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O Funk é o novo K-pop?

Como o subsídio cultural ajudou a Coréia do Sul a enriquecer, tornar-se influente, e pode ser inspiração para o Brasil

O K-pop é um gênero musical pós-moderno que agrega elementos da cultura tradicional coreana com o pop ocidental. Criado no início dos anos 1990, foi internacionalizado depois de receber investimentos da Coreia do Sul para mitigar a recessão econômica asiática de 1997. Atualmente, garante bilhões para os cofres do país e alcançou tamanho poder diplomático que a banda BTS discursou na ONU. Mas como essa nação conseguiu dominar as playlists mundiais e, mais do que isso, expandir sua influência para fora do mundo da música? Qual a importância econômica da cultura? E de que forma o Brasil poderia se inspirar e lucrar através de um dos seus próprios gêneros musicais tradicionais, o Funk? 

Cultura, K-pop e Economia

A importância da cultura é frequentemente atrelada ao auxílio na formação do pensamento crítico daquele que entra em contato com determinada obra. No entanto, ela estende-se por diversas áreas, inclusive a econômica. Isso é explicado pelo coordenador do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), Alexandre Uehara:

“Investimento em cultura implica em dar repertório de reflexões, estímulos a pensamentos e à criatividade. Elementos fundamentais em um mundo em que a inovação é crucial para novos avanços. Como esperar progresso, competitividade, desenvolvimento de conhecimento e novas tecnologias se não houver estímulos à reflexão?”. 

O pesquisador completa dizendo que os produtos culturais geram ganhos financeiros diretos e indiretos — como a venda de música e a atração de turistas ao país. Na Coreia do Sul, por exemplo, o incentivo à cultura criou novos empregos e aumentou as exportações do país, enfraquecendo os efeitos da crise econômica de 1997. Além disso, conseguiu triplicar o turismo na última década — momento em que o K-pop avançava para outros países — e, segundo o Instituto Hyundai, 1 a cada 13 visitantes do país vai ao local por conta do BTS. 

Ou seja, o direcionamento de dinheiro para esse setor não é uma aplicação sem retorno. A Coreia do Sul pôde colher resultados financeiros desses investimentos:  segundo dados fornecidos pelo jornal O Globo, o BTS sozinho gera mais de 3,6 bilhões por ano ao país. 

Stephany Maldonado, fã do BTS, descobriu o estilo por meio da recomendação de amigos e relata que possui uma infinidade de objetos com o tema da banda: colares, camisetas e capinhas para celular são apenas alguns dos itens da sua coleção. A estudante afirma que a apreciação pelas músicas a leva a consumir outros produtos lá produzidos, como doramas.

Uehara explica que o incentivo à cultura gerou prestígio, consequentemente, para outras áreas, como a culinária e a tecnologia do país. Pode-se usar como exemplo a K-beauty — indústria de beleza da Coreia do Sul. Isso ocorre, segundo o pesquisador, porque há um estímulo a investimentos internos no país, o que cria produtos, aumenta a atratividade e gera novos negócios. 

E o Funk?

O Funk vem se estabelecendo no mercado externo como potência mundial. Segundo levantamento do Spotify, ele cresceu 3.421% de 2016 a 2018.

O gênero bate recordes também no mercado interno e gera nomes como Anitta, a qual foi a primeira cantora brasileira a fazer performance no MTV VMA e é dona de grandes números na atualidade — seja de visualizações, hits, ou fãs conquistados.

 

A cantora de Funk Anitta está centralizada. Ela é uma mulher branca, de cabelos ondulados castanhos jogados para trás. Está utilizando uma roupa preta, óculos de sol e unhas longas vermelhas, além de maquiagem verde nos olhos. Ao fundo, embalagens de cosméticos, como em uma farmácia. Em suas mãos, segura embalagens amarelas de remédios e utiliza um acessório cinza em formado de esqueleto.
A cantora Anitta coleciona mais de 19 milhões de ouvintes mensais apenas na plataforma Spotify. [Imagem: Reprodução/Twitter/@anitta]

Porém, se, por um lado, o investimento no Funk brasileiro se apresenta como vantajoso para o país, uma vez que as duas maiores produtoras do gênero faturam, juntas, mais de 100 milhões de reais anualmente, segundo dados da UOL; por outro lado, ainda há o estigma que esmaga as músicas, tidas como um atentado aos valores da família tradicional pelos setores mais conservadores do país.

O Estado brasileiro tem uma longa história com as obras culturais brasileiras oriundas de populações marginalizadas: o Samba e a capoeira, por exemplo, já foram proibidos no Brasil. Em 2017, houve uma tentativa de criminalização do Funk, a qual não obteve sucesso no Senado.

Assim, o que poderia gerar um enorme faturamento por conta do grande mercado consumidor brasileiro e estrangeiro, acaba se estagnando.

Alexandre Uehara relata que “o investimento em cultura é essencial para qualquer país que queira se desenvolver tanto econômica, quanto socialmente, pois a apreciação, a valorização e a produção cultural acompanham os investimentos na educação”. 

O Centro Cultural da Coreia do Sul ainda destaca que o “investimento cultural permite a criação de  diálogos e empatia entre países e etnias diferentes”. Isso porque esse incentivo resultará na exportação do produto, o que fará com que pessoas de nações distintas o consumam, gerando os fatores benéficos citados. Para o Brasil, seria uma possibilidade de “conversar com mais países”.

 

Soft Power, Coreia do Sul e Brasil

 

Na imagem, os integrantes da banda BTS estão caminhando em ternos pretos idênticos, em frente à outros homens também de terno preto. Na frente do grupo, caminha um homem de terno e gravata azul. Todos usam máscaras contra a COVID-19. No fundo, há um painel com símbolos escritos. O chão é coberto por um tapete vermelho.
O discurso da banda sul-coreana mais famosa representa o Soft Power conquistado pelo país. [Imagem: Reprodução/Twitter/@WFVOTING]

O Soft Power é o poder de influência que um país possui sobre outro sem que seja necessário o uso de qualquer tipo de força militar. Isso porque é motivado pela cultura do influenciador. 

Segundo Uehara, o investimento em cultura fortalece o campo diplomático. Quando pessoas de diferentes nacionalidades tornam-se fãs dos produtos culturais sul-coreanos, também se simpatizam pela Coreia do Sul. Um exemplo prático que mostra a simpatia pelo país — e que pode levar, em grandes proporções à existência de Soft Power — é quando uma pessoa assiste a um K-drama, programa televisivo da Coreia do Sul, e busca aprender a falar coreano.

Mas, por que as pessoas gostam tanto dessa cultura? O Centro Cultural Coreano do Brasil afirma que a cultura sul-coreana se diferencia por mostrar características contemporâneas, utilizando tecnologias avançadas na área e, também, apresentar riquíssimos elementos tradicionais de uma história de cinco mil anos. Uma combinação ideal de modernidade e tradição, fazendo com que ela se destaque  em uma escala mundial.

Pensando no Brasil, o pesquisador diz que o país possui um Soft Power interessante relacionado ao futebol e à música. Mas afirma que não há valorização desses elementos, uma vez que há falta de ações a fim de destacá-los positivamente e, paralelamente, há, também, uma maior repercussão aos fatores negativos, como a corrupção, “jeitinho brasileiro” e violência.

Uehara relata que o resultado dessa imagem é a perda de atratividade. “As empresas ficam desestimuladas de investirem aqui”. Completa explicando que os recursos que poderiam gerar empregos aos brasileiros também são reduzidos. 

Ainda diz que, para quebrar esse ciclo vicioso é necessário pensar no longo prazo, sendo que o planejamento e boas decisões políticas são necessários, o que requer desenvolver a percepção, inclusive entre os gestores públicos, de que é importante investir em cultura para o crescimento do país. 

Ele termina afirmando que não é possível saber se o Funk traria resultados parecidos com os do K-pop, uma vez que as experiências de cada país tem suas similaridades. Mas indica que o ritmo brasileiro pode ser encarado de forma estratégica e dessa forma, apresentaria semelhanças com o ritmo sul-coreano.

 

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