por Leonardo Matelini
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A Colina Escarlate (Crimson Peak, 2015) apresenta dois tipos de espetáculos, distintos, porém complementares: aquele em que você não é atraído pelo conteúdo, mas pela beleza; e aquele em que as cenas são tão envolventes que mal te sobra tempo para respirar. Assim se apóia o filme de Guillermo Del Toro: depois de algum tempo distraídos pelos detalhes dos Estados Unidos do século XIX, onde a dinâmica é lenta e arrastada, submergimos na zona rural e montanhosa da Inglaterra, com cenas de suspense, amor e drásticas reviravoltas. Tudo como se o filme pedisse para descansarmos antes de nos aventurar pelo que Del Toro denomina como “romance gótico”.
O longa conta a trajetória de Edith Cushing (Mia Wasikowska), uma escritora da alta burguesia estadunidense que sonha em publicar seu primeiro livro — um romance com fantasmas. Ao se aproximar do misterioso Thomas Sharpe (Tom Hiddleston), Edith se apaixona e se muda para sua mansão, na Inglaterra, onde também vive a cunhada Lucille (Jessica Chastain). Entretanto, o estranho barro vermelho que cerca a mansão não aparenta ser a única excentricidade do local: o casarão abriga entidades que escondem um misterioso passado, disposto a desafiar a sanidade de Edith.
A Colina Escarlate é, antes de mais nada, um filme de fantasmas em que os fantasmas não são a atração principal. A história, que tenderia a cair no clichê da “casa mal assombrada”, vai além: o protagonismo está muito mais centrado nos humanos e nos dramas que ali vivem do que nos mortos que voltam para assombrá-los. Reflexo disso está nas cenas de terror: a computação gráfica dedicada aos fantasmas não convence e, talvez por isso, são pouco impactantes. Sustos com a trilha sonora até tentam deixar tais sequências mais medonhas, mas falham na maioria das vezes. Por isso, definitivamente, A Colina Escarlate não é um filme para quem quer ficar com medo de fantasmas junto com os amigos: serve para quem quer apreciar um sutil terror psicológico, como em O Labirinto do Fauno (El Laberinto del Fauno, 2006), do mesmo diretor.
Visualmente, o filme é soberbo. Toda a oportunidade que um longa de época proporciona foi utilizada com magnificiência, seja nos figurinos femininos suntuosos da classe alta ou nos sets detalhistas de mansões góticas. Tudo se encaixa perfeitamente bem na fotografia quase fantasiosa de Dan Laustsen (Silent Hill), sombria e opaca, que realça o mistério embutido em cada lugar e em cada personagem apresentado. Apenas uma cor não é poupada do espetáculo: o vermelho, vívido e cru.
Apesar da evidente melhora da atuação de Mia Wasikowska desde Alice no País das Maravilhas (Alice in Wonderland, 2010), não há empolgação. Nem nela nem em Tom Hiddleston — ainda que protagonize uma bela cena para maiores. Sem dúvida, a grande estrela do filme é Jessica Chastain: já tendo sido dirigida por Guillermo Del Toro em Mama (Mama, 2013) e atuado com Mia em Os Infratores (Lawless, 2012), Chastain soube usar da familiaridade para alcançar uma atuação sublime. A atriz americana jogou muito bem com todas as particularidades de Lucille Sharpe, uma mulher forte e temperamental, protagonizando cenas de dissimulação e até uma batalha na neve.
Mais uma vez, Del Toro explora a agonia dos expectadores pelas cenas de violência. Sem cair na banalidade, A Colina Escarlate faz questão de mostrar qualquer agressão; coloca em momentos certeiros tomadas em que as personagens são cortadas, perfuradas ou mutiladas mediante a brutalidade de outras, avermelhando com sangue roupas e cenários. Tais cenas não são cortadas pela câmera, pelo contrário; o diretor as mostra em sequências muitas vezes mais longas do que os mais fracos conseguem suportar.
De certo, o filme é mais um deleite para os fãs de Guillermo Del Toro. Não há como colocar mais do diretor mexicano do que em A Colina Escarlate, em que uma mansão inteira foi construída apenas para as filmagens e, em seguida, demolida para liberar espaço no estúdio. Não há medo da ousadia. O filme é uma verdadeira arte rubra: bela, excêntrica e memorável.
Trailer: