Muito além de um conjunto de regras para uma competição, o esporte pode ser entendido como prática metódica de exercícios físicos visando ao condicionamento do corpo e da saúde. É nesse contexto de busca por saúde que o yoga se insere, trazendo benefícios para a pessoa como um todo.
A prática milenar tem origem na região da atual Índia e envolve corpo, mente, e a alma para alguns. A palavra vem da raiz sânscrita yuj e significa “união”. Há um amplo espectro do que pode ser considerado yoga, desde uma matriz mais devocional ou religiosa até uma forma puramente de atividade fitness. Inúmeros estudos mostram que a prática de yoga traz grandes benefícios físicos e mentais. O foco da matéria é no aspecto físico, mas o yoga traz consigo uma filosofia tão rica que fica impossível uma dissociação completa.
Lucilene Melhado Isler, conhecida pelos alunos como Chanchal, é professora de Hatha Yoga Contemporânea (certificada pela Aliança do Yoga) e fala um pouco sobre os princípios e a prática. Há muito mais do que só meditação ou só exercício físico: “Na hora de experimentar o que é yoga, muitas pessoas se surpreendem. Tem pessoas que acham que é só meditativo, suave e no final da aula dizem ‘nossa! teve muito mais físico do que eu imaginava’”.
Segundo o Yoga Sutra de Patañjali, os oito braços do yoga (princípios da prática) são:
- Yamas – condutas éticas para viver em sociedade;
- Niyamas – condutas diárias que devemos ter com o nosso próprio ser;
- Asanas – são as famosas posturas, que devem ser realizadas com consciência corporal e estado de presença;
- Pranayamas – exercícios respiratórios visando a expansão e “administração” do prana (energia vital);
- Pratyahara – recolhimento e abstração dos sentidos;
- Dharana – concentração/foco;
- Dhyana: meditação;
- Samadhi – Auto realização, paz, plena consciência, estar completo, iluminação. Em teoria, é o motivo de se praticar yoga.
Chanchal explica que os oito princípios estão interconectados, e o yoga, de uma forma ou de outra, trabalha todos ou a maioria deles. “Porque através da postura eu vou ganhando equilíbrio, eu vou ganhando foco. E isso eu levo para fora do meu tapetinho. E aí, tendo mais foco na minha vida, a meditação pode acontecer”.
Há diferentes modalidades de yoga e de variações dentro de cada gênero.
Alguns desses gêneros são:
- Hatha – o “clássico” do yoga, com movimentos suaves e maior tempo de permanência nas posturas.
- Ashtanga – um estilo com seis séries fixas de posturas, com um movimento dinâmico e metódico das mesmas poses na mesma ordem.
- Vinyasa – Tem a movimentação do Ashtanga e a suavidade do Hatha, com sequências não fixas, mas rítmicas (lembrando até uma dança).
Esses são os mais tradicionais, mas há também os mais fitness, como o hot yoga (praticado dentro de uma sala aquecida) e o bhakti yoga (um estilo mais devocional e quase religioso).
Chanchal conta que não existe um jeito correto de começar, ou uma modalidade mais apropriada. O importante é a percepção dos seus limites e a comunicação com o professor. “É uma responsabilidade compartilhada, na qual, se o aluno me comunica alguma dor, alguma questão, posso tentar olhar para aquilo, auxiliar, dar uma variação específica para ele”. Além disso, pessoas diferentes buscam práticas diferentes. “Se a pessoa não tem uma busca espiritual, ela pode optar pelo físico e está tudo bem. Ela não precisa chegar na iluminação. Cada um tem a sua necessidade e a sua fase. Não existe muito certo e errado. Há o que eu estou buscando nesse momento”.
A própria Chanchal começou no ramo do hot yoga, e só depois fez formação em Hatha Yoga Contemporâneo. Ela tem outras especializações e, atualmente, está se especializando em yoga para gestantes. “Não sou fiel a uma linha, uma corrente específica. Eu sou fiel à possibilidade de se abrir pros diferentes sabores dentro do universo do yoga”.
Cada estilo tem uma sequência de aula. O Hatha Yoga Contemporâneo pode ser usado como exemplo, mas não esgota as possibilidades dentro dessa prática. Uma aula, segundo Chanchal, segue a seguinte sequência:
- Respiração – busca trazer presença para o momento
- Apresentação do Tema – um convite do que será trabalhado naquela aula. Um olhar mais amplo onde o corpo vai acompanhar aquele tema.
- Mantra – uma forma de equalizar a frequência de energias (um conceito vindo do Bhakti Yoga).
- Vinyasa de abertura – uma sequência de aquecimento, lubrificando bastante as juntas.
- Core Vinyasa – uma sequência com objetivo de fortalecer o core, o abdômen. É uma forma de preparar para outras poses e de proteger a coluna.
- Namaskara – uma nova sequência de movimentos, mas agora para trazer fluxo, atenção à respiração e presença para a aula.
- Aqui a aula pode seguir dois caminhos distintos – Preparação para uma peak pose (postura que exige uma preparação anterior devido ao nível de dificuldade) ou um pout-pourri de posturas.
- Invertida – uma das posturas que leva a pessoa a ficar de cabeça pra baixo. Pode ser a própria peak pose ou não.
- Restaurativas – alongamento ou torções, para compensar os movimentos anteriores. Variam conforme as posturas realizadas na aula.
- Pranayama – um dos tipos específicos de respiração do yoga, como por exemplo o Nadi Shodhana, ou respiração por narinas alternadas. Isto é, se pressiona o lado de uma das narinas para tampa-la e se respira fundo pela outra. Em seguida inverte-se a narina tampada e se expira. Esse ciclo é repetido por algumas respirações.
- Savasana – a “postura do cadáver”: deitar esticado sobre o tapete de yoga. O nome pode parecer meio mórbido e a postura pode parecer simples, mas é neste momento que segundo Chanchal se recebe os benefícios da prática. Pode ser também um momento de Yoganidra (estado de consciência entre a vigília e o sono, como o estágio de ir dormir, tipicamente induzido por uma meditação guiada).
- Meditação.
Chanchal conta que vários praticantes na Índia acreditam que a sequência inteira é uma preparação para o estado meditativo. Contudo, a professora enxerga a atividade de outra forma: “A própria prática de yoga é uma meditação em movimento. Não tem separação”.
Falando um pouco sobre o aspecto mais devocional do yoga (Bhakti Yoga), Chanchal explica que, apesar de ter a base no hinduísmo, não é focado nos deuses Hindus especificamente. “Não é ‘o’ Ganesha, mas sobre a energia de Ganesha de remoção de obstáculos e de todo o aprendizado na própria figura dele. Isso traz a possibilidade de se conectar com o divino que há dentro de cada um de nós”.
Qualquer um pode praticar yoga, sempre respeitando seus limites e se comunicando com o professor. “É legal também pensar no yoga como uma prevenção e não algo que vá melhorar uma coisa que já está ruim”, Chanchal acrescenta. Não há uma questão de melhor ou pior nas poses, apenas uma concentração com o momento e o movimento. Não há competição, nem consigo mesmo, apenas presença para o corpo. “Por mais que você evolua em uma postura, você vai poder evoluir ainda mais dentro da mesma pose. Essa é uma beleza do yoga: sempre tem como evoluir, assim como na vida”.