Por Thaís Santana (thais2003sc@usp.br)
No mês de outubro, o Brasil se une ao movimento internacional Outubro Rosa, dedicado à conscientização sobre o câncer de mama, o tipo de câncer mais comum entre mulheres no país. Durante o mês, diversas ações educativas e eventos beneficentes buscam alertar a população sobre a importância da mamografia e do autoexame, além de desmistificar preconceitos e promover o apoio às pacientes. É um período de luta contra a doença, principalmente por reforçar a detecção precoce, que é fundamental para aumentar as taxas de sobrevivência.
História do Outubro Rosa
A origem do movimento remonta à década de 1990, quando diversas iniciativas começaram a surgir nos Estados Unidos. A primeira ação significativa ocorreu em 1990, durante uma corrida pela cura do câncer de mama promovida pela Fundação Susan G. Komen for the Cure, na cidade de Nova York. Na ocasião, os corredores receberam o famoso laço rosa como símbolo de apoio e conscientização. Depois disso, ele começou a ser distribuído em locais públicos, desfiles de moda e em outros eventos.A ideia rapidamente ganhou popularidade e, em 1993, o laço rosa foi adotado como um símbolo global de combate ao câncer de mama. O mês de outubro se tornou um programa de sensibilização em vários países, com eventos, palestras e campanhas de prevenção. Em 2002, o movimento chegou ao Brasil, quando o Obelisco do Ibirapuera, em São Paulo, foi iluminado com luzes cor de rosa.
Somente em 2008 a movimentação ganhou força em cidades brasileiras, que abraçaram o Outubro Rosa e iluminaram os principais monumentos com a cor rosa durante a noite. A ação evoluiu e passou a envolver instituições de saúde, organizações não governamentais e a sociedade como um todo.
Efeitos do câncer de mama
A Jornalismo Júnior entrevistou a Dra. Larissa Mandarano, médica mastologista e também mestra e doutora em câncer de mama pela Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, para detalhar os impactos históricos da doença.
Ela revela que o câncer de mama representa 30% dos diagnósticos de câncer na população feminina no Brasil, sendo a principal causa de morte por câncer em mulheres de todo o mundo. “Os números de mulheres diagnosticadas crescem a cada ano”, informa a médica. “Esperamos, para 2024, mais de 74 mil mulheres diagnosticadas no Brasil e mais de 17 mil mortes pela doença.”
O câncer de mama se desenvolve quando células mamárias sofrem uma mutação e se emancipam do controle do organismo, como explica a doutora. A partir disso, ocorre um crescimento desgovernado que forma uma massa tumoral. Essas células têm capacidade de cair na circulação e migrar para outros órgãos do corpo, causando a metástase, o que pode comprometer a função de órgãos vitais (como pulmão, fígado, etc.) e colocar a vida do paciente em risco.
A mastologista orienta que hábitos de vida saudáveis são capazes de reduzir o risco de desenvolver câncer de mama. Controle do peso, alimentação saudável, abandonar o tabagismo e o álcool, aleitamento materno e praticar uma atividade física regular são algumas medidas efetivas para aumentar os fatores de proteção.
Necessidade de uma campanha
Segundo Larissa, as campanhas de saúde têm o objetivo de levar informação e reduzir os números de diagnósticos, e no caso do câncer de mama, diminuir os casos de vidas perdidas para a doença. A médica atende pacientes em tratamento de câncer de mama no Sistema Único de Saúde (SUS) e trabalha no ambulatório oncológico do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto há 12 anos. Por isso, testemunha na prática a influência dessas ações para a população. “Muitas mulheres lembram de fazer mamografia na época da campanha, muitas deixam seus exames periódicos para outubro para não se esquecerem deles, e todas são gratas por terem sido estimuladas a se cuidarem”, comenta Larissa.
O Laboratório também entrevistou Mônica de Assis, pesquisadora do INCA (Instituto Nacional do Câncer) no Rio de Janeiro. Ela reforça a importância da campanha para o diálogo público, pois o câncer é uma doença progressiva, e quanto mais cedo ele for identificado, mais efetivo será o tratamento e os riscos de morte serão menores.
Mônica trabalha com a produção de sistemas que buscam a detecção precoce do câncer e investigam o panorama da doença no país, além de comunicar informações e desenvolver projetos educativos para a sociedade. Esse trabalho complementa campanhas como a do Outubro Rosa.
A dificuldade de informar corretamente
Em 2020, Mônica de Assis publicou um artigo que analisou matérias sobre o câncer durante o período de um mês ao longo do Outubro Rosa. A ideia surgiu pelo incômodo com a cobertura da doença feita pela mídia, que segundo a pesquisadora, omitia informações relevantes. Um dos principais problemas observados foram as contradições a respeito da idade recomendada para fazer uma mamografia.
Mônica esclarece que a indicação da OMS (Organização Mundial da Saúde) é de que o exame deve ser feito entre 50 a 69 anos a cada dois anos. Todavia, os Conselhos de Medicina costumam orientar uma frequência anual a partir dos 40 anos. A pesquisadora enfatiza que a imprensa não costuma tornar transparente essa contradição, o que pode prejudicar a conscientização quanto ao exame.
“A cobertura da imprensa não deve se limitar apenas à recomendar a mamografia. O jornalismo também tem a função de abrir um debate para a sociedade”, ela comenta. O autoexame, que ela traz como exemplo, é uma medida fundamental para a detecção precoce e deve ser mais difundido. Além disso, Mônica diz que é preciso promover o diálogo a respeito das dificuldades do autocuidado entre mulheres. A pesquisadora esclarece que as origens dessa escassez envolvem uma marginalização da população feminina, que tende a viver com menos cuidado físico e mental e maior abuso do tabagismo e do álcool. Mônica pontua que a campanha deve informar o conjunto de fatores sociais que abrange a saúde das mulheres.
De acordo com Mônica, essa falta está sendo corrigida, e é essencial que as equipes de jornalistas estejam preparadas para trazer informações abrangentes e focadas no que é interesse público. O INCA realizou uma oficina virtual para a imprensa em 2020 que traz orientações, com base na conversa com os profissionais do SUS, sobre o apoio para pacientes e a desconstrução de estigmas.
Para a mastologista Larissa, é importante que as campanhas, além de trazer informação, impulsionem o acesso direto à saúde. “Facilidade no agendamento de consultas, realização de exames e encaminhamento a tratamentos quando necessário” são algumas das medidas mencionadas pela médica que fazem a diferença na garantia desse direito. Ela cita que, em 2024, a prefeitura de Ribeirão Preto disponibilizou o agendamento de mamografia direto pelas pacientes no site da prefeitura, sem necessidade do pedido médico.
Rede de apoio
Larissa Mandarano reforça que o tratamento do câncer de mama leva a cicatrizes emocionais. O processo exige que a mulher, muitas vezes, se afaste de suas atividades domésticas e do trabalho, e provoca mudanças na autoimagem com a queda do cabelo e alterações do corpo. “Essas mulheres atravessam uma jornada de superação e resiliência durante o tratamento”, explica a mastologista.A respeito dos projetos voltados para as sobreviventes da doença, a doutora lembra de já ter presenciado alguns durante essa época de campanha, como doação de cestas básicas para mulheres em tratamento, ou até lenços e sutiãs cirúrgicos. Ela também fala sobre ações que promovam qualidade de vida para essas pacientes, como cursos e dias de beleza.
Nessas atividades informativas e eventos, Larissa diz sempre se emocionar com a celebração da vida de sobreviventes. “São mulheres que perderam muito para a doença, mas têm sempre um olhar positivo e conseguem ver tantas coisas boas que essa jornada de transformação trouxe para suas vidas.”
Perdi uma pessoa muito querida para o câncer de mama. Quanto mais informação a respeito sendo compartilhada, mais vidas são salvas e por isso o outubro rosa é tão importante.