A série Santa Clarita Diet chegou ao catálogo da Netflix em 2017 e parece ter atraído e repelido inúmeras pessoas devido ao teor extremamente diferente, que envolve horror e humor em um mesmo conteúdo. A série vem sendo bem estruturada nas duas temporadas disponíveis na plataforma de streaming e despertando algo que é difícil captar em outras produções audiovisuais. Tem uma força muito grande, principalmente na construção dos personagens principais. Com personalidades singulares, nenhum se sobressai de modo que o outro fique apagado, isso claro, com uma interpretação adequada e direção que contribui diretamente para um resultado assim.

Joel (Timothy Olyphant) e Sheila (Drew Barrymore) se conhecem desde a high school (ensino médio) e namoram desde então. Juntos, foram rei e rainha do baile, além de terem sido os mais populares da escola. Essa contextualização é de suma relevância, uma vez que se imagina pessoas vindo desse grupo como totalmente mesquinhas e superficiais , no entanto, Joel e Sheila fazem questão de provar o contrário. São divertidos, modernos, com a mente muito à frente em comparação às outras pessoas; inteligentes, competentes, dedicados e lidam com a família de forma quase invejável. Os adjetivos cabíveis a esses dois são intermináveis e quando se assiste a série isso é de fácil captação e nenhum exagero. Mas ao contrário do que se pensa, eles passam longe de ser perfeitos e mecânicos: essas características se aplicam a eles pelo modo muito natural e verdadeiro como lidam com as situações do cotidiano.

A força maior do casal vem quando já no episódio piloto, Sheila, por alguma razão ainda não descoberta, elimina, por meio de um vômito, um líquido muito viscoso e uma bola vermelha e, a partir desse ponto, começa consumir apenas carne humana. O mais irônico na produção é a forma que todas as pessoas lidam com esse acontecimento, como se fosse um problema que deve ser escondido, mas pouco questionado, então é que se entra em diversas analogias com a sociedade contemporânea e a sátira se aplica tão bem na produção. Por isso, é preciso além de assistir a série como mero entretenimento, refletir um pouco para aproveitar o melhor que pode oferecer.

Como já mencionado no título, Joel e Sheila são uma equipe de verdade, eles estão praticamente sempre juntos. Primeiro, por serem um casal há longo tempo e segundo, por trabalharem no ramo imobiliário, sobrando pouco tempo para estarem separados, a não ser nos momentos que eles precisam fazer “as missões” que são quase uma tortura para eles. Nesse aspecto de separação, tem até um momento em que Sheila é demitida pela empresa em que trabalha por ter um comportamento diferente do que era esperado, mas Joel continua contratado e eles discutem sobre a questão, entrando na argumentativa de que se os dois ficarem sem emprego não terão como sustentar a família. Mas depois de um tempo, vem com a notícia de que se demitiu e abrirão o próprio negócio. Atitude totalmente digna de um casal que se ama de fato.

Drew e Timothy construíram consolidadamente os personagens que interpretam na série, em nenhum momento consegue-se questionar se eles realmente se amam ou se são um casal, a força dessa construção deixa a relação ainda mais forte. Longe de passar por momentos fáceis, o suporte que dão um ao outro é o mais admirável e que deveria ser o pilar essencial para todo casal. A confiança que um tem no outro e todas as situações, muitas vezes embaraçosas, que eles entram para se ajudar é incrível. O próprio modo como os dois se enxergam como melhores amigos e não apenas falam disso, como o fazem. A dupla, em todos os aspectos, tem um grande potencial de agradar o espectador e fazer se encantar pela parceria e fidelidade que um tem para com o outro, muito além de somente uma paixão, se vê um amor.
O formato da série, por conter um roteiro estruturado em algo incomum, mistura de humor com situações excêntricas, pode não agradar diversas pessoas, mas a ideia que se tem por trás de toda essa construção, além de todas as outras personagens, merecem ser reconhecidos. Assim como outras produções, possui falhas e melhorias a serem feitas, no entanto, a série caminha para uma evolução e a chance de cativar o espectador não é pequena.
Por Daniel Terra
danielterra@usp.br