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A popularização de um conceito e o legado de Blair

“Alô, Alô! Alguém pode me ouvir? Se alguém encontrar essa fita, saiba que nesse texto vamos falar sobre Bruxa de Blair e o legado desse longa. Tudo é verdade, acredite!”. Em outubro de 1994, três estudantes desapareceram em uma floresta perto de Burkittsville, EUA, enquanto filmavam um documentário… um ano depois, as imagens foram encontradas. …

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Alô, Alô! Alguém pode me ouvir? Se alguém encontrar essa fita, saiba que nesse texto vamos falar sobre Bruxa de Blair e o legado desse longa. Tudo é verdade, acredite!”.

Em outubro de 1994, três estudantes desapareceram em uma floresta perto de Burkittsville, EUA, enquanto filmavam um documentário… um ano depois, as imagens foram encontradas. E é dessa forma que A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project, 1999) se inicia. Não há tempo para respiro, o espectador já é inserido no plot misterioso do filme em seu primeiro minuto. 

Filme? Para alguns, na época, as cenas gravadas pelo trio Heather Donahue, Joshua Leonard e Michael Williams eram verdadeiras, e a polícia, que havia tratado as filmagens como piada, deveria investigar melhor os acontecimentos narrados. As fitas cobrem sete dias de gravações, que vão desde a chegada dos três estudantes de cinema à cidade de Burkittsville, Maryland (anteriormente chamada Blair), até o final silencioso do sétimo e derradeiro dia. 

Enquanto entrevistam moradores da cidade, os estudantes descobrem histórias macabras envolvendo a lenda da Bruxa de Blair, mas focando principalmente na história de Rustin Parr, um eremita que assassinou e torturou sete crianças em sua casa na floresta. A lenda conta que ele levava as crianças ao porão em pares, fazendo com que uma dessas crianças ficasse no canto apenas ouvindo os sons excruciantes da outra criança sendo assassinada. Mais tarde, Parr se entregou à polícia alegando insanidade, dizendo que seus atos haviam sido influenciados por uma bruxa chamada Elly Kedward, mulher que morreu enforcada no século XVIII.  

No trecho mencionado acima, é possível perceber uma das principais características de A Bruxa de Blair: a bruxa precisa influenciar outro humano para concretizar suas intenções vis. Isso é de extrema importância para o desenrolar dos acontecimentos que vemos durante as gravações encontradas. 

O realismo em torno dos sentimentos demonstrados pelos atores tem motivo: os diretores Eduardo Sanchez e Daniel Myrick adentraram a floresta com eles, duas câmaras amadoras e, quem sabe, nenhum roteiro. Abandonaram esses atores na mata por 8 dias, causando situações reais de sustos na tentativa de amedrontá-los e como visto, a estratégia funcionou. 

Para o escritor H. P. Lovecraft, “a emoção mais antiga e mais forte da humanidade é o medo, e o tipo de medo mais antigo e mais poderoso é o medo do desconhecido”. O medo que os diretores causaram em seus atores segue à risca esse modelo, tornando-se desolador em um terror psicológico brutal. A tensão crescente faz com que você se preocupe com aquele grupo perdido, se envolvendo cada vez mais nos mistérios e perigos enfrentados. Anderson Ferrari, professor de educação infantil na Escola Character Montessori SEEDS, define Blair nesse sentido: “Terror psicológico de primeira, explorando o medo do desconhecido inerente ao ser humano”. 

Esse cartaz começou a ser distribuído seis meses antes do lançamento do longa. O intuito? Preparar o terreno e imergir o público na farsa perfeita.  [Imagem: Artisan Entertainment]

O final do longa levanta dúvidas até hoje, mas para o espectador atento, a simbologia em torno da figura da bruxa indica o que aconteceu e, principalmente, a razão pela qual tudo aquilo ocorreu. Entretanto, no caso dos diretores, o final nasceu mais pela questão de necessidade do que de um surto criativo. Foi o que eles disseram em entrevista à Entertainment Weekly: “Não tínhamos dinheiro, então não podíamos fazer qualquer efeito especial, sendo assim, tivemos que descobrir como finalizar aquilo sem arruinar o restante do filme. Elaboramos a ideia três dias antes de gravarmos. Achamos aquilo incrível ー meio que inesperado, mas deu a ideia que algo sobrenatural estava acontecendo”. 

Sabemos que para um longa ter ganho quatro mil vezes seu valor inicial (o filme custou 60 mil dólares, arrecadando 248 milhões de dólares ao redor do mundo), algo de diferente teve que ser feito, não ficando apenas restrito à parte técnica ou aos conceitos trazidos pelo filme. Nisso se encontra a parte essencial que fez Blair se tornar um dos representantes modernos do gênero de terror: o marketing sobrenatural envolvendo o longa. 

Em uma época que o terror estava dominado por filmes como Pânico (Scream, 1996) e seus derivados, ninguém podia esperar que um longa que não tinha trilha sonora, nenhum ator conhecido e nenhuma preocupação estética se tornasse o segundo filme mais rentável da história. Talvez, o maior prêmio que A Bruxa de Blair tenha conquistado seja a de melhor campanha de mídia social de todos os tempos segundo a Forbes e foi na “jovem” internet que Blair plantou inovação e colheu sucesso. 

Em termos publicitários, a chave para o sucesso de uma campanha é o barulho que ela consegue fazer e os produtores, ao acharem a ferramenta perfeita para fazer esse barulho (internet), criaram sites e fóruns, colocando fragmentos desses “filmes encontrados” e assim deixando as pessoas com dúvidas e curiosas se aquilo de fato era real. De forma intencional, Blair fez uso de um dos maiores fundamentos de marketing e propaganda: o AIDA (Attention, Interest, Desire and Action – traduzindo: Atenção, Interesse, Desejo e Ação).

A primeira pessoa a usar o conceito foi Elias St. Elmo Lewis, advogado na área de publicidade, em 1898. Para Lewis: “A missão de um anúncio é ATRAIR um leitor, de modo que ele vai olhar para o anúncio e começar a lê-lo; em seguida, vai se INTERESSAR por ele e vai continuar a lê-lo; depois, para CONVENCÊ-LO (desejo), de modo que quando ele ler, vai acreditar. Se um anúncio publicitário contém estas três qualidades de sucesso, é um anúncio publicitário bem-sucedido.”

As emoções demonstradas pelos atores eram críveis e faziam com que o espectador criasse um laço com os personagens.  [Imagem: Artisan Entertainment]

Os produtores de Blair atraem o espectador quando criam uma lenda falsa e apresentam um documentário sobre essa lenda no canal Sci-Fi, ou quando fazem cartazes falando do desaparecimento misterioso de três estudantes na floresta. O longa faz com que a pessoa se interesse (e mantenha esse interesse) ao fazer um site com fragmentos das gravações encontradas e levando pessoas a acreditar que a narrativa é real. O convencimento (desejo) acontece quando o site continua gerando resultados ao atualizar arquivos em texto, áudio e vídeo e sendo cada vez mais acessado. A ação ocorre quando Blair incentiva as pessoas a irem aos cinemas para ver o que de fato aconteceu, ou seja, adquirir o “produto” que foi promovido por tanto tempo. E assim, A Bruxa de Blair faturou mais de um milhão de dólares em seu primeiro final de semana. 

O longa conseguiu se tornar viral mesmo antes de existirem tecnologias que facilitam esse tipo de fenômeno. O boca a boca fez com que a narrativa fosse comentada por muito tempo e se espalhasse pelo mundo, pois todos queriam respostas sobre as gravações, mas principalmente saber se aquilo era verdadeiro. 

 O que o espectador via em tela podia não ser verdadeiro, mas era verossímil. Para o bom e velho Aristóteles, verossimilhança é a qualidade do que parece verdadeiro, do que não contraria a verdade, uma coerência harmônica entre os elementos que aparentemente denotam uma verdade. O filme alcança isso em uma espécie de verossimilhança documental, seja pelo método de gravação, pela propaganda/marketing utilizado ou pelos atores (desconhecidos) parecerem realmente jovens estudantes perdidos no meio de uma floresta.   

Como qualquer produto de entretenimento bem-sucedido, a marca Bruxa de Blair ganhou status e a produtora Artisan Entertainment não demorou para programar uma sequência. A Bruxa de Blair 2: O Livro das Sombras (Book of Shadows: Blair Witch 2, 2000) sai logo no ano seguinte, mas desconsiderando a narrativa envolvendo o trio de personagens do primeiro filme ao dar mais ênfase à história sobre o eremita que assassinou as sete crianças a mando da bruxa. A obra é criticada pela maioria dos fãs do original, principalmente pela falta de conexão com o anterior e por não expandir a mitologia envolvendo a figura da bruxa. O longa foi um fracasso comercial e por muito tempo a marca Bruxa de Blair ficou engavetada.

Lançado em 30 de agosto de 2019, Bruxa de Blair (Blair Witch) é um jogo que expande a mitologia criada no primeiro longa de 1999, dando bons sustos aos jogadores. [Imagem: Bloober Team/Lionsgate]

Eis que em 2016, após muito mistério, Bruxa de Blair (Blair Witch, 2016) é anunciado. O longa só foi revelado dois meses antes de chegar às telas, com a produtora impedindo o vazamento de informações, tentando replicar de forma nostálgica a aura do primeiro. O filme é um remake/continuação do longa de 99, pois ao mesmo tempo que continua a história, repete muitas características que fizeram sucesso em A Bruxa de Blair. Apesar de não ter feito o sucesso comercial esperado, este longa serviu para ampliar a simbologia e mitos envolvendo a bruxa, servindo inclusive para responder algumas dúvidas que ficaram do original.  

Para Anderson Ferrari, ambos os longas não fazem jus ao original: “É insuperável. O terceiro filme é um remake/sequência muito decente, desde que você não fique muito pirado comparando com o primeiro. O trabalho é feito com carinho, tem sua dose de fanservice e apresenta a franquia para uma galera mais nova. Lembro de sair do cinema com um sorriso na cara. Já o segundo… Alguém no estúdio teve uma ideia legal (fazer ficção lidando com a recepção do primeiro filme), mas aparentemente ninguém soube bem o que fazer com essa ideia, e daí pra frente foi ladeira abaixo.” 

Comemorando duas décadas em 2019, eis que surge mais um capítulo canônico da saga: o jogo The Blair Witch (2019). Em um terror psicológico de sobrevivência, este jogo é o produto que mais se aproxima da aura angustiante do filme original, pois o jogador passa pela mesma sensação de desamparo durante o dia e de terror sufocante durante a noite que Heather, Joshua e Michael enfrentam em 99. O jogo é fiel e respeita as premissas originais em torno da bruxa, expandindo ainda mais o que conhecemos sobre o tema. 

A Bruxa de Blair não foi apenas uma revolução cinematográfica pelo seu marketing. A narrativa também foi responsável por popularizar um subgênero: o found footage (filmagens encontradas). Depois do longa, a fórmula documental foi usada até a exaustão e hoje é considerada um estilo ultrapassado, apesar de alguns filmes tentarem trazer inovações em alguns sentidos. 

Mas o que significa gravar uma obra em found footage e o que isso traz de diferente ao espectador? 

O found footage como forma de se expressar: o funcionamento da câmera diegética 

Blair não foi o primeiro longa a ficar famoso e utilizar o conceito de found footage. Este rótulo pertence a Holocausto Canibal (Cannibal Holocaust, 1980). A obra é controversa até hoje, inclusive com seu diretor, Ruggero Deodato, que foi preso por obscenidade e até rumores envolvendo mortes foram considerados. 

O híbrido de ficção e documentário foi um marco para o cinema, mas não ocorreu nenhuma revolução como a que ocorreria dezenove anos depois. De qualquer forma, as principais características já estavam determinadas: baixo custo de produção, uma tentativa de aproximar o espectador e os protagonistas, o uso de atores desconhecidos e a manipulação do espectador no intuito de fazê-lo acreditar que aquilo que ele está vendo é real. Nesse tipo de filme, a câmera se tornaria cúmplice das intenções dos produtores e diretores.

No livro Introdução ao Documentário, Bill Nichols, crítico e teórico sueco, define a parte mais técnica de se usar uma câmera dentro da cena: “A presença da câmera na ‘cena’ atesta sua presença no mundo histórico. Isso confirma a sensação de comprometimento, ou engajamento, com o imediato, o íntimo, o pessoal, no momento em que ele ocorre. Essa presença também confirma a sensação de fidelidade ao que acontece e que pode nos ser transmitida pelos acontecimentos, como se eles simplesmente tivessem acontecido, quando, na verdade, foram construídos para terem exatamente aquela aparência.”

Com mais de décadas de filmes found footage, a técnica evoluiu e outras mídias tecnológicas foram utilizadas, tais como: celulares, webcams, gravadores de sons e qualquer aparelho audiovisual que produza imagens e sons e que os personagens tenham acesso. 

O interesse envolvendo o found footage não se restringe apenas a um novo subgênero cinematográfico, mas também a uma mudança cultural que afetou a todos. No artigo A câmera diegética: legibilidade narrativa e verossimilhança documental em falsos found footage de horror”,  Rodrigo Carreiro, mestre e doutor em Comunicação pela UFPE, comenta: “A ressignificação de filmes de família, o uso de vídeos disponíveis na Internet dentro de trabalhos audiovisuais, a popularidade de imagens amadoras, os fenômenos midiáticos nascidos de vídeos caseiros postados no YouTube, a forte e crescente tendência da aceitação de erros técnicos – até mesmo a preferência por imagens que contenham esses erros, como índices de um realismo nem sempre verdadeiro – e a espetacularização de imagens e sons da intimidade constituem temas que integram um debate mais amplo sobre novos regimes de visualidade que privilegiam imagens não profissionais.”  

Holocausto Canibal foi proibido em diversos países, inclusive na Itália, país do diretor Ruggero Deodato. O longa contém cenas explícitas de violência corporal, além de outras obscenidades  [Imagem: Divulgação]

Diegético é o nome técnico dado a esse uso de câmera e há duas diferenças cruciais entre esse subgênero e o modelo tradicional: o espacial e o narrativo. O espaço geográfico utilizado em um found footage é limitado ao dispositivo que está gravando as cenas. No ponto de vista narrativo, há a alteração de como os personagens se comportam, porque eles sabem que estão sendo gravados. 

O found footage é instável, e essa instabilidade ocasiona erros técnicos, tornando mais verossímil o caráter documental do filme. Quando acreditamos em algo, a sensação de envolvimento com o filme aumenta e isso nos torna vulneráveis aos perigos que podem surgir a qualquer hora e o uso de atores desconhecidos ajuda na imersão, pois nos desvinculamos da ideia de que estamos diante de uma ficção e acreditamos que aquilo é real. Nossa mente trabalha a ponto de ser preenchida por sons e imagens que muitas vezes nem acontecem. 

Não há como negar que A Bruxa de Blair utiliza fielmente esses atributos e que o legado deixado pelo longa no subgênero foi o suficiente para que outros diretores e produtores tentassem alcançar o mesmo sucesso. Até mesmo o Brasil tem um representante no found footage: Desaparecidos (2011), do diretor David Schurmann. O filme foi rodado em Ilhabela, São Paulo, e conta como um grupo de seis amigos desapareceram após uma festa. 

Demorou aproximadamente de sete a oito anos para que o found footage se transformasse no estilo do momento no gênero de terror. Em termos de faturamento, o longa que conseguiu alcançar o sucesso de Blair foi Atividade Paranormal (Paranormal Activity, 2007). Com um orçamento de 15 mil dólares, o filme ganhou 196 milhões de dólares ao redor do mundo. A difusão do found footage fez esse estilo alcançar narrativas que aplicaram novidades ao conceito apresentado por Blair e esse subgênero não ficou restrito apenas ao terror.

Caminhando entre o terror e a comédia: a evolução de uma concepção

REC (2007) ([REC], Jaume Balagueró)

Em uma noite normal de trabalho, a repórter Angela Vidal (Manuela Velasco) comanda o programa de televisão chamado Enquanto Você Dorme. Ao iniciar uma reportagem sobre um quartel de bombeiros, tudo corria bem quando a sirene toca e os bombeiros recebem um chamado de urgência para resgatar uma senhora. Chegando no local, a repórter e os bombeiros encontram policiais que também receberam o chamado. Ao entrar no apartamento, a senhora ataca um dos bombeiros e ao tentar sair do prédio, todos percebem que estão presos em quarentena. 

REC é o expoente máximo do found footage no terror. O longa pega a premissa de A Bruxa de Blair e eleva ao máximo, misturando “zumbis” infectados, possessão demoníaca e muito mais. O Bloody Disgusting, um dos maiores sites especializados de terror do mundo, considerou REC como TOP 20 dos Melhores Filmes de Terror da Década. Anderson concorda com essa descrição: “Não dá pra deixar de citar REC, filme espanhol absolutamente aterrorizante que traz zumbis (ou algo assim) ao gênero”. O sucesso foi tanto, que em 2008, uma versão estadunidense foi lançada, algo parecido com o que ocorria com as versões de filmes de terror japoneses.     

REC é intenso e faz o conceito de found footage alcançar seu ápice dentro do gênero de terror  [Imagem: Copyright Wild Side]

Cloverfield – Monstro (2008) (Cloverfield, Matt Reeves)

A ficção científica também teve espaço no found footage, e com a ajuda do produtor J. J. Abrams (famoso na época por ser o diretor da série Lost), Cloverfield foi idealizado e lançado. Cinco jovens de Nova York estão em uma festa de despedida de um amigo quando a cidade é atacada por um ser misterioso, causando muita destruição, inclusive com a cabeça da Estátua da Liberdade sendo arremessada em uma cena icônica que remeteria ao ataque às Torres Gêmeas em 11 de setembro. O enigma envolvendo o monstro prende a atenção durante todo o filme, já que só temos um relance de como o ser é em sua plenitude.  

Podemos encontrar diversos easter eggs durante os cortes de gravação, inclusive com um final aberto e que deixa mais dúvidas do que respostas. O espectador acompanha o filme através de cenas de um cartão de memória SD encontrado pelos militares. O longa também teve uma campanha viral intensa por parte da produtora Paramount Pictures e muitos compararam a forma ativa de marketing ao marketing utilizado em A Bruxa de Blair

Cloverfield – Monstro aparenta ser um Godzilla norte-americano, mas tem sua própria identidade e muitos mistérios, alguns não solucionados até hoje. [Imagem: Copyright Paramount Pictures France]

Buscando,,, (2018) (Searching, Aneesh Chaganty)

Com a evolução da tecnologia, o found footage não podia ficar restrito à gravações encontradas. Buscando… pode não ser o primeiro longa a ser exibido inteiramente através de telas de aplicativos, webcams, entre outros, mas é o melhor exemplo de como usar a modernidade para criar tensão e expectativa. 

O suspense criado pelo desaparecimento da filha de David Kim (John Cho) é uma crítica bem direta à forma como usamos nossos dispositivos de tecnologia em nossa rotina. Tanto que David encontra pistas do paradeiro de sua filha através de pegadas digitais, da mesma forma que policiais investigariam um caso similar. O longa é um registro virtual de uma história de mistério policial tradicional e caberia perfeitamente em séries investigativas que tanto fazem sucesso hoje em dia. Inclusive, um espectador atento descobriria o final do filme de forma antecipada, pois as diversas telas de e-mails e aplicativos têm mais mistérios do que aparentam. 

Através de aplicativos diversos, Buscando… não se prende a apenas uma tela e consegue acessar novos ambientes através de outros tipos de filmagens, assim enriquecendo a tensão criada.  [Imagem: Copyright Sony Pictures]

Projeto X – Uma Festa Fora de Controle (2012) (Project X, Nima Nourizadeh)

Adolescentes excluídos na escola buscando a chance de serem lembrados pelo resto de suas vidas escolares. Um tema batido, mas que ganha sobrevida com Projeto X – Uma Festa Fora de Controle. O conceito American Pie alcança estágios destrutivos nunca antes vistos em um filme desse gênero, ainda chamando a atenção dos noticiários nacionais, o que ajuda a ampliar a parte técnica do found footage

O espectador encontra todos os clichês imagináveis de uma obra desse tipo: o carrão esportivo do pai, a vontade de se tornar popular, o garoto bobo se dando bem e desencontros amorosos. A vantagem do longa é ter a câmera que introduz o espectador no meio da festa, que se sente realmente como um dos integrantes adolescentes: extasiados e sem preocupação com o depois.   

O conceito de “adolescentes em festa” alcança um novo nível com Projeto X, o que funciona muito bem para uma geração criada através do Youtube. [Imagem: Copyright Warner Bros. France]

Poder Sem Limites (2012) (Chronicle, Josh Trank)

Josh Trank ficou com uma imagem negativa após ser diretor do reboot de Quarteto Fantástico (Fantastic Four, 2015), mas o longa que fez o diretor ter a oportunidade de dirigir esse blockbuster foi Poder Sem Limites. Da lista citada até aqui, essa é a narrativa que mais se enquadraria em uma filmagem convencional, com o found footage sendo uma escolha estética. 

Essa preferência faz sentido e ajuda na narrativa, nos aproximando das personalidades de cada personagem. A obra conta como três amigos receberam superpoderes ao entrarem em contato com uma substância desconhecida. No início, os amigos aproveitam os poderes para diversão, mas com a situação saindo do controle, eles têm que enfrentar seus demônios internos, com consequências inesperadas. Mesmo sendo um filme de personagens poderosos, tudo acontece de forma natural e intuitiva.  

Super-heróis no found footage, mas com uma roupagem diferente e nos deixando um questionamento principal: o que você faria se tivesse superpoderes? [Imagem: Copyright Twentieth Century Fox France]

O símbolo de uma época 

Os românticos alemães criaram um termo que pode ser aplicado à Bruxa de Blair: Zeitgeist. Essa palavra traduzida significa espírito da época, ou seja, um conjunto de características de um determinado período de tempo que representa o seu momento. Blair é um produto de sua época, criando ideais e padrões estéticos que seriam seguidos por muitas obras, tais como as citadas. 

Dificilmente existirá algo similar, pois nenhum outro filme terá a oportunidade de usar a internet da forma que ela foi empregada, logo em seus primeiros momentos de destaque. Anderson Ferrari discorda dessa ideia: “Fiquei me perguntando durante um tempo se isso funcionaria hoje, mas o Slender Man e o terraplanismo me deram a resposta, que é um retumbante (e algo triste) sim”. No entanto, há algo que a maioria dos fãs de A Bruxa de Blair concordam: o longa saiu na hora certa e no momento que era preciso uma revolução; vinte anos depois, a sensação continua a mesma.

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