Ver Natalie Portman no elenco de um filme é geralmente um atrativo para ir aos cinemas. Seu talento, consagrado em 2011 com o Oscar de Melhor Atriz por Cisne Negro (Black Swan, 2010), é admirável; ao ponto de conseguir salvar da total ruína o novo longa Vox Lux 一 O Preço da Fama (Vox Lux, 2019).
A história começa num tom um tanto quanto dramático, ao fazer uso de um recurso pouco usual: o narrador. O espectador é apresentado à história de Celeste (papel inicialmente interpretado por Raffey Cassidy e depois por Portman), menina comum — como o próprio narrador descreve — mas que sobreviveu a uma tragédia de proporções horripilantes. Após atentado em sua escola, no qual todos os alunos de sua sala foram assassinados, Celeste foi a única sobrevivente, apesar do tiro em seu pescoço.
A partir daí, já é possível perceber que o Vox Lux não será um filme de ascensão à fama nos moldes de Nasce Uma Estrela (A Star Is Born, 2018). Apelando para um lado mais obscuro, a começar pelas cenas iniciais, o diretor Brady Corbet parece querer provar um ponto ao trazer um tema tão latente, principalmente no cenário norte-americano (e infelizmente também brasileiro, nos últimos anos): os massacres cometidos por jovens nas escolas.
Mas essa suposição não se confirma. Ainda outros dois atentados são mostrado ao longo do filme e apesar de relevantes para marcar momentos na vida da protagonista, são apenas isto: marcos temporais. Qualquer que tenha sido o objetivo de Corbet ao apresentar tanta violência, o tema se perde no enredo.
Depois do trágico acontecimento, que é o ponto inicial para o desenvolvimento da história, o espectador pode entender melhor como nasce a estrela de Vox Lux. A carreira musical de Celeste se inicia de forma simples, com uma canção composta em conjunto com sua irmã Eleanor (Stacy Martin). Ao cantá-la na cerimônia em homenagem aos jovens assassinados, a transmissão televisiva faz com que o mundo das irmãs se transforme completamente.
Essa transformação é representada pelo produtor musical (Jude Law), não nomeado no longa. Talvez essa escolha de mantê-lo no anonimato tenha tentado significar algo maior, como se ele representasse não uma pessoa, mas a indústria musical como um todo. Se esse foi o objetivo, no entanto, passa despercebido pelo espectador. De fato, apesar de ser uma figura supostamente relevante, o personagem é deixado de lado, salvo em momentos em que contribui como um apoio para que possa avançar a trama de Celeste.
A partir daí, o longa explora o início da carreira da jovem, de apenas 14 anos. A relação próxima com a irmã — e seu distanciamento abrupto, a seriedade e também os deslizes provenientes da própria juventude. Até esse ponto, há o sentimento que a narrativa seguirá certo eixo, embora o espectador já esteja certamente agoniado para ver Natalie Portman, que demora a surgir na trama.
A passagem de tempo repentina é, contudo, um susto. Ao mesmo tempo em que se deseja ver logo a estrela do filme, o modo como isso é feito — de forma tão rápida — assusta. De uma hora para a outra, vê-se uma Celeste adulta, vastamente conhecida e claramente com problemas de temperamento, que não pareciam estar presentes na personagem mais nova.
Outro elemento de surpresa, que também aparenta ser apenas uma inserção aleatória no enredo, é filha da cantora, Albertine (Raffey Cassidy). Sabe-se pouco sobre a menina e seu pai, apenas uma breve menção de que ela foi concebida quando Celeste ainda era bem nova. Somente uma cena pode ser tida como marcante, que, na verdade, serve para enfatizar ainda mais a ótima atuação de Portman no papel de estrela traumatizada e afadigada pela fama.
Atuação esta que é a salvação de todo o filme. De fato, sem o porte de uma atriz como essa, o filme seria apenas mais um na extensa lista das grandes produções que não conseguem alcançar o resultado almejado. O design de produção e a edição de som perfeitos não seriam suficientes para salvar Vox Lux, embora sejam aspectos admiráveis do longa.
O filme termina com um espetáculo musical, que novamente parece uma escolha sem sentido com o eixo narrativo. Sim, o filme confunde o espectador ao ponto de um show não ser o modo apropriado de terminar a trama de uma cantora. O sentimento de que há várias pontas soltas e mal desenvolvidas é constante. Ao tentar trazer temas demais a serem explorados, Corbet peca em não conseguir desenvolver nenhum com maestria.
Bom, ao menos, há a possibilidade de reviver um pouco da Natalie Portman de Cisne Negro, sendo esse talvez o maior triunfo de Vox Lux. O filme estreia no dia 28 de março. Confira o trailer:
por Maria Eduarda Nogueira
mariaeduardanogueira@usp.br