O quanto é necessário amar o esporte a ponto de deixar todo o seu orgulho para trás? Em Ping Pong (Editora JBC, 2021), de Taiyo Matsumoto, o maior desafio não são os jogos ou torneios nacionais: é a disputa entre a mente e o desejo, a expectativa e a realidade.
Sobre a obra
Ping Pong é um mangá originalmente publicado na revista semanal japonesa Big Comic Spirits, da editora Shogakukan, e posteriormente compilado em cinco volumes. No Brasil, os exemplares foram agrupados em duas edições de aproximadamente 500 páginas pela editora JBC.
Nessa obra, acompanhamos a história de Peco (Yutaka Hoshino) e Smile (Makoto Tsukimoto), dois amigos de infância e estudantes do ensino médio com uma paixão em comum: o tênis de mesa. Ao passo que Peco reconhece e assume o tempo todo seu imenso talento, Smile se retrai em campo e tem dificuldades em reconhecer o próprio potencial.
Na casa de ping pong Tamura, os protagonistas passam suas tardes jogando e encantando treinadores e ex-jogadores de referência, que buscam novos talentos para compor times escolares e colocar o Japão novamente em evidência nos torneios.
Em 2014, a adaptação para anime saiu pela produtora Tatsunoko Production e foi aclamada pelo público e pela crítica, com destaque para a fidelidade ao mangá e a arte diferenciada da animação.
Constantes desencantos
No processo de criação do mangá, surgiu a ideia de escrever uma história sobre futebol, vinda do futuro editor de Ping Pong, Yasuki Hori. Matsumoto, porém, recusou sob a justificativa de que seria impossível serializar tantos personagens de forma interessante.
A escolha pelo tênis de mesa demonstrou a intenção do autor em não apenas retratar o esporte pelo esporte, como representa a figura de Peco, mas de produzir um sentido psicológico na história, com Smile, Sakuma e tantos outros jogadores que serão apresentados no mangá. Isso faz com que Ping Pong não seja uma simples obra sobre jogos e competições, mas também sobre as decepções e pessimismos muitas vezes irreversíveis, que podem levar à falência de uma carreira em consolidação.
Um exemplo é a personalidade e comportamento de Peco, que desde o início da história evidenciam um primeiro desencanto: convencendo-se de que é muito bom no tênis de mesa, ele não vê sentido em treinar. Sua dedicação ao esporte é ínfima, quase como se não houvesse emoção em praticá-lo, já que ninguém até o momento tinha sido capaz de vencer o garoto.
Já Smile, mesmo treinando com muita dedicação, não consegue se adaptar ao espírito competitivo do esporte. Na obra, não entendemos exatamente as razões por trás disso, mas é possível perceber que esse desapego à vitória e ao reconhecimento de suas habilidades o leva a menosprezar toda a ambição em torno da prática do esporte, dizendo em diversos momentos que “é só tênis de mesa”.
O traço de Matsumoto em diversos momentos é inconclusivo, e de uma página para a outra perdemos o raciocínio dos personagens. Os flashbacks para a infância dos protagonistas acontecem para desenvolver pontos de sua relação, mas também para nos fazer entender sobre as expectativas de Peco e Smile e imaginar o que farão nas próximas páginas da obra.
Nem todos vão brilhar no esporte
Ping Pong é uma obra divertida de se acompanhar, embora quebre expectativas dentro do gênero esportivo de animes e mangás, que costumam abordar o desenvolvimento e crescimento de um personagem de forma entusiástica dentro dos jogos.
Personagens excêntricos e dotados de várias limitações psicológicas e até performáticas desenvolvem um orgulho ilusório em nome de uma vitória que nem sempre traz satisfação completa para eles.
No aborrecimento que vem com a derrota ou com o mau desempenho, as criações de Matsumoto começam a compreender o verdadeiro sentido do ping pong em suas vidas, evidenciando o peso da escolha e da persistência dentro do esporte.
Imprevisível, Ping Pong desenvolve sua história baseada em inícios, fins e recomeços de forma madura e confortante.
Foto de capa: Reprodução/Twitter: @Lunshlur