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A romantização de homens abusivos no cinema

Os filmes românticos são um gênero extremamente popular, contando com produções grandiosas, variadas e de alta rentabilidade. No geral, são feitos tendo em vista um público alvo feminino, o que já aponta para uma possível discussão sobre gênero. Assim, deve-se pensar sobre o que está sendo oferecido para meninas e mulheres consumirem como entretenimento. Que tipos …

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Os filmes românticos são um gênero extremamente popular, contando com produções grandiosas, variadas e de alta rentabilidade. No geral, são feitos tendo em vista um público alvo feminino, o que já aponta para uma possível discussão sobre gênero. Assim, deve-se pensar sobre o que está sendo oferecido para meninas e mulheres consumirem como entretenimento. Que tipos de comportamentos são tratados como românticos? Que tipo de homens estão sendo exaltados nas telas? Que valores estão sendo perpetuados? Esses questionamentos devem existir, pois não se pode simplesmente aceitar tudo que os filmes românticos mostram como “ideal”. Na maioria das vezes, por conta de todo o contexto e da narrativa que o cinema constrói, o espectador não percebe que muitos dos relacionamentos de grandes filmes de romance têm aspectos tóxicos ou abusivos. 


A
Saga Crepúsculo (2008-2012)

A saga de Edward (Robert Pattinson) e Bella (Kristen Stewart) foi um marco para toda uma geração de adolescentes, moldando a noção de amor e romantismo de muitas garotas. Mas se observadas, as atitudes de Edward no primeiro filme da saga podem ser consideradas perturbadoras. 

Edward salva Bella de um grupo de agressores, mas esse ato heróico acaba nos fazendo esquecer do mais importante: como ele sabia que ela estava lá? A resposta é simples, Edward perseguiu Bella em seu passeio com as amigas durante o dia inteiro. 

Depois, o espectador descobre que ele, por muito tempo, entrou no quarto de Bella sem que ela soubesse, para assistir a ela dormir. Tudo isso é tratado como grandes atos de amor e proteção, mas se analisado profundamente, pode-se dizer que Edward era muito mais um stalker obcecado por Bella do que um protetor. 

São vários os momentos em que Edward revela estar observando a Bella ou ouvindo suas conversas com outras pessoas. Inclusive, no filme Eclipse (The Twilight Saga: Eclipse, 2010), Edward não quer que ela vá à Reserva Quileute exatamente porque não pode seguí-la até lá. Isso não é um comportamento saudável, muito menos romântico, pendendo mais para algo verdadeiramente assustador. 

 

Edward observando Bella. [Imagem: Reprodução/Summit Entertainment]
Edward observando Bella. [Imagem: Reprodução/Summit Entertainment]

Além disso, há também o “detalhe” de que Edward sente a todo momento um desejo de matar a Bella, chegando a dizer isso para ela de forma direta. Claro, não há nada que faça o espectador sentir que há um perigo real ali, Edward não se parece com uma ameaça, nunca demonstra agressividade quando está com a ela, mas ainda assim, é no mínimo bizarro que ele fale “eu quero matar você” e o relacionamento dos dois continuar o mesmo. Entretanto, é possível  atribuir isso mais à temática fantasiosa da saga do que a um comportamento agressivo por parte do protagonista.

Agora, Jacob (Taylor Lautner). O segundo par romântico de Bella também não é muito mais correto do que Edward. Jacob pressiona e questiona Bella por suas escolhas constantemente, insinuando que ele seria o melhor parceiro para ela e que a vida que ele poderia lhe proporcionar seria a ideal. 

A insistência de Jacob chega ao nível que ele a beija contra sua vontade, usando da sua força para segurá-la. Isso não deveria ser romantizado ou aceitável. Beijar alguém contra a sua vontade, segurando, forçando, é um abuso.

Para complementar essa insistência, é possível identificar que Jacob faz chantagem emocional para que Bella o beije, dizendo que se ela não o fizer, ele vai embora para morrer na batalha que está para acontecer. Sendo assim, Jacob não aceita que ela tenha escolhido estar com outra pessoa, além de manipular e desrespeitar o consentimento da garota.

 

Jacob falando com Bella momentos antes de beijá-la a força. Isso mostra características abusivas. [Imagem: Reprodução/SND]
Jacob falando com Bella momentos antes de beijá-la a força. [Imagem: Reprodução/SND]

Como apresentado, ambos os pares românticos de Bella são problemáticos. Apesar de todos os seus atos serem justificados durante os filmes como frutos de um “amor incansável e protetor”, eles são apenas errados e nenhuma garota deveria sonhar em ter homens como eles.


A Barraca do Beijo
(2018)

O filme é uma produção da Netflix voltada para adolescentes que fez muito sucesso em sua época de lançamento e, novamente, na divulgação de sua continuação. Mas se analisado com atenção, o longa não representa um relacionamento bom ou saudável.

O casal protagonista é formado por Elle (Joey King) e Noah (Jacob Elordi), e toda questão começa ainda antes de eles estarem sequer perto de ficarem juntos. 

Por muito tempo, anos até, Noah vinha ameaçando qualquer um que tivesse algum interesse romântico em Elle, afastando-os dela. Por conta disso, ela nunca teve a oportunidade de se interessar por qualquer outro rapaz além do próprio Noah, por quem manteve sentimentos durante anos de forma platônica. 

Noah tinha de fazer isso? Os dois sequer tinham um relacionamento para ele se enciumar dessa forma. Mesmo que tivessem, ainda seria um ato extremo de sua parte, já que ainda seria escolha de Elle dar atenção a esses rapazes ou não. Ele tira o direito dela de decidir sobre com quem vai se relacionar. Mesmo que seja em prol de uma suposta proteção, não era a função ou responsabilidade dele lidar com os rapazes interessados em Elle, era algo que ela poderia fazer por si, mantendo sua liberdade de escolha, mesmo que fosse uma escolha errada.

No fim, além de mantê-la presa à Noah, já que ela não conseguia se aproximar romanticamente de nenhum outro garoto, isso também gerou muita insegurança na protagonista, que se questionava da razão de não gerar interesse em ninguém. Noah diz que fez isso para “protegê-la”: novamente um ato obsessivo sendo justificado como amor e proteção.

 

Ao ver certas cenas, não lembramos do quão tóxico Noah é. [Imagem: Marcos Cruz/Netflix]
Ao ver certas cenas, não lembramos do quão tóxico Noah é. [Imagem: Marcos Cruz/Netflix]

Outra cena que permite questionar as atitudes de Noah é quando Elle quer voltar para casa sozinha, mas ele não concorda com a ideia. Ele corre atrás dela, gritando para que entre em seu carro, e quando ela não o obedece, grita de forma agressiva enquanto soca o capô do carro com força, soando como uma ameaça forte. Extremamente explosivo e agressivo durante todo o filme, nessa cena, Noah volta a agressividade contra Elle.

Querer controlar as atitudes de sua parceria e ser capaz de ser agressivo com ela são bandeiras vermelhas que sinalizam um homem abusivo. É possível até pensar se Elle não teve sorte por Noah ir embora antes que a situação piorasse.

Apesar disso, na continuação A Barraca do Beijo 2 (The Kissing Booth 2, 2020), esse lado de Noah é bem amenizado. Muitas das suas atitudes podem até mesmo impressionar o espectador, se fizer uma comparação com o personagem apresentado no primeiro filme. Com exceção de algumas pequenas mentiras, ele não demonstra atitudes muito reprováveis. Porém, vale ressaltar que nessa continuação o espectador sente uma insegurança muito intensa em Elle, insegurança essa que, como foi dito anteriormente, Noah ajudou a construir com sua “proteção”. 

De certa forma, ainda que os personagens muitas vezes tenham atitudes que podem parecer confusas ou sem sentido, o que é compreensível em uma produção adolescente, a questão do controle excessivo e agressividade foi deixada apenas no primeiro filme, o que é um grande progresso.

 

A Saga Cinquenta Tons (2015-2018)

Baseada em livros eróticos que se iniciaram como uma fanfiction de Crepúsculo, essa saga também segue alguns dos aspectos negativos já citados. Ela chegou a ser muito criticada por praticantes de BDSM, que afirmam fazer diversas distorções de como a prática é na realidade. O BDSM (Bondage, Disciplina, Dominação, Submissão, Sadismo e Masoquismo) é uma prática sexual em que há um dominador e um submisso, ambos consentindo completamente tudo o que acontece, é uma prática complexa e extensa que exige muita responsabilidade em sua adesão

Christian Grey (Jamie Dornan) já se demonstra como um homem problemático mesmo sem estar seriamente envolvido com Anastasia, ou apenas Ana (Dakota Johnson). Antes de estarem em um relacionamento propriamente dito, Ana sai e bebe com os amigos. Já alterada, ela liga para Christian, que percebe seu estado e decide ir buscá-la, ainda que ela peça para ele não fazê-lo. 

O que, se percebido, é perturbador, é o fato de que Christian chega ao lugar onde Ana está sem que ela lhe diga nada sobre o local, o que leva o espectador a entender que ele estava a rastreando. Porém isso é esquecido, já que Christian salva Anna de seu amigo assediador e a leva embora para cuidar dela.

 

Christian é simplesmente um homem obcecado e mostra atitudes abusivas. [Imagem: Reprodução/Universal Pictures]
Christian é simplesmente um homem obcecado. [Imagem: Reprodução/Universal Pictures]

Ainda há algumas questões no “contrato de consentimento” de Christian. Além do consentimento sobre práticas sexuais, a “submissa” deve concordar com que ele controle sua alimentação e, ainda, deve adotar o método de contracepção do anticoncepcional, que pode ter diversas reações negativas no corpo de uma mulher. Tais exigências são problemáticas e saem do que é abrangido pelo BDSM.

A exigência de aderir somente ao anticoncepcional como método contraceptivo se torna ainda mais problemática quando, no fim da saga, Christian fica irritado com Ana por estar grávida, já que ela esqueceu de tomar a medicação no tempo correto. Além de colocar toda a responsabilidade da contracepção sobre a parceira, com um método que sequer previne ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), ele se revolta quando ela não consegue lidar com isso sozinha.

Há ainda outros momentos em que ele demonstra sua obsessão doentia por Ana, como quando manda parabenizações por seu emprego novo, do qual ela não tinha falado para ele, ou quando fica irritado por ela viajar para visitar a mãe e aparece lá sem a avisar e sem que ela tenha lhe dito o endereço.

Outro aspecto preocupante de Christian é o fato de ele fazer uma “ficha” de cada mulher com que se envolve, com fotos tiradas sem seu conhecimento e dados pessoais. Ele ainda as mantêm guardadas mesmo depois que encerra as relações com essas mulheres e enquanto está com Ana.

Por isso pode-se incluir Christian Gray como outro homem com uma obsessão nada saudável por sua parceira, que ultrapassa diversas barreiras de sua privacidade e que quer controlar seu corpo da forma que for mais conveniente a ele. 


365 dias
(2020)

O mais recente e mais extremo dos filmes citados. É difícil descrever em palavras o quão errado o “relacionamento” mostrado é. Por isso, esse texto vai tentar salientar alguns dos problemas contidos na história.

Não há nenhum aspecto saudável na relação de Massimo (Michele Morrone) e Laura (Anna-Maria Sieklucka). Desde o início, ele tem uma obsessão doentia por ela, a observando e a perseguindo por anos. Quando ele finalmente a encontra, decide que tem o direito de sequestrá-la, simplesmente porque essa é sua vontade.

 

Não há amor ou paixão aqui. [Imagem: Divulgação/Netflix]
Não há amor ou paixão aqui. [Imagem: Divulgação/Netflix]

Ele adiciona a isso um discurso de que não fará nada que ela não queira, o que é totalmente falso, já que ele a está levando consigo contra a sua vontade. O que torna tudo mais perturbador, é que o espectador vê que ele faz esse discurso apertando um dos seios de Laura, enquanto ela tenta se afastar dele.

Esse é o pior aspecto do filme: ele distorce o conceito de consentimento. O enredo tenta dizer que apenas por Massimo não estuprar Laura, ele está respeitando o consentimento dela, mas não está. Consentimento vai muito além da relação sexual e a partir do momento que ele a sequestra e toca seu corpo contra sua vontade, ele está abusando dela. É preocupante pensar que um espectador mais influenciável possa se deixar levar por essa distorção que o longa faz. 

Ainda que nenhum dos pontos anteriores estivessem presentes na história, Massimo ainda seria um homem possessivo e abusivo. Isso é comprovado quando ele e Laura vão para uma balada. Na ocasião, Massimo se irrita por Laura usar um vestido “muito sensual” e quando ela quase se torna vítima de outro abusador, Massimo a culpa por estar “provocando”. E novamente, tudo é amenizado por momentos em que ele a salva de alguma situação ruim.

Até mesmo uma história sobre um abusador e uma mulher com uma possível Síndrome de Estocolmo — um estado psicológico em que a vítima de um abuso ou agressão desenvolve simpatia e afeto por seu agressor ou abusador —, como 365 Dias, pode se tornar um romance. Basta criar uma narrativa em que o homem é o apaixonado, salvador e protetor e tratar tudo com o máximo de erotismo possível.

Em entrevista à Jornalismo Júnior, Tayara Maronesi, graduada em psicologia pela ULBRA e especializada em Saúde Pública pela UFRGS, faz uma menção sobre 365 dias e os comentários feitos sobre o filme, que alegam que se trata apenas de um fetiche. Ela contesta: “Será que sabemos o que é fetiche?”. “Se ele tivesse convidado ela para um jantar e no meio do envolvimento houvesse uma combinação entre eles sobre um sequestro como uma brincadeira, ok, seria fetiche. Mas quando ele droga, sequestra, mantém em cárcere privado, é crime, é violência. É preciso entender a diferença”, completa a psicóloga.


Como isso afeta mulheres reais?

Com tantos comportamentos abusivos e problemáticos demonstrados sendo assistidos e admirados por milhares de garotas e mulheres, é inevitável pensar se esse conteúdo não as influencia, se ele não determina também sua imagem de parceiro ou relacionamento ideal.

Sim, esse conteúdo, por mais fictício, por mais que não carregue uma seriedade, traz uma influência no repertório e no imaginário do seu público alvo feminino. Segundo a psicóloga Maronesi, “filmes, desenhos, séries, as mídias em geral, são as principais tecnologias de gênero, ou seja, ditam como devemos nos comportar, o que é esperado, desejado, legitimado, permitido”, sendo, portanto, o entretenimento mais uma das formas em que nos é apresentado a performance binária do que é “ser homem” e “ser mulher”.

Entretanto, não devemos confundir sua influência com uma relação causa-consequência que faz mulheres se envolverem com homens abusivos. A também psicóloga, Laís Nicolodi, graduada e mestra pelo IPUSP, afirma que não se pode cair no pensamento de que os filmes causam diretamente um padrão de comportamento indesejado, mas sim que “eles compõem todo um universo de referências midiáticas”, ensinando muitas meninas e mulheres a “moldarem seus repertórios de como se relacionar com o outro”. Dessa forma, essas obras estão contribuindo para um repertório criado desde a infância sobre a forma de se relacionar e a posição de submissão da mulher, elas são parte de um todo. 

Podemos observar a forma como essa influência age na prática ao analisar o ideal de parceiro e relacionamento presente em grande parte das mulheres. Todo esse repertório construído culturalmente, juntamente com os filmes, moldam o que é o “ideal”, o que a mulher deveria buscar e querer, o que vai fazer ela feliz. Com isso, como diz Nicolodi, muitas mulheres “podem buscar parceiros que lhe ofereçam uma proteção e segurança de forma violenta e abusiva”, porque isso é normalizado e tratado como “o modelo ideal”. 

Assim, o comportamento abusivo vindo de homens também é visto como aceitável ou até mesmo como uma grande prova de amor. Nicolodi diz que há uma naturalização desses comportamentos abusivos que demarcam a diferença de poder. A violência simbólica, mais sútil, que aparece por exemplo nas ocasiões em que a mulher não é humanizada como agente capaz de decidir por si própria, o homem deve decidir por ela. 

Essa naturalização fica no imaginário coletivo das mulheres acerca do que seria o homem ideal, as fazem ver situações como ciúmes patológicos, em que o homem tenta controlar a parceira, como normais, como uma prova de amor. “Isso acaba reproduzindo uma lógica patriarcal, uma lógica de poder, e ensina mulheres que está tudo bem , naturaliza que a mulher é mais feliz assim”, complementa Nicolodi.

 

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O ideal de amor dentro do modelo patriarcal é um amor deturpado.

 

Ainda assim, muitas vezes, não fica claro o motivo de mulheres se envolverem em relacionamentos assim, pois parece óbvio que é algo ruim, que a mulher deveria perceber que esse tipo de relacionamento não é saudável. Mas há ainda outros valores que a fazem continuar acreditando que está vivendo um grande romance.

Uma grande questão é que essas mulheres não vêem os próprios parceiros, ou os personagens de filmes, como homens problemáticos e abusivos. Além disso, Nicolodi afirma que “há elementos culturais que desresponsabilizam os homens, a mulher acaba assumindo a responsabilidade de cuidar, ensinar o homem, mudá-lo, algo que vem de uma maternidade culturalmente ensinada”.

Maronesi também complementa: “é muito comum a mulher ser vista e incentivada a performar o papel de salvadora dos homens”. Dessa forma, ainda que a mulher veja o homem como problemático, ela pensa que é dever dela mudar isso.

Outra questão, se relaciona ao “ideal de ter um parceiro”. Maronesi aponta para a produção da psicóloga Valeska Zanello sobre o assunto: “em seu livro ‘Saúde Mental, gênero e dispositivos – cultura e processo de subjetivação’ fala que as mulheres se subjetivam na relação consigo mesmas, mediadas pelo olhar de um homem que as “escolha”, ser escolhida por um homem é um fator identitário”. Maronesi ainda reforça que “sucesso” é ser escolhida por um homem, esse é o objetivo, independente de que homem é esse.  “O homem escolheu essas mulheres, elas devem ficar felizes, satisfeitas, honradas e se permitir serem subjugadas, se submeterem”, complementa.

Sendo assim, há vários fatores culturais, os quais as produções citadas reforçam, que fazem as mulheres se envolverem com homens abusivos e relevar suas atitudes, permanecendo presas a eles. Os filmes citados são um reflexo de toda uma cultura na qual atitudes abusivas e agressivas de homens para com suas parceiras são consideradas como formas de amar, são romantizadas e exaltadas. Eles são, ao mesmo tempo, frutos e reforços dessa cultura, se juntando a um repertório já existente na vida das mulheres, cultivado desde a infância através de contos de fadas, por exemplo. 

Por fim, Maronesi questiona especificamente os filmes eróticos da lista, como a Trilogia Cinquenta Tons e 365 dias, com uma citação da feminista Naomi Wolf : “seria interessante ver se Cinquenta Tons seria tão popular num mundo em que as mulheres estivessem recebendo mais atenção e carinho de seus parceiros. Suspeito que elas estejam entediadas sexualmente”. 

Isso provoca muitas reflexões, principalmente quando se pensa em 365 dias. As mulheres sofrem a vida inteira com uma grande barreira para explorar sua sexualidade, suas fantasias e seus desejos, tanto sozinhas, como com um parceiro. Essa repressão sexual chega a tal nível, que a ideia de um homem que sequestra a mulher pela qual está obcecado e a mantém em cárcere privado para que ela se apaixone por ele, se tratada com um erotismo que sacie suas fantasias, parece excitante.

É importante que os espectadores analisem o que consomem, para então tomar uma decisão consciente sobre o que lhes é mostrado e entender como isso pode afetar a eles mesmos e a outros.  Ao refletir sobre isso, garotas e mulheres podem perceber como os comportamentos mostrados no entretenimento nem sempre devem ser tratados como aceitáveis, muito menos como românticos — se um homem é agressivo e abusivo com sua parceira, não há romance algum presente, não deve-se permitir que essa ideia de amor e proteção deturpada continue presente em relacionamentos. Por isso é importante ter a capacidade de observar comportamentos problemáticos no entretenimento, para que se possa notá-los quando surgem na vida real.

A decisão de consumir ou não esses conteúdos é individual, mas o conhecimento sobre o quão problemático eles podem se tornar deve ser geral. 

2 comentários em “A romantização de homens abusivos no cinema”

  1. Muito bem escrito adorei a resenha. Um olhar mais realista fora do imaginário feminino, o fetiche quando assistimos filmes desses gêneros nos leva a esquecer um pouco a realidade. Mas é uma pena que exista muitas mulheres que não sabe distinguir realidade de ficção.

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