Márcia Scapaticio
Agir é preciso quando o assunto é possibilitar maior acesso às atividades culturais. Em estudo realizado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e publicado em dezembro, os dados apresentados causam espanto: 91,3% dos municípios brasileiros não tinham nenhuma sala de cinema em 2006. No mesmo ano, o percentual de municípios com 2 a 5 salas de cinema era de 1,96% e a com 6 ou mais salas era de 0,49%.
Hábito
Numa situação mais específica, relacionou-se a freqüência de práticas culturais ao nível de alfabetização e posição socioeconômica. No caso da audiovisual, constatou-se que o percentual de “quem nunca vai ao cinema” é de 68%, considerando o total dos grupos sociais analisados; já o número de iletrados que nunca vão ao cinema chega a 93%. Comparando-se as classes denominadas A/B com as C/D, nunca vão ao cinema 31% do primeiro grupo, enquanto os do segundo atinge a taxa de 83%.
Os pesquisadores do IPEA constataram que a freqüência ao cinema é um pouco maior à medida que aumenta o nível de letramento, a classe e a renda. Ao tomar como ponto de partida a “retomada da produção audiovisual brasileira”, na década de 90, período no qual houve o surgimento de novos cineastas e de filmes com boa arrecadação de bilheteria e grande média de público; o “Programa Brasil Som e Imagem”, objetiva o desenvolvimento mais equilibrado da economia, associado ao audiovisual, bem como a valorização da diversidade da produção. Os dados consideram, a princípio, o fato de o número de cinemas e sua abrangência no território nacional ser muito pequena, pois apenas 8% dos municípios possuem salas de cinema no Brasil.
A pesquisa também analisou as cidades brasileiras, dividindo-as por tamanho e constatou que as cidades pequenas com cinema equivalem a 5%; nas cidades médias esse número sobe para 66% e nas cidades grandes alcança a marca de 94%. Concluiu-se que os cinemas, como tipo específico de equipamento de exibição não dá conta das necessidades sociais e simbólicas de quase todo o universo da população de menor renda.
Concorrência
É relevante observar que o estudo não menciona o suposto “declínio do cinema” e que nem a concorrência da televisão (aberta ou fechada) ou das videolocadoras contribuíram para possível crise, uma vez que, no Brasil, são vendidos 11 milhões de ingressos/ano, apesar de 90% serem para filmes estrangeiros – um bom assunto para reflexão e posterior discussão .
Outro desdobramento dessa pesquisa é a questão da distribuição, quando se verifica que 90% dos ingressos são para filmes Norte-Americanos; que 50% dos ingressos vendidos fica entre as produções de Hollywood e que 80% do mercado cinematográfico é controlado por poucas – e grandes – distribuidoras.
Por isso, é fundamental a valorização do audiovisual brasileiro e sua consolidação como indústria, a fim de reorganizar e consolidar uma distribuição nacional de qualidade. Algumas ações diferenciadas ocorrem, as chamadas “estratégias de distribuição”, como o cineclubismo, o aumento do número de salas privadas (ampliação do parque exibidor com financiamento público orçamentário, por meio de linhas de créditos estatais ou por meio de renúncia fiscal) e, também, o aumento de número de cópias por filme. Mostram-se alternativas são: criação de cotas para exibição e o uso das tvs para a exibição, tendo em vista a regulamentação do mercado nacional.
Quando falamos em resultados, os melhores e mais objetivos são os relacionados a parcerias, como, por exemplo, o Programa de Apoio à Exportação do Audiovisual de Tv e os projetos “DOCTV” e “Revelando Brasis”, (em parcerias com agentes não governamentais), além da importância da atuação institucional do fomento à produção.
Todos esses dados ilustram, de forma objetiva, os caminhos da produção cinematográfica brasileira, seus mecanismos e desdobramentos enquanto atividade cultural e arte transformadora que deve estar ao alcance dos brasileiros, independente do nível de letramento ou classe social. Eis uma barreira que só o fazer artístico pode transpor.