O muro branco, muitas vezes velho e mal cuidado, agora ganha cor. A porta da lanchonete, a fachada lateral do prédio, embaixo do metrô, as galerias de esgoto — O graffiti ocupa os espaços da cidade. Dividindo opiniões que variam entre as mais duras críticas até a mais sincera admiração, essa arte, descriminalizada na capital desde 2011, ganha seu espaço de forma notável. São Paulo está ficando mais colorida e o cidadão começa a refletir sobre o que tantas obras, presentes em seu cotidiano, estão tentando lhe dizer.
“Todos esses que hoje são famosos pelo graffiti, começaram no pixo”, diz um ex-pixador, anonimamente, em uma conversa informal no metrô paulistano. É impossível citar o popular graf sem cair na comparação com a pixação, o polêmico tema envolve debates e até hoje não encontrou uma solução plausível que possa explicar minuciosamente essa diferença. O que podemos concluir é que o graffiti está longe de ser igual ao pixo, mas dizer que não existe uma forte relação entre os dois é mentira. A discussão é complicada.
Nascido em um movimento de contracultura parisiense no ano de 1968, o graffito, do italiano, tem como significado: inscrição ou desenho de épocas antigas, toscamente riscado à ponta ou a carvão, em rochas, paredes e vasos. Hoje em dia, a ponta e o carvão abrem espaço paras latas de tinta. O tosco ficou no passado, a parede continua como a “tela” favorita dos artistas, mas muitos começam a apostar no indoor e em outros locais totalmente inovadores, como por exemplo um avião — trabalho dos Gêmeos em homenagem a seleção brasileira, durante a Copa do Mundo de 2014.
O Preconceito
O preconceito existe. O grafiteiro é, parte das vezes, taxado de maloqueiro e vândalo. Mesmo com a lei criada para proteger os artistas, o pensamento de uma porcentagem da sociedade é de que aquela manifestação, na verdade, é a depredação de um patrimônio que acaba “enfeiando” a capital.
Ronaldo Souza, conhecido como IMAGE, surge para quebrar tais paradigmas. Trabalhando de segunda a sexta-feira em um escritório, IMAGE só pinta aos fins de semana e feriados, para ele o graffiti é uma válvula de escape. Sua motivação? Deixar a cidade mais bonita e às vezes receber um simples elogio.
Nada obstante, a implicância existe também dentro do meio artístico. Gabriela Berckenhagen, grafiteira, comenta sobre isso — Não é um preconceito tão explícito, ninguém nunca me falou algo do gênero diretamente, mas se você chega num “rolê” para grafitar, sendo um homem, não vão te olhar e pensar: “Nossa, que modinha, que zuado, está fazendo só pra chamar atenção”. Sendo uma menina, muita gente olha e simplesmente começa a te julgar, sem saber nada sobre quem você é. Querendo ou não, nós sempre ficamos meio acanhadas por saber que esse pensamento ronda a cabeça de alguns.
Diferentes espaços
Com o perceptível crescimento na última década, o graffiti vai conquistando novos locais. Dentro das metrópoles, os adeptos a arte começam a ceder cada vez mais as paredes de casas e empresas aos pintores.
Além disso, obtendo status de artista plástico, famosos grafiteiros “pulam” os muros, começando a trabalhar dentro das residências, transferindo seu estilo às telas e expondo suas obras em galerias de arte. O valor financeiro passa a ficar maior, os artistas conquistam seu público, muitos seguidores nas redes sociais e admiradores em todo mundo.
São Paulo também pode ter a honra de dizer que é a primeira cidade do planeta a possuir um Museu Aberto de Arte Urbana (MAAU-SP). Abaixo do trecho elevado entre as estações de metrô Portuguesa-Tietê e Santana, temos 66 painéis de graffiti instalados. Foram dez dias de trabalho e a presença de 58 artistas. Um presente à Zona Norte, considerada berço do movimento na década de 80.
Diferentes estilos
Nenhum graffiti é igual ao outro, cada artista tem seu próprio jeito de manifestar, o que acaba criando um estilo particular , independente da fama do autor. Evidentemente, passeando por São Paulo, podemos identificar obras daqueles mais conhecidos: como as linhas e círculos azuis do Zezão ou os índios do Crânio, mas isso não impede que artistas menos conhecidos tenham suas particularidades.
Toda arte, principalmente o graf, vivendo em direto contato com a sociedade, têm um motivo para ser construída. Eu busco sempre passar alguma mensagem, mesmo que seja escondida. Procuro colocar algo que a pessoa possa olhar e refletir – diz Gabriela Berckenhagen – quem estiver disposto a prestar atenção no recado, ele vai estar lá.
IMAGE, quando questionado sobre seu modo de grafitar, completa: Faço o estilo personagem, gosto mais de linhas retas e chapadas, o popular “cartoon”. No entanto, o que importa é que seja feito com amor e respeito, conversamos diretamente com o público, então temos que fazer protestos inteligentes ou simplesmente expressar nossa opinião. Essa é a herança que tem que ficar para a próxima geração de grafiteiros!
Por Rafael Castino
rafacastino12@gmail.com