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Pegada hídrica: o gasto invisível que deixamos para trás

Consumo, escassez de água e políticas públicas se relacionam a partir do conceito de “pegada hídrica”, que auxilia a tomada de decisões sustentáveis

Já parou para pensar em quanta água foi necessária para que uma porção de arroz chegasse à sua mesa? Ou para que sua blusa preferida fosse produzida? É possível quantificar esse gasto, e a medida usada para isso se chama pegada hídrica. O conceito pode parecer complexo à primeira vista, mas ele é simples e bem mais presente no cotidiano do que você imagina.

A água que consumimos não se resume à quantidade que utilizamos em banhos ou lavagens de roupas, por exemplo. O conceito de pegada hídrica parte do pressuposto de que todo processo produtivo depende da utilização de água, então esse gasto está embutido em todos os bens de consumo.

Apresentado em 2003 pelo pesquisador holandês Arjen Hoekstra, o conceito de pegada hídrica define quanta água é usada na produção de um quilo de um produto específico e pode usar como referência os padrões de consumo de uma pessoa ou uma cidade, por exemplo. É um conceito importante porque também pode ser utilizado como suporte a indicadores de eficiência e escassez hídrica.

Oleksandr Mialyk, pesquisador de escassez hídrica e agrária na Universidade de Twente (Holanda), relaciona o conhecimento de pegada hídrica à reeducação do consumo populacional. Em entrevista ao Laboratório, em nome da Water Footprint Network, ele afirma: “Uma vez que você sabe a quantidade de água usada na produção de algodão (dez mil litros por quilo), você pode reconsiderar comprar uma dúzia de camisetas baratas só por querer uma de cada cor. O mesmo é válido para comidas, especialmente para a carne – cuja produção de um quilo gasta 15,5 mil litros de água”.

Bruna Soldera, doutora em geociências e meio ambiente pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e colaboradora do Instituto Água Sustentável, explica que a pegada hídrica analisa o gasto de água a partir de  três categorias:

  • Água azul: refere-se à água (superficial ou subterrânea) utilizada em um processo produtivo;
  • Água verde: é aquela que está armazenada no solo, disponível para o abastecimento de aquíferos e para a irrigação de plantas. É usada no cálculo da pegada hídrica de atividades agrícolas;
  • Água cinza: trata-se do volume de água doce necessário para a diluição de poluentes depositados em corpos hídricos até que sua concentração seja reduzida aos padrões permitidos pela legislação ambiental, assegurando a qualidade da água.
Água de uma garrafa sendo despejada em um copo
Conceito de “pegada hídrica” pode ajudar a formular políticas públicas e orientar decisões da população [Imagem: Pixabay]

Políticas públicas, conscientização individual e pegada hídrica

Segundo Soldera, é importante que a população esteja envolvida no debate de preservação da água e busque diminuir os impactos dos seus hábitos de consumo. “É preciso construir ciência em parceria com toda a sociedade, e a pegada hídrica é uma ferramenta para isso, uma vez que favorece a criação de políticas públicas que priorizem uma produção que utilize menos água”, afirma.

Hoekstra, criador do conceito, também defendia que a pegada hídrica fosse um ponto de atenção de governos, empresas e consumidores. Nessa divisão, seria papel dos governos legislar a favor do uso eficiente da água, enquanto as empresas deveriam otimizar o consumo hídrico, não poluir corpos d’água e divulgar seus dados de pegada hídrica. Por fim, caberia à população se preocupar com a origem dos produtos que consome e fazer escolhas mais sustentáveis.

De acordo com o Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento, o brasileiro tem uma pegada hídrica diária de 154 litros. Isso significa que o Brasil gasta cerca de 44 litros a mais do que o recomendado pela Organização das Nações Unidas (ONU) – 110 litros. 

Para além da estimativa, é possível também calcular a sua própria pegada hídrica por meio do site Water Footprint Calculator (em inglês), que disponibiliza uma calculadora online aos usuários. Para isso, você deve indicar seus hábitos de consumo referentes ao período de um ano.

Ainda assim, a conscientização individual não é suficiente para a preservação das fontes de água doce: é necessária a implementação de políticas públicas que incentivem o uso sustentável de água. Para Mialyk, isso pode ser feito por meio da utilização de técnicas de irrigação mais eficientes na agricultura, da punição de indústrias pela poluição de reservas naturais de água e da definição de limites para o uso de corpos hídricos, entre outras medidas.

“A escassez de água deve se tornar um problema cada vez mais grave conforme os impactos de mudanças climáticas se tornam mais proeminentes. Os países deveriam adotar políticas de uso sustentável da água assim como vêm tentando investir em fontes de energia alternativas”, indica.

Além disso, embora a pegada hídrica seja um indicador ambiental importante, não é o único a ser levado em consideração. Segundo Mialyk, muitas vezes pegadas hídricas pequenas são acompanhadas de grandes pegadas de carbono, por exemplo, então tais métricas devem ser analisadas em conjunto.

 

Água no comércio internacional

Outra perspectiva que pode ser pensada a partir dos dados de pegada hídrica é a água virtual embutida em exportações. Segundo a Water Footprint Network, esse conceito foi criado para analisar como países com escassez de água seriam capazes de prover bens de pegada hídrica significativa a seus habitantes. Foi concluído que o comércio internacional permite a esses países a utilização indireta de recursos hídricos das nações exportadoras, de forma que a pegada hídrica dos produtos importados os acompanham na forma de “água virtual”.

Apesar disso, Mialyk explica que não é possível dizer que países subdesenvolvidos são sempre prejudicados nessa transação: “Muitas regiões de economia agrária ‘perdem’ água através de exportações. Se tais regiões têm baixa disponibilidade de água, elas podem enfrentar escassez.” 

Mapa: Número de meses de escassez hídrica por região. [Imagem: Reprodução/ Science Advances]
“Olhando para o mapa [acima], é possível ver que a escassez de água [representada em vermelho] não é encontrada apenas em países subdesenvolvidos (como Argentina e Índia), mas também em desenvolvidos (como Estados Unidos e Austrália)”, indica o pesquisador. “Então, o que podemos dizer é que países de baixo desenvolvimento econômico e baixa disponibilidade de água são mais propensos – mas não os únicos – a sofrer com a escassez hídrica”.

A pegada hídrica é uma importante ferramenta para a educação da população sobre o uso consciente da água. No site oficial da Water Footprint Network, é possível encontrar estudos e estatísticas relacionados à água virtual no comércio internacional, às pegadas hídricas de diferentes países e produtos, além de materiais multimídia e voltados a educadores.

1 comentário em “Pegada hídrica: o gasto invisível que deixamos para trás”

  1. Danilo de Oliveira Aleixo

    Boa noite!

    Primeiro de tudo gostaria de parabenizar pela excelente matéria e acreditamos que o conhecimento de ponta deve ser sempre disseminado como forma de contribuição.

    Me chamo Danilo de Oliveira Aleixo, estudioso nas áreas de Pegada Hídrica, Água Virtual, Pegada Ecológica, Pegada de Carbono, Meio Ambiente e Sustentabilidade. Publicamos em 2016 o artigo: “Pegada hídrica e Comércio Virtual de Água no Brasil em parceria com Arjey Hoekstra, disponível em (research.utwenty.nl). Lançamos recentemente dois livros sob temática: “Índice de Pegadas Ambientais Integradas IPAI: Modelo e Validação e a versão em inglês: “Integrated Environmental Footprint Index IPAI, ambos pela Paco Editorial.

    Estamos a disposição!

    Dr. Danilo de Oliveira Aleixo

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