Jornalismo Júnior

Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Os inquietos caminhos de Dylan

Após oito anos de espera, o cantor e compositor Bob Dylan volta à cena musical com dez canções inéditas em Rough and Rowdy Ways, o 39º álbum de sua carreira, lançado no último dia 19. O título é uma referência à canção My Rough and Rowdy Ways, de Jimmie Rodgers, lançada nos anos 1920 e …

Os inquietos caminhos de Dylan Leia mais »

Após oito anos de espera, o cantor e compositor Bob Dylan volta à cena musical com dez canções inéditas em Rough and Rowdy Ways, o 39º álbum de sua carreira, lançado no último dia 19. O título é uma referência à canção My Rough and Rowdy Ways, de Jimmie Rodgers, lançada nos anos 1920 e que fala sobre a impossibilidade de “sossegar” (do inglês, “settle down”).

De fato, Dylan se mostra longe de sossegar em seu novo álbum. O material reflete a maturidade de quem já tem muita bagagem, mas continua a abranger inúmeros significados em cada canção. Aos 79 anos, ele fala sobre história, religiosidade, cansaço, amor e morte, de forma serena e melancólica.

O álbum começa com a faixa I Contain Multitudes, uma ode às múltiplas facetas e à mortalidade do ser humano. O ritmo lento e os longos espaços entre as falas conferem à canção um ar reflexivo de quem aceita as contradições que nos fazem singulares e o fato de que “as flores estão morrendo, como tudo morre”. 

Bob Dylan tocando guitarra em show recente. [Imagem: Fred Tanneau/AFP — Getty Images]
Rough and Rowdy Ways é um território complexo de reflexões sobre a vida e a morte. [Imagem: Fred Tanneau/AFP — Getty Images]
O álbum segue com uma atmosfera envolvente e um tanto mística nas faixas False Prophet e My Own Version of You. Nesta última, a narrativa se aproxima da morbidez, embora a melodia desperte a sensação de suspense divertido: o eu lírico brinca de deus ou do criador de Frankenstein, montando uma pessoa que é um aglomerado de referências.

I’ve Made Up My Mind to Give Myself to You tem um estilo parecido com as origens do rock’n’roll. A música retoma o clima mais leve e fala da entrega (talvez ao amor) como forma de superar a solidão quando já se viu muito do mundo. O tema de já ter trilhado um longo caminho também é a base de Black Rider, mas nesta canção não há inocência: o cavaleiro negro do título é uma figura que perturba a paz de quem tenta se reconciliar com as próprias experiências. 

Dylan não poupa referências à religiosidade e à mitologia nas faixas Goodbye Jimmy Reed e Mother of Muses. Na primeira, predomina o tom de alegre despedida, com um blues mais clássico e solos de gaita em homenagem ao cantor Jimmy Reed, morto em 1976. Já na segunda, o cantor nos lembra que viver também resulta em certo cansaço e que às vezes precisamos de uma canção de ninar a respeito da natureza e dos heróis, fictícios ou reais. 

Bob Dylan olhando para sua guitarra enquanto troca o acorde em apresentação ao vivo. [Imagem: Kevin Winter/Getty Images]
Com canções cheias de referências culturais, novo álbum de Bob Dylan foi aclamado pela crítica. [Imagem: Kevin Winter/Getty Images]
Os turbulentos caminhos retratados no álbum passam ainda pela Itália, na faixa Crossing the Rubicon, e pela Flórida, no country Key West. É difícil não encarar a travessia das águas vermelhas do rio Rubicão como uma aceitação da morte, ou o tributo à  cidade Key West como uma viagem nostálgica pelas lembranças de uma vida. No seu fim, aguarda uma “terra encantada”, de inocência, pureza e imortalidade. 

A última faixa, Murder Most Foul, começa com uma reflexão sobre a morte de John F. Kennedy, ex-presidente estadunidense assassinado em 1963. Mas a canção vai muito além desse fato histórico. Arranjos de piano, violino e bateria conduzem o ouvinte pelo universo da cultura dos anos 60. A faixa tem uma duração de quase 17 minutos e aparece em muitos serviços de streaming como um “CD 02”, separada das nove faixas iniciais. 

Ao longo de todo o álbum, o cantor se mantém fiel às impressões que o levaram ao folk, no início da carreira. Em entrevista concedida ao editor Cameron Crowe na época de lançamento de seu álbum Biograph (1985), o cantor teria dito que no folk as canções continham mais tristeza, fé no sobrenatural e sentimentos profundos. Esses mesmos sentimentos podem ser percebidos nas letras e melodias de Rough and Rowdy Ways, dessa vez com o olhar experiente de quem contempla toda uma vida e o mundo inteiro. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima