Jornalismo Júnior

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O fim das florestas: o agronegócio exploratório

As consequências ambientais ocasionadas pelo agronegócio estão se tornando irreversíveis. O consumo excessivo de carne é um dos principais responsáveis.
Por Lara Cáfaro (laracafaro@usp.br)

O desmatamento não é um novo desafio no Brasil. Desde que os portugueses chegaram às terras tupiniquins, a destruição se tornou parte do cotidiano. Por mais de quinhentos anos, a fauna e a flora têm sido devastadas. 

Conforme o Global Forest Watch, o Brasil continua sendo o país com a maior perda de florestas primárias tropicais: apenas em 2022, foi responsável por 43% do total global. Além disso, 1,8 milhão de hectares dessa perda resultou em 1,2 gigatonelada (Gt) de emissões de dióxido de carbono, ou seja, duas vezes as emissões anuais de combustíveis fósseis do Brasil. 

Fora os impactos provenientes do carbono, a perda de florestas na Amazônia afeta as chuvas regionais. Isso pode fazer o planeta chegar a um nível irreversível de perda da biodiversidade, onde a maior parte do ecossistema se tornará um local seco e sem vida. O agronegócio, especialmente a pecuária, é um dos principais responsáveis pelo desmatamento e pelo aquecimento global. De acordo com um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a geopolítica expansionista, os créditos subsidiados, a crescente demanda nacional e internacional por carne e a eterna busca humana pela posse da terra foram fatores que contribuíram para que o desmatamento ocorresse.

Imagem genérica de floresta, aparentemente pinheiros, indicando um desmatamento decorrente de agronegócio exploratório
A pecuária prejudica excessivamente o meio ambiente; a retirada da mata para a criação dos bovinos e suínos causa o desflorestamento, que, por sua vez, desequilibra diversos eixos dos biomas.
[Imagem: Reprodução/Freepik]

Em entrevista à Jornalismo Júnior, o pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Carlos Nobre explicou que é possível reduzir rapidamente as emissões da queima dos combustíveis fósseis, pois já existem diversos tipos de energias renováveis. “Porém, até o momento, não descobrimos uma forma de minimizar os danos causados pelas emissões resultantes do agronegócio”, diz ele. “Ainda que seja muito possível zerar todos os desmatamentos globais de forma rápida, infelizmente não estamos indo nessa direção.”

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) evidencia em seus últimos relatórios a urgência de reduzir o consumo de carne. Os objetivos são tornar viável o cumprimento do Acordo de Paris e limitar o aumento da temperatura do planeta em 1,5°C até o final do século 21. 

Entretanto, o pesquisador também alegou que, com o aumento da população mundial e a necessidade constante e excessiva de produção de alimentos, é provável que o planeta continue a aquecer intensamente e ultrapasse o limite estabelecido.

Amazônia

O maior bioma brasileiro possui uma grande diversidade biológica. Essa floresta pluvial contribui imensamente para a estabilidade de todo o planeta, seja por suas espécies endêmicas ou pelos diversos povos tradicionais que habitam e cultivam em suas terras.

Imagem de cima da Amazônia e seus rios
Por muitos anos, a Amazônia tem enfrentado as consequências do desmatamento, sendo predominantemente decorrente do agronegócio exploratório.
[Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]

Felizmente, com a intensificação das políticas públicas, como a criação do Ministério dos Povos Indígenas, o desmatamento na Amazônia segue em tendência de baixa, de acordo com o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia). 

Nos dois primeiros meses de 2024, a taxa de desmatamento atingiu 196 km², 63% a menos do que nos mesmos meses de 2023, quando foi detectada a destruição de 523 km². Esse índice é o menor para o período em seis anos.

Por outro lado, a somatória do desmatamento nos meses de janeiro e fevereiro ainda é significativa quando comparada com outros períodos dos últimos vinte anos. Os dados do SAD indicam um desmatamento acima do registrado no mesmo período entre os anos de 2008 e 2017, em que a taxa de derrubada ficou abaixo dos 150 km², com exceção apenas de 2015.

Esses dados mostram que ainda temos um grande desafio pela frente. É preciso atingir a meta de desmatamento zero estabelecida até 2030. É fundamental que o governo concentre esforços na demarcação de terras dos povos originários e na criação e regulamentação das Unidades de Conservação. Estudos do Map Biomas demonstram que, nos últimos 30 anos, as terras indígenas perderam apenas 1,2% de sua área de vegetação nativa, enquanto as áreas privadas perderam 19,9% de sua área.”

Cerrado

No Cerrado, o cenário é diferente; os índices de desmatamento aumentam cada vez mais. O bioma perdeu 3.798 km² de vegetação nativa de agosto de 2023 a fevereiro deste ano, segundo o monitoramento feito pelo Inpe. 

Para a organização WWF Brasil, um dos principais fatores que levam à destruição do Cerrado é a quantidade de autorizações de desmatamento concedidas pelos governos estaduais e prefeituras, com base no Código Florestal.

Dados divulgados pelo projeto MapBiomas sobre a perda de vegetação no Brasil em 2022 exaltam a importância de uma atuação participativa no centro-oeste brasileiro. Até porque o bioma concentra grande parte das nascentes de importantes rios nacionais; seus domínios florestais abastecem, portanto, a maior parte dos rios do Brasil. 

Além disso, devido à sua enorme extensão, o Cerrado contempla uma vegetação bastante diversificada, composta tanto por regiões campestres quanto por formações florestais densas. Ou seja, é fundamental a intervenção para a preservação de uma das maiores savanas do mundo.

Florestas típicas do Cerrado destruídas, ilustrando as consequências do agronegócio exploratório
A destruição do Cerrado brasileiro aumenta a cada ano. 
 [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]

Agropecuária Regenerativa

De acordo com Carlos Nobre, uma das soluções para minimizar as consequências provocadas pelo agronegócio é a pecuária regenerativa. Ela é baseada em uma abordagem inovadora e sustentável para a criação de animais, que busca oferecer benefícios econômicos, ecológicos, sociais e éticos para os produtores e consumidores. A prática pretende respeitar o comportamento natural dos animais, a diversidade biológica e o equilíbrio dos ciclos biogeoquímicos. 

O manejo adequado do pastoreio é um elemento crucial nesta abordagem. Em vez de permitir o pastoreio excessivo e contínuo em uma área, é adotada a rotação de pastagens. Isso significa que o gado é movido regularmente para diferentes áreas, permitindo que o solo se recupere e as plantas se regenerem. 

A agropecuária regenerativa promove a integração das comunidades locais e a busca por equidade social. Por meio de parcerias entre agricultores e consumidores, busca-se fortalecer a economia local, garantir preços justos, promover a saúde e o bem-estar dos trabalhadores rurais e proporcionar um novo tipo de comércio associado às causas ambientais. 

Essa abordagem é bem diferente da agropecuária convencional que, muitas vezes, utiliza práticas que degradam o solo, como o uso intensivo de agroquímicos, a monocultura e a compactação do solo por meio de maquinários pesados.

O objetivo é integrar a lavoura, a pecuária e as florestas, formando um ciclo. Os bovinos têm uma preferência por locais com sombra, por isso as árvores favorecem o aumento de peso do gado em duzentos gramas por dia. Já a vaca leiteira pode aumentar entre 10% a 20% sua produtividade em relação aos gados que permanecem no sol. 

Sendo assim, a pecuária regenerativa é mais lucrativa, utiliza áreas menores e emite menor quantidade de gases. Ela oferece maiores espaços para o crescimento das florestas, que retiram o gás carbônico do ambiente e o transformam em matéria orgânica.

No Brasil, esse tipo de pecuária foi introduzida com o projeto “Agricultura de Baixo Carbono”, aprovado em 2010 pelo Congresso Nacional. O governo ofereceu subsídios aos agricultores e pecuaristas com o intuito de adaptar suas produções para esse tipo de sistema. Porém, quatorze anos depois, somente 10% dos produtores migraram para tal método.

Carne Zero

É fato que o consumo de carne tem um grande impacto em diversas áreas ambientais. Várias campanhas, como a “Segundas Sem Carne”, surgiram nos anos 2000; a ideia já não é nova, mas a proteína animal continua a ser parte central de milhares de pratos. 

Segundo apurado pelo Instituto Nacional de Estatística, em 2021, cada cidadão consumiu, em média, quase 116 kg de carne. Nos países desenvolvidos, que são os principais responsáveis pela pegada ecológica global, a redução do consumo de carne é altamente necessária. Entre os maiores consumidores de carne do mundo se destacam os Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia.

Por muitos anos, foi disseminada a falsa informação de que para viver em um mundo sem carne era indispensável possuir um grande recurso monetário. Em uma entrevista à Jornalismo Júnior, a vegana Suelem Martins afirmou que as “empresas mundialmente conhecidas notaram que o veganismo atingiu pessoas de todas as classes sociais. Desse modo, quando as empresas investiram nesse novo mundo, outros mercados tentaram concorrer em questão de qualidade e preço. Em vista disso, atualmente as opções são inúmeras e as possibilidades tornaram-se cada vez maiores.”

Algumas organizações, como a Associação Vegetariana Portuguesa, sugerem formas de garantir uma alimentação saudável e econômica. Para adotar um regime alimentar isento de ingredientes de origem animal, que seja nutricionalmente equilibrado, sustentável e econômico, os consumidores precisam fazer escolhas alimentares adequadas, decidindo com sabedoria o que comprar no supermercado e, consequentemente, optando por refeições com combinações alimentares saudáveis e de baixo custo. 

Uma das principais sugestões é encontrar pessoas que seguem esse tipo de alimentação, seja entre colegas de trabalho ou grupos de amigos. Também é possível pesquisar nas redes sociais e encontrar usuários que optam diariamente por cardápios mais verdes e conscientes.

1 comentário em “O fim das florestas: o agronegócio exploratório”

  1. Brune Nepomuceno

    Matéria interessante e necessária. O ensino médio poderia usar os universitários e seus trabalhos de desenvolvimento para dar conteúdo. Pois é um excelente conteúdo de estudo, parabéns!

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