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A mãe de todas as perguntas: uma reflexão necessária sobre o feminismo no dias de hoje

“A ampla presença da violência de gênero e da violência sexual serve para restringir a liberdade e a confiança daquelas que têm de viver num mundo em que as ameaças compõem o pano de fundo de suas vidas, uma nota de rodapé em cada página, uma nuvem nublando todos os céus. Não são “crimes passionais”, …

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“A ampla presença da violência de gênero e da violência sexual serve para restringir a liberdade e a confiança daquelas que têm de viver num mundo em que as ameaças compõem o pano de fundo de suas vidas, uma nota de rodapé em cada página, uma nuvem nublando todos os céus. Não são “crimes passionais”, como se costuma dizer, nem de desejo, mas sim de fúria em controlar, impor ou reforçar uma estrutura de poder.” – Rebecca Solnit

Não importa se você sabe tudo sobre feminismo ou se você não conhece nada sobre o movimento, “A Mãe de Todas as Perguntas – Reflexões sobre os novos feminismos” (Companhia das Letras, 2017) foi feito especialmente para você. Trata-se de um compilado de doze ensaios curtos sobre o tema escritos por Rebecca Solnit, autora que é considerada uma das historiadoras e ativistas mais centrais dentro do feminismo contemporâneo e suas discussões. A partir de seus textos, ela inicia reflexões sobre os mais diferentes debates do movimento atualmente – e promete deixar qualquer leitor repleto de argumentos.

Nos seus ensaios, a autora discorre sobre os mais diferentes temas e fala sobre cultura do estupro, silenciamento, imposição da maternidade e desigualdade de gênero, além de diversos outros assuntos que são suscitados dentro desses debates. Tudo isso de forma interseccional, ou seja, sem esquecer os diferentes níveis de opressão que existem e que variam de acordo com a identidade social da mulher – como, por exemplo, classe social, cor, origem e idade.

E, se tem algo que caracteriza a obra de Rebecca Solnit, é a sua fundamentação em bons argumentos e na boa checagem de fatos. Com diversas referências a escritores, historiadores e feministas famosos, ela constrói pensamentos com bases muito sólidas. A cada página surge um novo caso de violência contra as mulheres, um novo exemplo, uma nova confirmação de como o feminismo precisa ser debatido de forma urgente.

De longe, o assunto principal do livro é o silenciamento feminino. O tema ocupa boa parte da obra e é tratado com bastante profundidade. A autora explica as diferentes formas em que é possível silenciar uma mulher, dando exemplos de fatos reais, o que torna tudo mais didático para quem nunca ouviu falar sobre isso. Ela fala sobre as mulheres que são silenciadas pelo jurídico, pela “boa educação”, pela humilhação, pela acusação de “mentirosa”. Sobre as mulheres que denunciam, mas depois são excluídas e, portanto, silenciadas. E também sobre as que gritam e nunca são ouvidas. Trata-se de uma questão  complexa e a autora não deixa a desejar em nenhum momento – e é até mesmo por conta disso que uma segunda leitura de parágrafo, por vezes, se faz necessária.

Além disso, é importante ressaltar que não é só porque Rebecca Solnit é uma grande referência no assunto, que você nunca vá discordar dela durante a leitura. O livro, na verdade, é uma grande mistura de concordâncias e discordâncias, o que demonstra ainda mais como trata-se de uma discussão saudável sobre feminismo. A comparação entre soldados e mulheres estupradas, por exemplo, peca um pouco – já que a validade de uma declaração masculina é muito maior do que a de uma feminina pelo fato de que as mulheres são constantemente consideradas “histéricas” e “mentirosas”. Mas, de qualquer forma, todos encontram espaço para tirar suas próprias conclusões.

E os homens não estão excluídos. Rebecca faz questão de sempre frisar a importância dos homens se conscientizarem sobre as discussões feministas, já que boa parte da violência contra as mulheres e da desigualdade se deve justamente a eles. O tema “lugar de fala” e as piadas sobre estupro feitas por comediantes machistas, por exemplo, são colocados em xeque.

Talvez o único problema da obra esteja no fato dela ter sido escrita por uma americana e não por uma brasileira. Isso faz com que o livro esteja repleto de referências que, apesar de bem explicadas, não são muito palpáveis no Brasil. A questão cultural, portanto, é um dos únicos entraves que o leitor encontra durante a leitura, mas também é uma forma dele expandir seus horizontes e conhecer histórias que nunca ouviu falar. O debate que Rebecca faz sobre o porte de armas nos Estados Unidos é um dos exemplos marcantes da diferença entre os dois países.

Apesar da leitura fluir mais para aqueles que já têm uma certa experiência no movimento feminista, ele também serve como uma maneira de iniciar as pessoas no assunto. A obra da Rebecca está repleta de metáforas, o que torna os debates de difícil entendimento ainda mais palpáveis para quem está se deparando pela primeira vez com o tema. Sendo assim, “A Mãe de Todas as Perguntas” é leitura obrigatória para qualquer um que se interesse pelo debate e que queira ir um pouquinho mais a fundo.

Por Fernanda Teles
fernanda.teles@usp.br

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