Por Luiz Dias (lhp.dias11973@usp.br)
Localizada na Serra do Mar, Paranapiacaba atrai milhares de turistas todos os anos, seja pelos icônicos festivais, pelas trilhas com cachoeiras ou pelas lendas urbanas criadas em torno da “Silent Hill brasileira”. A vila, cujo nome em tupi-guarani significa “a terra de onde se vê o mar”, reflete a história de São Paulo e do Brasil, gravada em trilhos na serra.
O povoado nasceu no auge do ciclo do café e da necessidade dos Barões do Café de escoar sua produção de Jundiaí até o porto de Santos. Com esse propósito, o Barão de Mauá e o engenheiro britânico James Brunlees idealizaram a São Paulo Railway, ferrovia que ligaria o interior ao litoral — o berço da vila e da história ferroviária brasileira.





Com o intenso fluxo de capital entre o interior e o litoral, a região prosperou e se expandiu, originando a Vila de Martin Smith nas redondezas. Planejada em modelo inglês, ela abrigava os funcionários e suas famílias. Atualmente, Martin Smith se fundiu com o restante do território e é conhecida como a Parte Baixa.



O posicionamento do Castelinho, além de projeção hierárquica, possuí uma função psicológica. Segundo Daniela Bergamini, guia turística de Paranapiacaba, os ingleses aplicaram arquitetura panóptica em Martin Smith, uma construção em que os operários teriam a sensação constante de observação por parte dos superiores e dos vigias da cidade.



Além disso, Paranapiacaba teve papel fundamental na introdução do futebol no Brasil. Charles Miller, filho de ingleses que trabalhavam na ferrovia, é creditado por trazer o esporte ao país, levando bolas e um manual de regras — e fazendo da vila o epicentro da difusão do futebol.

“O dinamismo da Vila de Paranapiacaba, intimamente ligado à vida da estrada de ferro, sofre uma interrupção com a valorização do uso do automóvel”
Citação do livro ‘Caminho do Café. Paranapiacaba: museu esquecido’



Com a obsolescência iminente da ferrovia, autoridades locais e moradores começaram a transição para o modelo turístico que sustenta a cidade atualmente. Esse movimento foi iniciada pela compra da vila pela prefeitura de Santo André, sob gestão de Celso Daniel e o ínicio de investimentos que aumentariam o fluxo de turistas.
“Olha, esse lugar não é o fim do caminho — é a pérola do ABC”
Ex-prefeito Celso Daniel
Uma parte dos investimentos dedicados na cidade foram para capacitação de guias turísticos, dentre eles Daniela Bergamini, que destacou o compromisso dos paranapiacabanos nesse processo: “Somos nós, moradores e descendentes, que tocamos esse projeto: recebemos os visitantes, contamos as histórias de nossos pais, avós e familiares ferroviários. Essa essência ferroviária é algo que não podemos perder”.
O turismo da cidade se concentrou em museus ferroviários, mas especialmente voltado para o misticismo local. Quando questionados, moradores e guias oferecem diferentes versões sobre a origem das lendas locais.
Uma delas foi relatada por Carlos, guia do Museu do Funicular, que especula que parte das histórias surgiu de avistamentos de rituais indígenas durante a construção dos primeiros acampamentos. Após os avistamentos até fenômenos banais como o ruído nos telefones ou estalos na madeira das casas começaram a ser tomados como fenômenos paranormais.




A egrégora mística que envolve Paranapiacaba movimenta não apenas a economia, mas também práticas espirituais, como a bruxaria natural. A vila abriga a Associação Brasileira de Bruxaria (ABB), uma instituição que oferece, através de palestras e encontros, conhecimento espiritual de diversas doutrinas. Aassociação em si não possuí caráter religioso.






