Planeta dos Macacos: A Guerra (War for the Planet of the Apes, 2017) chega ao Brasil nesta quinta feira, dia 3 de agosto. Com menos de um mês de exibição internacional, o filme já arrecadou mais de 220 milhões de dólares em bilheteria. A produção da 20th Century Fox é aclamada pelos críticos como a melhor da nova trilogia da série, iniciada com Planeta dos Macacos: A Origem (Rise of the Planet of the Apes, 2011). Dois dias antes da estreia em território brasileiro, o Cinemark do Shopping Eldorado, em Pinheiros, sediou a cabine e coletiva de imprensa com a ilustre presença de Andy Serkis, que veio ao país para promover o longa. O Cinemark, também, decorou uma de suas salas, a qual permanecerá tematizada para a estreia oficial.
Além da estrela Andy Serkis, Matt Reeves, diretor do segundo filme da franquia Planeta dos Macacos: O Confronto (Dawn of the Planet of the Apes, 2014), também é uma figura chave que retorna para a produção. A Guerra ainda tem, em seu elenco, a injustamente pouco mencionada Karin Konoval, reprisando seu papel como o orangotango Maurice, e novas figuras, em destaque Woody Harrelson e Steve Zahn. O roteiro é uma co-autoria entre o próprio diretor e o americano Mark Bomback. Michael Seresin, que já trabalhou em O Expresso da Meia Noite (Midnight Express, 1978) e Coração Satânico (Angel Heart, 1987) é o diretor de fotografia.
Dois anos se passaram desde os acontecimentos de O Confronto. Caesar (Andy Serkis) e seu povo conseguiram, até então, sobreviver à represália humana. Fortalecidos e em maior número, os macacos protegem o seu território de eventuais ataques por parte de um desesperado resquício da raça humana. O grupo paramilitar Alfa-Omega, liderados pelo temido Coronel (Woody Harrelson), é o primeiro a conseguir invadir as terras símias, causando danos irreversíveis. Consumido por um sentimento de ódio, Caesar decide buscar sua vingança pessoal contra o Coronel.
A apresentação do filme é um ponto ambíguo. Por um lado, nos é dada uma bela amostra do potencial de apreensão e imersão que A Guerra possui. Por outro, explicações e contextualizações um pouco excessivamente expositivas incomodam, mas pouco. O caráter da trilogia de tender cada vez mais para a perspectiva dos macacos fica evidente, embora não haja um indesejável maniqueísmo. O roteiro no nível da narrativa é bem construído ao se considerar que a sequência de acontecimentos é lógica e clara. Os acontecimentos da trama são bem construídos. Entretanto, um defeito considerável é uma leve falta de balanceamento da narrativa. Isso resultou em alguns segmentos da enredo cuja duração e cuja inteligibilidade são inferiores aos do resto da trama. As principais vítimas disso foram a construção da relação entre o gorila Luca (Michael Adamthwaite) e a pequena menina Nova (Amiah Miller) e o desfecho de uma das principais motivações de Bad Ape (Steve Zahn).
No plano metafórico, diferentemente, o enredo quase não apresenta falhas. As problemáticas sociais e questões filosóficas levantadas pelo filme são sólidas, profundas e amplas. Temáticas como a intolerância, como o ódio e como o estado humano mediante ao caos, herdadas dos longas anteriores, são muito aprimoradas, incluindo uma alegoria crítica ao fascismo, inerente a ambas temáticas. Crítica à política externa dos Estados Unidos também se faz presente explicitamente na película em uma cena muito formidável e sucinta. A Ética em conflitos armados, a submissão voluntária e a própria noção de humanidade são abordadas e trabalhadas em A Guerra de uma forma muito bem elaborada e clara. É um tratado de reflexão sobre a condição humana em forma cinematográfica.
Com relação aos personagens, quem se sobressai são Caesar, o Coronel, Bad Ape, Maurice e Nova. A reapresentação de Caesar, nos primeiros dez minutos do filme, já denuncia a magnitude do protagonista para os mais de 120 minutos restantes da película. Acrescentando a performance exuberante de Andy Serkis, o potencial de comoção de Caesar é elevado a um patamar acima do visto em O Confronto. Quando perguntado sobre isso, Serkis comentou que em, A Guerra, ele procurou as emoções e reações para Caesar em si mesmo. Em O Confronto, diferentemente, o ator britânico buscou inspiração em outras pessoas, em “líderes emblemáticos”, como exemplificado por Nelson Mandela. Sua antítese, o Coronel é ostentado como uma figura mítica, uma ideia que vai além dos limites de seu corpo humano. A presença do Coronel em cena resulta sempre em uma atmosfera diferente e empática. O antagonista detém uma densa contextualização histórica e uma complexidade superior à do próprio Caesar. Nem mesmo a atuação, no máximo, mediana de Woody Harrelson inibe o brilhantismo do Coronel.
Com exceção das ressalvas anteriores, Bad Ape é um personagem muito curioso e, provavelmente, o mais carismático do longa. Ele serve como o alívio cômico, exercendo tal papel com eficácia e sob medida. A atuação surpreendente de Steve Zahn tem papel fundamental nisso. O fator cômico talvez seja intrínseco em Zahn, que interpretou o cômico Marvin em A Creche do Papai há mais de uma década. A também norteamericana Karin Konoval apresenta de novo uma interpretação próspera como o orangotango Maurice. A diferença, nesta oportunidade, é que o sábio e caridoso símio alaranjado é finalmente bem aproveitado como personagem. Sua personalidade e suas relações com Nova é uma figura cujo simbolismo é muito mais importante que sua personalidade ou ações tomadas. A alegoria da pureza e da inocência podem ser comparadas ao mito do “bom selvagem”. Nova também é uma personagem chave na discussão que o longa propõe sobre a noção de humanidade.
A direção de Matt Reeves, segundo Andy Serkis, tem uma importância pivotal para a consistência das atuações. Segundo a estrela, Reeves é um “diretor de atores”: “o que interessa é a performance”. Reeves tem a precaução de garantir que cada ator exteriorize as mais profundas emoções capazes de dentro de si. Pensando-se assim, é compreensível a atuação de Harrelson. O mais interessante do nova iorquino, “um dos melhores diretores com quem trabalhei”, segundo Serkis, é que ele dá suporte aos atores e aos ensaios sem câmeras. Reeves garante ao seu elenco que só haverá uma câmera gravando a cena se esta já foi ensaiada anteriormente pelos atores sem a pressão dos holofotes. Isso, complementa Serkis, faz bem para os atores e é algo difícil devido ao curto prazo das gravações.
Nos aspectos técnicos, a direção e da direção de fotografia conferem uma belíssima estética do filme, cuja saturação, mantém a atenção do espectador, e cuja iluminação se adapta para extrair o máximo de beleza e da peculiaridade emotiva de cada cena. Reeves e Seresin inovam, em relação a O Confronto, principalmente em um aspecto, os quais foram motivados excepcionalmente pelas peculiaridades deste roteiro. O aspecto da travessia de Caesar, em busca de vingança, é promovido por takes que enaltecem a imensidão do ambiente e a distância do horizonte. Os efeitos especiais são feitos com primazia, a aparência dos macacos está mais realista e a famosa captação de movimento aprimorada. Os olhos talvez sejam o ponto mais importante e perceptível dessa evolução tênue da tecnologia. Efeitos técnicos e pirotécnicos também são recursos utilizados sob medida a princípio. A Guerra é uma produção planejada para a experiência 3D, mas não submissa a ela. Independentemente do questionável rendimento e utilidade para o filme, o 3D, neste caso, é atrativo, sem ser escandaloso, e não cansa a vista.
Arrancando um certificado de tomate fresco de 93%, no Rotten Tomatoes, e um 8 no IMDB, Planeta dos Macacos: A Guerra é um dos principais filmes do ano. Com um desfecho imprescindível, o longa consegue, como afirmou Andy Serkis, proporcionar a “sensação real de uma grande história sendo desdobrada” e a imprevisibilidade, assim como superar a comum “exaustividade das sequências”. E, principalmente, de acordo com Serkis, A Guerra é capaz de “afetar as pessoas […] algo muito importantes para estes tempos”, porém “raramente encontrado em blockbusters”.
Confira o trailer legendado:
por Caio Mattos
caiomattcardoso@gmail.com