Por Bernardo Carabolante (bernardocm0411@usp.br)
No filme A Outra Forma (La Otra Forma, 2024), que chega hoje (12) aos cinemas, em momento algum qualquer personagem fala. Dirigido pelo colombiano Diego Felipe Guzman e co-produzido por uma equipe com brasileiros, a animação leva o espectador em uma experiência audiovisual diferente do padrão atual da indústria, com um enfoque em efeitos sonoros e na trilha musical. O longa já acumula 17 vitórias e 3 indicações em prêmios internacionais, como o de melhor animação no Los Angeles Animation Festival e melhor filme no festival Buenos Aires Rojo Sangre.
A história
Em um mundo distópico predominado por formas e seres quadrados, as pessoas buscam chegar a um paraíso construído na Lua. Para se encaixarem geometricamente na embarcação e chegarem ao lugar desejado, devem transformar o próprio corpo no que lembra uma partida de Tetris.
Entretanto, o filme faz questão de nos mostrar a todo custo o quanto o personagem principal, Pedro Prensa (Sergio Borbosa), sofre afinando a própria cabeça para que consiga ir ao paraíso e também se encaixe no padrão da sociedade, são nestes momentos que os efeitos sonoros ganham destaque, como a engrenagem apertando seu rosto, os grunhidos de dor, a insatisfação ao falhar, nos constantes surtos e alucinações.
Outra personagem de destaque é a Cuadrochica (Jessica Herrera), uma das modelos da sociedade quadrada, estando em cartazes por ser perfeita e inspiração, porém ao implicar com uma espinha em seu rosto começa a ter problemas com o próprio corpo, arruinando completamente sua imagem diante de todos que a viam nas propagandas pela cidade.
Carlos Cajuela é um dos pontos chaves da trama, além de ser um dos poucos a não demonstrar esforço para ir ao paraíso, é com ele e seu cachorrinho que a história toma as maiores reviravoltas, além do carisma de ambos personagens, que torna os surtos e momentos de tensão mais envolventes pela conexão criada.
Alguns surtos
Por não apresentar qualquer tipo de fala, às vezes o filme pode confundir o espectador sobre o objetivo da trama e o rumo que ela está seguindo. Porém, em alguns surtos dos personagens se apresentam alguns pontos chave, como os espíritos ou alucinações que deformam e arredondam o cenário. Nestes momentos, o espectador pode interpretar como quiser o significado de cada cena, o que torna o filme ainda mais especial e envolvente.
A cada surto, flashbacks mostram lembranças dos momentos quando tudo começou a ficar quadrado. Nessas conexões, é possível entender o que houve com a sociedade daquele mundo distópico, em que até o mínimo erro pode custar a vida sonhada pelos personagens.
O filme consegue deixar mensagens sobre o mundo real utilizando a sociedade distópica apresentada, abordando temas como a busca pela perfeição e aprovação de todos, a exclusão daqueles que tem defeitos e o susto de todos os personagens em cena frente a qualquer coisa que fuja do padrão.
Mesmo sem diálogos falados no longa todo, a música dá o tom perfeito para todos momentos do filme, de forma que cada som foi colocado para transmitir uma sensação diferente ao espectador. A animação é perfeita em transmitir as emoções de todos personagens em cena e até a bizarrice da sociedade apresentada. Diante de um tema tão utilizado e banalizado – sociedades distópicas –, o longa apresenta uma história inovadora.
Durante os 99 minutos de filme, cada espectador terá uma interpretação diferente da trama e dos significados tratados em tela, nem que seja por detalhes que estão abertos propositalmente. Isso torna uma experiência especial e diferente do que a maioria dos filmes atuais oferecem, com tipos de histórias repetidas, grandes produtoras focadas apenas no comercial, filmes que não inovam em estilo de animação e não se permitem arriscar. Porém, a trama não é fácil de acompanhar devido às diferentes possibilidades de interpretação, e quem perde o foco facilmente – ainda mais em um filme sem falas – pode ter dificuldade em apreciar o conteúdo apresentado.
A Outra Forma, já está em cartaz nos cinemas. Assista o trailer: