com um namorado para a Itália, escapando de um casamento arranjado.
O longa começa anos depois, com Hana (que vivia sendo Mark há dez anos) chegando em Milão para viver com Lila, já que seus pais haviam morrido e não lhe restava nada na vila. Na Itália, ela começa a confrontar sua identidade, já que não precisa viver como homem para poder ser autônoma. Por isso, ela inicia uma jornada de redescoberta do seu lado feminino e de sua sexualidade.
Possui uma interpretação e construção de personagem muito bem feita pela atriz Alba Rohrwacher, que é expressiva mesmo com os poucos diálogos. Suas emoções e mudanças são percebidas por pequenos gestos e olhares. A Hana altiva e ingênua é substituída aos poucos por Mark, um homem tímido, com postura arqueada e olhares baixos.
Já as transformações de Mark em Hana ocorrem principalmente quando ele acompanha a filha de Lila (Emily Ferratello) nas aulas de nado sincronizado. Há diversas sequências dele admirando a piscina, olhando os corpos descobertos nos vestiários, testando a maquiagem das atletas. É naquele ginásio que ele volta a ser Hana e começa a se desfazer de sua virgindade juramentada.
O filme, evidentemente, possui um discurso feminista. Há questões levantadas sobre o posicionamento feminino na sociedade, a necessidade de ser e parecer um homem para poder ter o controle sobre si mesmo e o machismo nas comunidades excessivamente patriarcais. No entanto, além desses temas, Virgem Juramentada não deixa de ser uma obra sobre construções e desconstruções de identidades e sobre redescobrir quem se é.
Confira o trailer: