Nesta quarta-feira (21), o Senado Federal aprovou Cristiano Zanin Martins para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), após sabatina na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). O resultado da votação no plenário foi de 58 votos favoráveis e 18 contrários à indicação do presidente Lula.
Em maio, Ricardo Lewandowski completou 75 anos e, por atingir a idade de aposentadoria compulsória, foi afastado do cargo de ministro. Para Zanin ser aceito como sucessor, entretanto, foi realizada uma série de trâmites.
As exigências para a indicação de um ministro
Rubens Glezer, professor de Direito pela FGV e coordenador do centro de pesquisa sobre STF “Supremo em Pauta”, da mesma faculdade, explica o processo necessário para atingir a Suprema Corte.
“Primeiramente, o Presidente da República indica alguém ao cargo de ministro do STF e a indicação é encaminhada à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal”, esclarece Glezer. A CCJ, por sua vez, analisará se o indicado está apto para ocupar o cargo, por meio de uma sabatina na qual o sujeito é questionado sobre temas jurídicos, políticos e até pessoais.
Quanto aos pré-requisitos, há apenas quatro definidos pela Constituição: ser brasileiro nato e ter entre 35 e 70 anos, notório saber jurídico e reputação ilibada. “Depois da sabatina, ocorre uma votação no plenário do Senado Federal, na qual a maioria dos senadores precisa aprovar o nome. Assim, o indicado poderá assumir o cargo de ministro do STF”, conclui o professor.
Quem é o indicado de Lula?
Nascido em uma família de classe média do interior de São Paulo, o advogado Cristiano Zanin Martins tem 47 anos e é especialista em direito civil e processual. Com sua mulher, a também advogada Valeska Martins, fundou a empresa de advocacia Zanin Martins Advogados, escritório responsável pela defesa de Lula durante a Operação Lava Jato.
A defesa de Zanin foi uma das peças centrais para a anulação do processo contra o atual presidente. O advogado estabeleceu sua defesa apostando na inconsistência das provas, nas conduções coercitivas apresentadas pela acusação e na parcialidade por parte do juiz da operação, Sérgio Moro — que posteriormente assumiu por um ano e quatro meses o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro, opositor eleitoral de Luiz Inácio. Assim, manteve uma abordagem jurídica técnica, fugindo de uma defesa de cunho político e aconselhando Lula a fazer o mesmo.
Fábio Costa Morais de Sá e Silva, PhD em Direito e pesquisador sobre a Lava Jato, comentou sobre a operação em entrevista à Jornalismo Júnior. Segundo ele, “a defesa de Zanin foi favorecida com a ida de Moro ao Ministério de Bolsonaro e pela entrada de Dallagnol na política”. Tais fatores auxiliaram a desmoralização da operação e o êxito na defesa de Lula.
Outra estratégia decisiva de Zanin foi obter apoio internacional ao enviar uma queixa ao Comitê dos Direitos Humanos da ONU, denunciando que o acusado, seu cliente, estava sendo vítima de perseguição política por meio de um julgamento parcial. Tal ação obteve sucesso, o que obrigou o Estado brasileiro à uma reavaliação do caso.
A sabatina de Zanin
Frente ao “embate” travado entre Zanin e Moro, havia grande expectativa a respeito da sabatina. O jurista Sérgio Moro (União Brasil-PR), agora como senador, poderia avaliar Zanin ao cargo de ministro. A arguição durou quase oito horas e o jurista, que estava entre os parlamentares da oposição, foi o que mais fez perguntas ao indicado — seis delas apenas sobre a Operação Lava Jato.
Sérgio Moro, reconhecido pela sua atuação na Operação Lava-Jato [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]
De início, Zanin esclareceu-se a respeito de sua proximidade com o atual presidente, origem de grande desconfiança entre os senadores, e garantiu que, apesar de antigas relações profissionais com Lula, ele acredita ter sido indicado pelo reconhecimento do seu trabalho jurídico. Ele afirmou que se manteria “guiado exclusivamente pela Constituição e pelas leis, sem qualquer tipo de subordinação a quem quer que seja, sendo a questão da imparcialidade, para mim, fundamental para a estrutura da Justiça”.
Quando contestado a respeito de assuntos polêmicos, como aborto e descriminalização de drogas, o advogado procurou defender-se de maneira que agradasse tanto aos conservadores quanto aos mais progressistas: posicionou-se contra a legalização do aborto até as primeiras 12 semanas de gestação e utilizou um discurso combativo às drogas. Já em relação ao Marco Temporal, Zanin manteve-se neutro, afirmando que apesar de ainda estar sob discussão, a Constituição prevê o direito à propriedade aos povos originários e que o julgamento deve considerar tais valores.
Zanin e senadora Soraya Thronicke (União Brasil Brasil-MS), da ala conservadora, cumprimentam-se ao lado do do presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP) [Imagem: Geraldo Magela/Agência Senado/Flickr]
Por fim, durante a sabatina, Zanin destacou sua defesa à democracia e mostrou-se disposto a garantir que os direitos da população e a liberdade de expressão fossem plenamente garantidos e seguidos enquanto fosse ministro do Supremo.
Ações futuras
O nome de Zanin foi aprovado na CCJ do Senado por 21 votos a favor e somente cinco contra. Logo em seguida, o indicado passou por votação no plenário, em que recebeu a quantidade de votos favoráveis prevista por apurações realizadas na última semana. A posse do novo ministro está marcada para o dia 3 de agosto.
De acordo com Glezer, ainda é cedo para traçar possíveis mudanças no cenário do Poder Judiciário. “Até agora não obtivemos esclarecimentos de como Zanin pensa questões jurídicas difíceis, quais casos irá enfrentar, ou a sua função dentro do Supremo.” Para o pesquisador, a tendência progressista do advogado não é informação suficiente para determinar como a substituição do ministro Ricardo Lewandowski impactará a Suprema Corte.
*Imagem de capa: Rovena Rosa/Agência Brasil