Com o aumento da expectativa de vida, doenças relacionadas ao envelhecimento merecem cada vez mais atenção
Por Ana Luiza Tieghi (ana.tieghi@gmail.com)
Segundo o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atualmente existem 23 milhões de idosos no país. Em 2015, serão 64 milhões e, em 2050, um terço da população será idosa. Esse grande aumento é o resultado de fatores como a melhora na qualidade de vida do brasileiro, boa alimentação e maior acesso à saúde. Porém, com o avançar da idade surgem novos problemas.
Geralmente associadas à velhice, as doenças degenerativas surgem aos poucos e não possuem cura. Elas cerceiam os idosos de sua liberdade e comprometem funções importantes do organismo. Uma das formas mais conhecidas são as demências, que possuem diversas variações, sendo o Mal de Alzheimer a mais comum. Essas enfermidades são síndromes que comprometem progressivamente as funções cognitivas dos portadores, afetando a memória, pensamento, comportamento e a habilidade de realizar atividades do dia a dia, como comer, andar e falar. Cada tipo de demência atua de uma forma singular e os sintomas dependem muito do paciente. Eles podem variar de intensidade de pessoa para pessoa e também conforme os estágios da doença.
Os casos de demência vêm aumentando no mundo todo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), aproximadamente 35,6 milhões de pessoas possuem a doença na atualidade. Esse número vai dobrar até 2030 e mais do que triplicar até 2050, quando 115,4 milhões de pessoas deverão possuir algum tipo de demência. Como é uma enfermidade que não depende diretamente de fatores externos, ela atinge todos os países. Mas um dado chama a atenção: em 2050, estima-se que mais de 70% das pessoas com demência estarão vivendo em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Isso está diretamente ligado ao fato de que, como afirma John Beard, diretor do Instituto para Envelhecimento e Planejamento de Futuro da OMS, “em 2050, haverá dois bilhões de pessoas idosas no mundo, e 80% delas viverão em países que atualmente classificamos como emergentes ou em desenvolvimento”.
O tratamento das demências custam, no mundo todo, mais de 604 bilhões de dólares ao ano. Esse é um valor que só tende a aumentar conforme a população doente cresça, e a maior parte dessas despesas caberá aos países mais pobres. O tratamento de casos de demência é muito custoso e prolongado. Como a doença não tem cura, é necessário mantê-lo durante todo o restante da vida do idoso. Além disso, as pessoas que cuidam desses idosos também precisam de acompanhamento médico e psicológico.
Quem cuida também precisa ser cuidado
A grande maioria dos portadores de demência necessita de cuidados o tempo todo, e essa função geralmente cabe a familiares ou pessoas próximas do doente. Como conta o médico geriatra e pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP, Alessandro Campolina, “o stress do cuidador é um diagnóstico que uma vez realizado precisa de uma abordagem específica. O apoio psicológico é fundamental nesses casos.”
Conviver com um portador de demência é um desafio para os cuidadores, que além de lidar com a tarefa de auxiliar o doente – muitas vezes sem aconselhamento de um profissional da saúde – também precisam aprender a gerenciar o impacto emocional que aquela situação provoca. Estar ao lado de alguém próximo que possua demência e esteja perdendo autonomia sobre a própria vida é uma experiência muito dolorosa e que pode sair do controle sem os devidos cuidados, vide as sempre presentes denúncias de maus tratos aos idosos cometidas por familiares ou cuidadores.
O relatório “Demência: uma prioridade de saúde pública”, publicado pela OMS em 2012, afirma que as pessoas que cuidam de portadores de demência estão mais suscetíveis a desenvolver problemas mentais, como ansiedade e depressão. Muitos também sofrem com problemas financeiros, já que os cuidados com o doente geram gastos excessivos e podem impedir a pessoa de trabalhar normalmente. A organização recomenda a existência de cuidadores treinados que possam ajudar os familiares a lidar com o doente. Também destaca que os profissionais de saúde precisam dar mais atenção à demência e ao que é necessário para ajudar o paciente e seus cuidadores a terem uma vida melhor.
Outras doenças associadas à velhice
A terceira idade também é um período onde costumam surgir com mais frequência as chamadas doenças crônicas. Hipertensão arterial, diabetes, doenças cardíacas, câncer e artrites são algumas delas. “O envelhecimento acarreta perdas de funções e capacidades, mas dentro de um nível que não compromete significativamente a independência e a autonomia. O problema é que as doenças crônicas se tornam mais frequentes e se manifestam de modo agregado (várias ao mesmo tempo, o que é chamado de Multimorbidade) com o avanço da idade. São estas doenças que trazem os maiores comprometimentos”, afirma Campolina. Dados do Censo de 2010 mostram que 75,5% dos idosos possuem algum tipo de doença crônica. Elas atingem 69,3% dos homens e 80,2% das mulheres.
Por todas essas razões, é possível perceber como a geriatria é uma área importante da medicina e como será cada vez mais decisiva para a saúde da população. Porém, ao menos por enquanto, ela não é tão valorizada. Para a Sociedade Brasileira de Geriatria, seria ideal que existisse um geriatra para cada mil idosos. No Brasil, temos um para cada cinco mil idosos. “Existe um crescimento do interesse e do reconhecimento da relevância. Mas esta é uma área que ainda necessita de muito mais investimentos e de uma mudança de atitude por parte dos profissionais, da sociedade e dos próprios idosos”, conta o pesquisador.
A maior parte dos diagnósticos de doenças crônicas e degenerativas é realizado quando essas enfermidades já estão em um estágio avançado, quando as possibilidades de tratamento, ou mesmo cura, são menores e mais caras. Investir na formação de profissionais que estejam aptos a detectar essas doenças é importantíssimo, assim como estimular a sua prevenção. Para Campolina, “é fundamental entender que a perspectiva preventiva é eficiente e necessária para a população idosa, não só para os mais jovens. Existe uma necessidade de maior incentivo à geriatria preventiva”.
Prevenir é o melhor remédio
A prevenção das doenças crônicas e degenerativas passa principalmente pelo processo de conscientização da população. “As mudanças dos modos e estilos de vida e a seleção de hábitos saudáveis podem prevenir ou postergar o surgimento destas doenças”, diz o geriatra. Ler, manter a mente ativa, realizar exercícios físicos, buscar sempre aprender coisas novas, tudo isso faz com que o cérebro se movimente e a saúde melhore. São hábitos que devem ser iniciados ainda na fase jovem e mantidos até a terceira idade.
Segundo o médico, “mesmo quando estas doenças já estão instaladas, com um tratamento bem feito e adequado, elas podem ser silenciadas, de modo a prevenir o surgimento da incapacidade e da morte precoce”. Bons hábitos aumentam a qualidade de vida, mesmo se a pessoa já estiver doente. Eles auxiliam o tratamento médico e podem postergar o avanço da enfermidade.
Se as pessoas vão viver cada vez mais, é preciso que a saúde as acompanhe nos anos extras que terão pela frente. Para que isso ocorra, é necessário que a saúde do idoso ganhe atenção, relevância e investimentos.